As eleições presidenciais venezuelanas estão marcadas para 28 de julho, mas faltando 10 dias para o pleito, os eleitores não têm um termômetro que ajude a saber que candidato tem mais chance de ganhar. Com resultados muito diferentes, especialistas entendem ser possível até um empate técnico neste momento, analisando as pesquisas eleitorais.
Os números não parecem confiáveis. Hoje, alguns institutos colocam o candidato da oposição e ex-embaixador, Edmundo González Urrutia, com até 30 pontos percentuais de vantagem sobre o presidente Nicolás Maduro. Já outras, indicam vitória do candidato à reeleição com a mesma folga de 30 pontos percentuais sobre o candidato da Plataforma Unitária. São os casos das pesquisas conduzidas pela Delphos e pela Hinterlaces.
E as duas organizações são ainda as mais transparentes em relação à metodologia, tendo divulgado quantas pessoas entrevistaram. A Hinterlaces está mais ligada ao governo e mostra o recorte de idade e de classes sociais da amostragem. Já a Delphos indica a idade mínima das entrevistas (18 anos) e afirma que todas as pessoas que responderam estão registradas no Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela (CNE).
De acordo com o levantamento da Hinterlaces divulgado em 30 de junho, Nicolás Maduro lidera as intenções de voto com 54,2%. Urrutia aparece com 21,1% enquanto o empresário e humorista Benjamín Rausseo tem 5,7%. Não sabem ou não responderam foram 7,3% e os outros 7 candidatos somam 11,7%.
Já a pesquisa Delphos publicada nesta quarta-feira (17) coloca o candidato da Plataforma Unitária com 59,1% das intenções de voto, enquanto Maduro tem 24,6%. Em nota, a empresa afirmou que, com esses indicadores, Urrutia teria 4,9 milhões de votos e o candidato do governo 2,9 milhões. A pesquisa, porém, não fala sobre os outros participantes.
Outros institutos usados pelo governo e oposição não divulgam as pesquisas de maneira pública, não apresentam metodologia e alguns sequer tem site próprio.
Segundo o ex-vice-presidente do CNE Leonardo Morales, a tendência é que essas pesquisas não tragam uma boa fotografia da realidade porque são usadas pelas campanhas eleitorais das duas partes. “As pesquisas na Venezuela têm pouca credibilidade porque, em geral, são usadas para fazer campanha. Várias delas também são empresas fantasmas, são apenas nomes. Só algumas empresas têm mais tradição”, afirmou.
Empate técnico?
Com resultados tão diferentes, alguns pesquisadores começaram a fazer contas próprias para tentar entender qual o cenário mais próximo da realidade hoje. O economista Francisco Rodríguez faz parte da campanha de Antonio Ecarri, da Alianza Lápiz. Segundo ele, a média das pesquisas dos institutos com maior histórico no país mostram uma vantagem de 28,4 pontos percentuais para Edmundo. Ainda assim, ele explica que é errado fazer esse cálculo simples, já que as pesquisas têm um “enviesamento histórico”.
Em seu perfil nas redes sociais, ele expôs uma conta que é usada por pesquisadores brasileiros para fazer uma “correção na base”. O método consiste em usar pesquisas para eleições anteriores e comparar com o resultado final. De acordo com o economista venezuelano, esses mesmos institutos superestimaram o voto da oposição, em média, em 27,8 por cento nos últimos 10 anos. Com esse ajuste, a vantagem de Edmundo cairia para 0,6 ponto percentual, o que representa um empate técnico, já que as empresas que apresentam metodologia colocam a margem de erro em 3 pontos percentuais.
Segundo o sociólogo Marcos Coimbra, fundador do Instituto Vox Populi, esse tipo de conta faz sentido e já foi realizada nas últimas eleições no Brasil. De acordo com ele, o voto em Jair Bolsonaro (PL) em 2022, por exemplo, foi subestimado pelas pesquisas.
“Aqui, em 2022, fazia sentido fazer, pois o eleitor bolsonarista tendia a se recusar a conceder entrevistas, ou seja, sub-representamos o voto no Bolsonaro”, afirma ao Brasil de Fato. Naquela eleição, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) venceu o pleito em segundo turno com 50,90% dos votos contra 49,10% do ex-presidente.
Ele ainda pondera que, mesmo os institutos que têm maior histórico e tradição em todo o mundo, têm errado as projeções nos últimos tempos. Isso faz com que a credibilidade das pesquisas seja colocada em cheque pelos eleitores.
“Não tenho opinião a respeito dos institutos da Venezuela e não conheço seu desempenho. Mas acho que é sempre bom olhar resultados de pesquisa com cautela, até em função da crise internacional na sua credibilidade. As pesquisas precisam se adaptar aos novos tempos e não estão conseguindo fazê-lo na velocidade e intensidade necessárias”, disse.
Maduro contra 9
O CNE anunciou em maio que 21,4 milhões de venezuelanos estão aptos a votar no dia 28 de julho. Cerca de 69 mil deles estão fora do país. O presidente Nicolás Maduro busca a reeleição contra outros 9 candidatos, sendo o principal deles Edmundo González Urrutia. Ele é apoiado pela ex-deputada ultraliberal María Corina Machado. Ela está inabilitada por 15 anos pela Justiça venezuelana por "inconsistência e ocultação" de ativos na declaração de bens que ela deveria ter apresentado à Controladoria-Geral da República (CGR) enquanto foi deputada na Assembleia Nacional (2011-2014).
Em junho, oito dos 10 candidatos assinaram um acordo para respeitar o resultado das eleições. Edmundo se recusou a participar e não assinou o documento. Além dele, Enrique Márquez, do partido Centrados, não assinou.
Como funciona o sistema
A eleição para presidente na Venezuela tem apenas um turno. Ganha quem tiver o maior número de votos. O mandato para o presidente é de 6 anos. No país, não há limite de reeleição para presidente. O atual chefe do Executivo é Nicolás Maduro, que concorre à reeleição para o 3º mandato. Antes dele, Hugo Chávez também foi eleito 3 vezes, mas morreu logo no início de sua 3ª gestão.
Para votar, é preciso ter ao menos 18 anos e o voto não é obrigatório no país. Assim como o Brasil, a Venezuela também usa a urna eletrônica, mas a diferença é que no sistema venezuelano o voto é também é impresso. O Conselho Nacional Eleitoral venezuelano contratou uma empresa em 2004 que desenvolveu e implementou mais de 500 mil máquinas e treinou 380 mil profissionais para operar as máquinas.
O procedimento é simples. Os centros de votação são em escolas públicas. O eleitor entra na sala de votação, valida sua biometria e registra o voto na urna eletrônica. Ele recebe o comprovante do voto, confere se está correto e deposita em uma outra urna, onde ficam armazenados os votos impressos. Quando a votação é encerrada, o chefe da seção imprime o boletim de urna e faz a contagem dos votos impressos para conferir se estão de acordo.
Edição: Rodrigo Durão Coelho