A Polícia Federal (PF) deflagrou nessa sexta-feira (20) a Operação Última Milha, para investigar o uso irregular de um programa de geolocalização de celulares pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin) para monitorar ilegalmente políticos, jornalistas, servidores públicos e juízes durante o governo de Jair Bolsonaro.
Autorizada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a operação levou à prisão de dois agentes da agência e ao afastamento - decidido pelo ministro do STF Alexandre de Moraes - do número três do órgão, o secretário de Planejamento e Gestão, Paulo Maurício Fortunato Pinto, que atuou na Abin durante a gestão Bolsonaro como diretor de Operações de Inteligência e seguiu na agência no governo Lula.
Além disso, a PF apreendeu na casa de Paulo US$ 171,8 mil (cerca de R$ 870 mil) em espécie. Ele foi nomeado pelo atual diretor da Abin, Luiz Fernando Corrêa, quando ainda não era investigado.
Segundo o jornal O Globo, o sistema teria sido utilizado indevidamente 30 mil vezes, sendo 1,8 mil usos relacionados a advogados, jornalistas e adversários do governo Bolsonaro.
Além de Paulo, foram afastados outros quatro integrantes da Agência. A Polícia Federal cumpriu ao todo 25 mandados de busca e apreensão, sendo 17 em Brasília, três em Santa Catarina, dois em São Paulo, dois no Paraná e um em Goiás. A Polícia Federal toma os depoimentos dos investigados nesta manhã na sede da corporação, em Brasília.
A investigação identificou que a espionagem era feita com o sistema FirstMile, da empresa israelense Cognyte que permite rastrear dados de GPS do celular de qualquer pessoa, adquirido no fim do governo Michel Temer por R$ 5,7 milhões - sem licitação - para ser utilizado durante a intervenção federal no Rio de Janeiro e que, segundo revelou O Globo, foi utilizados nos três primeiros anos do governo Bolsonaro sem nenhum protocolo oficial. O sistema permite monitorar até 10 mil aparelhos a cada 12 meses.
Prisões
Os dois agentes da Abin presos, Rodrigo Colli e Eduardo Arthur Yzycky chegaram a responder um processo administrativo disciplinar e, segundo a PF, “teriam utilizado o conhecimento sobre o uso indevido do sistema como meio de coerção indireta para evitar a demissão”.
A investigação corre sob sigilo no Supremo Tribunal Federal e foi aberta por determinação do ministro da Justiça, Flávio Dino, após O Globo revelar, em março deste ano, o uso indevido do sistema secreto de monitoramento de celulares. Segundo a PF, o sistema de geolocalização utilizado pela Abin é um software intrusivo na infraestrutura de telefonia brasileira. A rede de telefones teria sido invadida reiteradas vezes, com a utilização do serviço adquirido com recursos públicos. Mas este tipo de invasão só poderia ser permitido com autorização judicial e realizado pela polícia.
Os investigados podem responder, na medida de suas responsabilidades, pelos crimes de invasão de dispositivo informático alheio, organização criminosa e interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei.
Em nota emitida nesta sexta, a Abin disse estar colaborando plenamente com as investigações e que "a ferramenta deixou de ser utilizada em maio de 2021. A atual gestão e os servidores da ABIN reafirmam o compromisso com a legalidade e o Estado Democrático de Direito."
Edição: Rodrigo Durão Coelho