Uma cerimônia histórica no Palácio do Planalto, em Brasília (DF), na tarde desta quarta-feira (11), marcou a posse de Sônia Guajajara e Anielle Franco para os ministérios dos Povos Indígenas e da Igualdade Racial, respectivamente. A liderança indígena celebrou a chegada das duas ao governo federal: "Toma posse aqui a resistência secular preta e indígena".
Apresentada pela deputada federal Célia Xakriabá (PSOL-MG), que a chamou de "Sônia, a mulher bioma", Guajajara foi a primeira a discursar e agradeceu ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que criou o Ministério dos Povos Indígenas.
"Lula, lhe parabenizo por reconhecer o protagonismo e força dos povos indígenas, diante do desafio de preservar o meio ambiente, em meio à crise climática, criando esse ministério inédito na história do Brasil. Povos indígenas que resistem há mais de 500 anos a diários ataques covardes e violentos, tão chocantes e aterrorizantes como vimos no último domingo, aqui em Brasília", afirmou Guajajara, que lembrou dos atos golpistas do último domingo (8).
"Destruir a estrutura do STF, do Congresso Nacional e o Palácio do Planalto não vai destruir nossa democracia. Aqui, Sônia Guajajara e Anielle Franco convocam todas as mulheres do Brasil para dizermos juntas que nunca mais permitiremos outros golpes no país", alertou a indígena.
Guajajara falou sobre os problemas enfrentados pelos povos originários. "São graves os casos de intoxicações provocados por mercúrio dos garimpos, pelos agrotóxicos nas grandes lavouras do agronegócio; as invasões em nossos territórios; as condições degradantes de saúde e saneamento; o aumento da insegurança alimentar que resultou, inclusive, na morte de inúmeras crianças e idosos indígenas e a desproteção dos territórios onde vivem povos indígenas isolados."
Por fim, a líder indígena manifestou ao presidente o desejo de utilizar a pasta para superar as causas das mazelas dos indígenas. "Lula, arrisco dizer, sem exagero, que muitos povos indígenas vivem uma verdadeira crise humanitária em nosso país e agora estou aqui para trabalharmos juntos, para acabar com a normalização deste estado inconstitucional que se agravou nestes últimos anos."
Marielle, presente
Anielle Franco abriu o discurso lembrando de sua irmã, a ex-vereadora Marielle Franco, brutalmente assassinada no Rio de Janeiro, em um dos crimes políticos de maior repercussão da história brasileira.
"Desde o dia 14 de março de 2018, dia em que tiraram Marielle da minha família e da sociedade brasileira, tenho dedicado cada minuto da minha vida a lutar por justiça, defender a memória, multiplicar o legado e regar as sementes de minha irmã", disse.
Franco lembrou que "não podemos mais ignorar ou subestimar o fato de que a raça e a etnia são determinantes para a desigualdade de oportunidades no Brasil em todos os âmbitos da vida. Pessoas negras estão sub-representadas nos espaços de poder e, em contrapartida, somos as que mais estamos nos espaços de estigmatização e vulnerabilidade".
A ministra levou à cerimônia um cenário sobre a condição de negras e negros no país. "Apesar de a maioria da população brasileira se autodeclarar negra, é possível observar que os brancos ocupam a maior parte dos cargos gerenciais, dos empregos formais e dos cargos eletivos. Por outro lado, a população negra está no topo dos índices de desemprego, subemprego e de ocupações informais, além de receber os menores salários."
Os não negros, em especial a equipe de governo de Lula, receberam um pedido especial da ministra. "Esperamos poder contar com vocês nessa tarefa de reconstrução em prol de respeito, cidadania, dignidade e igualdade de oportunidades. E, me dirijo especialmente aos demais ministros e ministros cujas pastas não poderiam funcionar sem um recorte pontual e transversal sobre o racismo e a racialidade no Brasil. E, também por isso, o Ministério da Igualdade Racial se coloca à disposição para reconstruir esse novo Brasil coletivamente. O compromisso com a Igualdade Racial no Brasil não pode ser o compromisso apenas deste Ministério".
Anielle Franco e Sônia Guajajara foram as duas últimas ministras a tomarem posse no governo Lula. Os demais 35 ministros já foram empossados.
Sanção
Durante a cerimônia, Lula sancionou a lei que equipara o crime de injúria racial ao de racismo, que é inafiançável e imprescritível.
Aprovado pelo Congresso em dezembro do ano passado, o texto inscreve a injúria, hoje contida no Código Penal, na Lei do Racismo e cria o crime de injúria racial coletiva.
Até agora, a pena para injúria racial era de reclusão de um a três anos e multa. A nova lei prevê punição de prisão de dois a cinco anos. A pena será dobrada se o crime for cometido por duas ou mais pessoas.
Edição: Thalita Pires