A primeira semana do governo Lula lançou luz aos direitos dos indígenas e ao protagonismo de lideranças dos povos originários, que passaram a ocupar diversos cargos institucionais no novo governo, alguns deles inéditos para os indígenas.
É o caso de Sônia Guajajara, que tomou posse como ministra dos Povos Indígenas, e de Joenia Wapichana nomeada presidenta da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). Além delas, o cearense Weibe Tapeba assumiu a Secretaria Especial da Saúde Indígena (SESAI).
Poucas horas depois da posse, Lula acatou duas sugestões do Grupo de Trabalho (GT) dos Povos Indígenas, que atuou no governo de transição: revogou o decreto que permitia garimpo em terras indígenas e corrigiu o nome da Funai de Fundação Nacional do Índio para Fundação Nacional dos Povos Indígenas.
Nas redes sociais, movimentos populares comemoraram os avanços nas políticas voltadas aos povos originários. A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) reconheceu a nomeação de Weibe como estratégica "para garantir que as demandas dos povos indígenas na área da saúde sejam atendidas"
Weibe Tapeba foi nomeado Secretário Especial da Saúde Indígena (Sesai). Ele será o primeiro indígena a assumir a pasta, que é central para a vida dos povos indígenas e que foi muito desestruturada no governo Bolsonaro, sobretudo durante a pandemia da Covid-19.
— Apib Oficial (@ApibOficial) January 2, 2023
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A Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espirito Santo (APOINME), considerou o momento histórico e de "fortalecimento do Movimento indígena no novo governo".
Quem é o novo secretário?
Weibe Tapeba é líder do povo indígena Tapeba, do município de Caucaia, no Ceará, advogado e vereador. É atuante em organizações indígenas estaduais, regionais e nacionais. Weibe coordenou a Federação dos Povos e Organizações Indígenas do Ceará (FEPOINCE) e compõe o departamento jurídico da APOINME.
Por meio das redes sociais, Weibe agradeceu o apoio dos movimentos indígenas e populares que o apoiaram. Ele garantiu que a gestão será pautada no diálogo com gestores e coordenadores de territórios visando reconstruir e fortalecer os movimentos. Weibe também destacou que está comprometido com a força de trabalho existente nos territórios de todo o país.
Para lideranças indígenas a cerimônia de posse do presidente Lula foi o pontapé inicial para um caminho de reparação histórica de diversos grupos marginalizados no Brasil ao longo de séculos. Vale relembrar que, além de receber a faixa presidencial de representantes do povo brasileiro, Lula trouxe de volta o Ministério das Mulheres e criou o Ministério da Igualdade Racial e o Ministério dos Povos Indígenas.
Política indigenista no Ceará
Seguindo os passos do Governo Federal, o governador Elmano de Freitas (PT) criou as mesmas pastas a nível estadual. O Ceará terá pela primeira vez uma secretaria para cuidar dos interesses dos povos indígenas, que será comandada pela Cacika-Irê do povo Jenipapo-Kanindé, Juliana Alves.
Juliana é professora indígena e mestre em antropologia pela Universidade Federal do Ceará. Ela foi candidata a deputada estadual nas eleições de 2022 e obteve mais de 5,7 mil votos. Ela é uma das fundadoras da Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (ANMIGA) e vice-coordenadora da Articulação das Mulheres Indígenas do Ceará (AMICE).
Filiada ao PcdoB, Juliana é filha da cacika pequena, a primeira mulher a comandar uma aldeia no Brasil. Desde menina acompanha as lutas da mãe pelo reconhecimento da terra e pelos direitos dos povos originários.
"Eu e minha mãe, fomos encontrar o governador para ouvir o convite de alguém que temos muita admiração e respeito, porque ele (Elmano) sempre foi muito próximo do nosso povo. Senti como se fosse um reconhecimento a luta da minha mãe. Eu sou a continuidade dela, mas consegui aliar a vivência, a militância com o conhecimento teórico da Universidade, então aceitamos porque temos diplomacia para isso", contou Juliana, em entrevista ao BdF.
Durante a conversa, Juliana estava no território indígena, comemorando a conquista com a família e com amigos, em uma mistura de alegria e choro. "Fizemos nossos rituais religiosos e comemoramos. Algumas pessoas me perguntaram se eu ia sair da Aldeia e eu digo que pelas minhas novas tarefas, ficarei mais distante, mas assim como saí para estudar e voltei, vou continuar voltando porque meu pé é no chão da aldeia. É um aqui e outro na luta", afirmou.
Sobre os desafios e prioridades da primeira Secretaria dos Povos Indígenas do Ceará, Juliana elencou como prioridade a demarcação dos territórios, problema histórico no Ceará, acentuado nos últimos quatro anos com diversas decisões judiciais contrárias aos povos originários. "Já conversei com o governador Elmano e vamos trabalhar fortemente nisso. Temos muito a contribuir para cessar as constantes ameaças contra nosso povo com a criação da secretaria, reestruturando o que for necessário para revogar ações contrárias aos territórios indígenas. Agora temos um Governo Federal ao nosso lado", afirmou.
Por fim, a nova secretária respondeu que fica à vontade ao ser chamada de cacika com K ou pelo seu nome de batismo Juliana e que não vai deixar de usar nenhuma das denominações. "Juliana é meu nome de batismo e ele deve aparecer mais por conta da secretaria. Mas é importante dizer que cacika não é um título, é permanente, é o que sou e eu gosto de ser chamada assim", ressaltou.
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Fonte: BdF Ceará
Edição: Camila Garcia e Sarah Fernandes