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Embargo do Ocidente ao petróleo russo terá o efeito desejado?

Plano de prejudicar exportações russas para cortar financiamento da guerra na Ucrânia pode ter impacto reduzido

São Paulo |
Construção de uma usina de petróleo na região russa de Svobodnoi, no Extremo Oriente da Rússia, construída em parceria com a vizinha China. - Dimitar Dilkoff / AFP

Na última segunda-feira (5), entrou em vigor o embargo ao petróleo russo: países da União Europeia, com algumas exceções, não podem mais comprar petróleo russo enviado por mar. As entregas por oleodutos não foram proibidas. Juntamente com o embargo, foi introduzido pelos países do G7, UE e Austrália um teto de preço de US$ 60 por barril, porém, também apenas para o petróleo “marítimo”. Acima deste valor, será proibido comprar o petróleo russo, bem como realizar contratos de seguro e transporte do produto.

O objetivo das medidas é minimizar a receita da Rússia com as exportações de petróleo e, portanto, o financiamento militar para a guerra contra a Ucrânia. 

Para o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, o teto para o preço do petróleo russo deveria ser ainda mais baixo. Segundo ele, é apenas uma questão de tempo até que ferramentas mais duras tenham que ser usadas.

“É uma pena que este tempo seja perdido. A lógica é óbvia - se o limite de preço do petróleo russo for $60 em vez de, por exemplo, $30, que foi discutido, em particular, pela Polônia e pelos estados bálticos, então o orçamento russo receberá cerca de US $100 bilhões por ano”, afirma.

A Rússia, por sua vez, reagiu à decisão afirmando que as novas sanções ocidentais não afetarão o financiamento das operações militares. De acordo com o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, a Rússia não pretende reconhecer o teto imposto pelo Ocidente. Já o vice-primeiro-ministro russo, Alexander Novak, disse que a Rússia não aceitaria um teto para os preços do petróleo, mesmo que tivesse que cortar a produção. Ele acrescentou que tais restrições são uma interferência nos instrumentos de mercado e que a Rússia está pronta para trabalhar apenas com os consumidores que trabalharão nas condições do mercado.

Em entrevista ao Brasil de Fato, o economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada da Academia Russa de Economia Nacional, Andrey Zubarev, disse que a eficiência do embargo depende de países terceiros.

“Aqui tudo é mais complexo, porque de qualquer forma o petróleo russo será vendido, o mercado mundial precisa de petróleo, então se de repente por algum motivo há uma redução da oferta de petróleo em 10%, por exemplo, haveria uma hesitação substancial do mercado, mudando o preço fortemente. Então o petróleo é necessário e ele será vendido. A questão é de quem para quem, como e para onde. E essa questão é muito difícil. E quaisquer consequências econômicas estão ligadas a decisões logísticas que vão surgir. Já as decisões logísticas dependem da vontade de importantes ‘contra-agentes’ como Índia e China”, analisa.

O fornecimento de petróleo e derivados da Rússia aos países do G7 e à UE em 2021 alcançou 214,7 milhões de toneladas, totalizando US$ 109,5 bilhões, o que representa 68% a 70% da exportação total desses produtos no mercado mundial. Em 2021, o petróleo bruto e os produtos petrolíferos representaram 37% do total das exportações russas de mercadorias, segundo dados do Serviço Federal de Alfândega.

Na quarta-feira (7), foi relatado por fontes do governo russo que uma das respostas consideradas por Moscou é a proibição total da venda de petróleo a países que apoiaram o teto de preços, inclusive se comprarem petróleo da Rússia por meio de países intermediários. No entanto, tal cenário pode modificar a posição de negociação de importantes compradores alternativos, como Índia e China.

Segundo o economista Andrey Zubarev, partindo do pressuposto que a Rússia não venderá petróleo para países europeus e priorizará as exportações para a China e Índia, estes países também podem se recusar a comprar petróleo pelo preço do mercado.

“Se o petróleo custar US$100 (o barril), e como a Rússia é proibida de usar caminhões-tanque europeus e usar os serviços das empresas de seguro, então esses países vão olhar e falar: ‘Nós estamos dispostos a comprar o petróleo de vocês não por US$ 60, mas talvez um pouco mais caro, mas não pelo preço mundial, pois como grandes atores, se não quisermos comprar por US$ 65, quem então vai comprar?’. Então eles têm uma posição de negociação. Tem a Rússia, que pode oferecer petróleo mais barato, e os outros, que podem se recusar a comprar”, explica.

O pesquisador aponta que ainda é cedo para avaliar o impacto das medidas do Ocidente para embargar o petróleo russo, sobretudo porque a eficiências das sanções depende da oscilação do preço do petróleo. Um aumento no preço do petróleo pode compensar a diminuição dos lucros.

“Mas é preciso entender que o petróleo é um produto muito específico. Apenas a Arábia Saudita pode ‘desligar a torneira’ se quiser mais petróleo ou menos petróleo, outros países produtores de petróleo não podem, pois o petróleo está sendo bombeado. Se algum país começou a bombear petróleo em algum ponto, quer dizer que muito dinheiro já foi investido e será preciso ir até o final do processo, pois interrompê-lo também é muito caro”, argumenta.

Já o presidente do Instituto de Energia e Finanças, Marcel Salikhov, citado pelo portal Meduza, argumenta que as medidas de embargo ao petróleo russo pelo Ocidente acabaram tendo um efeito suave. Ele faz um prognóstico de que as exportações de petróleo devem sofrer um “colapso bastante forte em janeiro-fevereiro, seguido de uma recuperação”. De acordo com ele, um estudo do Instituto de Energia e Finanças aponta que no próximo ano as exportações russas de petróleo e derivados no total diminuirão cerca de 7% em volume físico.

“Isso não é muito e nem muito crítico do ponto de vista do orçamento russo. Desagradável, mas isso não é de forma alguma a perda de metade das receitas de petróleo e gás. O orçamento para o próximo ano prevê uma redução nas receitas de petróleo e gás de 11,7 trilhões para 8,9 trilhões de rublos, o que é esperado no final deste ano. A redução é significativa, mas não a ponto de não sobrar nada para pagar as pensões no país”, destaca.

Edição: Thales Schmidt