Com apoio técnico da Organização Internacional do Trabalho (OIT), o governo da Venezuela, sindicatos e entidades patronais iniciaram nesta segunda-feira (25) um ciclo de mesas de negociação para discutir o cumprimento de convênios sobre salário mínimo e outras convenções trabalhistas no país.
A presença da delegação da OIT na Venezuela e o início das reuniões no que se denominou Foro de Diálogo Social é fruto de uma queixa apresentada em 2015 por entidades empresariais à instituição internacional, na qual acusavam o governo venezuelano de "perseguir sindicatos" e "não realizar consultas tripartites", ou seja, que envolvessem autoridades estatais, empresariais e representantes dos trabalhadores.
Em mensagem transmitida durante a inauguração das negociações em Caracas nesta segunda-feira, o diretor-geral da OIT, Guy Ryder, celebrou a instalação das mesas e disse esperar que "todas as questões pendentes sobre a aplicação dos convênios números 26 [fixação dos salários mínimos], 87 [liberdade sindical] e 144 [consulta tripartite]" sejam abordadas durante as conversas.
"Há meses estamos em contato permanente e fluído com o senhor ministro do Trabalho [José Ramón Rivero] e com os interlocutores sociais para concretizar as bases deste foro que começa hoje e que, espero, possa fortalecer ainda mais o diálogo no país", disse Ryder.
O diretor da instituição ainda lembrou que, após a queixa apresentada pelos empresários venezuelanos, a OIT formou uma comissão de pesquisa para averiguar as alegações e, em 2019, publicou um relatório que foi enviado ao governo venezuelano contendo recomendações sobre o cumprimento dos convênios.
Em entrevista ao portal Tal Cual, Jorge Roig, que é ex-presidente da principal entidade patronal do país, a Fedecâmaras (Federação de Câmaras e Associação de Comércio e Produção Nacional) e que integra as mesas de negociações instaladas nesta segunda-feira, afirmou que, além do salário mínimo e das liberdades sindicais, serão discutidos temas como devolução de empresas expropriadas e possíveis modificações nas leis trabalhistas do país.
Representando o governo, a vice-presidente da Venezuela, Delcy Rodríguez, também esteve presente no evento que marcou o início do Foro de Diálogo Social em Caracas e afirmou que os problemas salariais do país estão ligados ao bloqueio imposto pelos Estados Unidos que, aliado com os efeitos da pandemia da covid-19, dificultou o crescimento da produtividade empresarial venezuelana.
"Esse bloqueio afetou o setor empresarial em sua capacidade produtiva e esse choque prejudicou a renda dos trabalhadores, o sistema de remuneração e de proteção sociais de nossos trabalhadores, que se viram ainda mais prejudicados com a pandemia", disse Rodríguez.
A vice-mandatária ainda lembrou que, além do último aumento de 1,200% no salário mínimo anunciado pelo governo em março deste ano, "os trabalhadores, com seu nível de consciência, encontraram de forma conjunta um caminho para reinventar o país, a produtividade no setor de alimentos, saúde etc".
Apesar da Venezuela viver uma tendência de queda na inflação, o poder de compra dos venezuelanos segue reduzido. O último aumento salarial anunciado pelo governo levou o salário mínimo de 7 para 128 bolívares (cerca de US$ 29), valor que, somado ao bônus para alimentação, chega a US$ 39. Entretanto, segundo o Observatório Venezuelano de Finanças (OVF), organismo não governamental ligado à oposição, o valor da cesta básica para o mês de março foi de US$ 187 e o salário mínimo atual só consegue arcar com 10,5% dos produtos listados.
Rodríguez ainda pediu à OIT que realize uma pesquisa sobre os países que estão bloqueados para que se possa saber "o que acontece com os trabalhadores desses países, como o bloqueio afeta os trabalhadores e empresários".
Ao mencionar as alegações feitas por representantes do setor empresarial sobre "falta de liberdade sindical" no país, a vice-presidente afirmou que em 1998, antes da vitória eleitoral do ex-presidente Hugo Chávez, havia 4 mil entidades sindicais na Venezuela, enquanto que atualmente o país conta com mais de 6,8 mil sindicatos de distintas categorias.
A delegação da OIT tem previsão de deixar o país na quinta-feira (28), mas as negociações devem continuar mesmo sem a presença dos membros da instituição e contarão com mais de 120 representantes de setores empresariais, estatais e de trabalhadores. Além disso, é esperado que em junho o diretor-geral da entidade apresente um informe sobre os resultados dos diálogos.
Edição: Thales Schmidt