O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), tem sofrido duras críticas da oposição por sua postura no comando da Casa. A criação de um Grupo de Trabalho (GT) para debater o Projeto de Lei 191/2020, que libera a mineração em terras indígenas, é considerada o estopim de uma gestão marcada pelo autoritarismo e pela distorção do regimento da Câmara.
Deputados federais ouvidos pelo Brasil de Fato apontam que Lira tem apostado em "dribles" no regulamento da Casa para acelerar a aprovação de projetos apoiados pelo governo federal. A manobra no projeto que ameaça direitos indígenas com a exploração mineral foi a mesma utilizada em outras matérias, como a alteração do Código de Mineração, em novembro de 2021.
A Presidência e outros órgãos da Câmara dos Deputados podem criar Grupos de Trabalho "para aperfeiçoar os processos legislativo e administrativo", de acordo com o regimento da Casa. A ferramenta, no entanto, não deve sobrepor ou substituir a tramitação natural dos projetos de lei.
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Ivan Valente (PSOL-SP), que é congressista desde 1994, disse que Lira comete "atropelo" ao ignorar a tramitação nas comissões permanentes da Câmara. Segundo o deputado, o presidente da Câmara usa o dispositivo dos GT's de forma equivocada para diminuir a possibilidade de a oposição debater os temas.
"O que eles deveriam fazer é deixar o projeto tramitar na Comissão de Minas e Energia, na Comissão de Constituição e Justiça, na Comissão de Defesa do Meio Ambiente. Teria que tramitar em três ou quatro comissões. Quando o trâmite demanda mais de três comissões, você pode formar uma comissão especial, que teria, no mínimo, quarenta sessões", disse o parlamentar.
Valente aponta ainda que a votação da urgência do PL 191 foi "criminosa". "Tudo isso foi atropelado. Ele fez um grupo de trabalho em que ele vai dar 13 vagas para a direita, aos ruralistas e os governistas, e sete vagas para a oposição", explica.
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"Ele [Lira] disse que fez uma negociação para ter um grupo de trabalho que terá 40 dias para apresentar uma proposta. Mas, se não tem a proposta, como é que você vota a urgência dela? O projeto não tem nem proposta feita", reclama o pessolista.
O deputado Alexandre Padilha (PT-SP) disse à reportagem que os Grupos de Trabalho fazem sentido apenas para temas consensuais e urgentes.
"É um absurdo. Os grupos de trabalho devem existir para temas onde existem maior consenso e que exigem urgência para ser votados, como, por exemplo, o Piso Nacional de Enfermagem. Acabei de ser relator desse Grupo de Trabalho. Era um projeto que todo mundo tinha consenso que o mérito estava correto. A dúvida que tinha era técnica, sobre o impacto orçamentário", declarou.
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"Isso é muito diferente dessa proposta absurda de mineração nas terras indígenas, onde existe muita divergência. Existe muito questionamento e zero de urgência para aprovação da matéria como essa. Depois do orçamento secreto, estão inventando o regimento secreto", disse Padilha.
Outro lado
O Brasil de Fato procurou a assessoria de imprensa do presidente da Câmara, mas não obteve sucesso nos contatos feitos. Caso a equipe de Lira responda, a nota será adicionada à reportagem.
Aprovação da urgência
O plenário da Câmara dos Deputados aprovou, na noite de quarta (9), o requerimento de urgência para tramitação da proposta que libera a exploração mineral em terras indígenas.
Foram 279 votos favoráveis à ideia e 180 contrários, em um placar precedido por uma série de protestos puxados pelo cantor Caetano Veloso, entre outros atores sociais que, durante o dia, pediram a rejeição da pauta. Três parlamentares se abstiveram.
Edição: Vivian Virissimo