O Projeto de Lei de Interrupção Voluntária da Gravidez (IVE na sigla em espanhol) da Argentina recebeu o aval, na noite dessa quinta-feira (17), da maioria dos senadores das três comissões da Câmara Alta que discutiram o projeto, aprovado semana passada pela Câmara dos Deputados. Com isso, é possível que o debate no Senado ocorra no tempo previsto, até o dia 29 de dezembro. A intenção é que a lei seja aprovada ainda em 2020.
Foram quatro dias de discussão no plenário, conformado pelas comissões de Saúde (10 votos a favor, de um total de 17 integrantes), Bancada da mulher (14 de 25) e Justiça e Assuntos Penais (9 de 16). Cada voto vale por si só, ainda que um mesmo parlamentar possa fazer parte de mais de uma comissão e, esta razão, votar mais de uma vez.
No entanto, o cenário da votação que pode levar ao aborto legal na Argentina ainda é apertado no Senado. Ainda na tarde de ontem, um dos senadores considerados indecisos, Juan Carlos Marino, da coalizão macrista Cambiemos, declarou seu voto contra a legalização do aborto no país. "É que me pede, majoritariamente, a sociedade pampeana", afirmou em um comunicado, referindo-se à província de La Pampa, onde foi eleito. Seu voto é um dos 5 que serão decisivos considerando o cenário atual entre os votos já declarados pelos 72 senadores da Câmara.
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Três senadores da centro-direita, considerados indecisos para a votação do PL no Senado, decidiram se abster da decisão do plenário. Lucila Crexell, Stella Maris Olalla e Oscar Castillo. Castillo era considerado como um dos votantes a favor da legalização, com base no seu voto positivo à aprovação do projeto em 2018, porém, como integrante das comissões, se absteve da votação no Senado.
Já outro senador indeciso, Edgardo Kueider, da coligação de centro-esquerda Frente de Todos, assinou o documento de decisão do plenário, mas com ressalvas. O senador de Entre Ríos deve pedir alterações no texto do projeto. Seu apoio ao seguimento do PL aponta para um provável voto a favor pela legalização do aborto. Outra indecisa, a senadora de Río Negro, Silvina García Larraburu, também assinou o documento de decisão de maioria do plenário, e deverá apoiar o projeto de lei no dia 29 de dezembro. Ela votou contra a legalização do aborto em 2018 na Câmara dos Senadores, instância que rejeitou o PL e manteve a situação de clandestinidade do aborto na Argentina.
Um dos destaques dos debates que começaram no último dia 14 de dezembro foi uma exposição que deixou à mostra a pouca disposição em conhecer as propostas do projeto de legalização do aborto por parte dos detratores da lei. O ginecologista especialista em fertilização assistida, Eduardo Young, um opositor do projeto de lei – chamados na Argentina de antidireitos, por serem contrários aos direitos sexuais e reprodutivos dos corpos gestantes –, confundiu o IVE e o Plano dos Mil Dias, destinado às gestantes e à primeira infância, outro projeto de lei apresentado pelo poder Executivo.
"Estipulam o período de mil dias e nunca entendi isso. Ninguém explica por quê são mil dias", disse Young.
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O país mantém um clima de debate respeitoso em comparação à discussão do projeto de lei de 2018, impulsionado pela Campanha Nacional pelo Aborto Legal, Seguro e Gratuito. Este ano, o PL de Interrupção Voluntária da Gravidez é impulsionado pelo próprio poder Executivo, e o governo atual, da coalizão da Frente de Todos (FdT) tem maioria no Senado, o que confere um ar de esperança aos favoráveis à lei. Portanto, será posta à prova a capacidade de negociação do governo de Alberto Fernández para a aprovação do projeto de lei que legalizará o aborto na Argentina.
Nesta sexta-feira (18), as comissões de Saúde e de Orçamento e Fazenda do Senado se reúnem para discutir o Plano dos Mil Dias sobre Atenção e Cuidado à Saúde durante a Gravidez e a Primeira Infância. O projeto de lei foi aprovado na Câmara dos Deputados com nenhum voto contra.
O envio do projeto dos Mil Dias foi uma estratégia do governo de Fernández para responder aos argumentos contrários à IVE de que o "aborto não pode ser a única saída". Na abertura do plenário das comissões que discutiram o projeto antes de ser enviado à Câmara, a secretária de Legal e Técnica da Presidência, Vilma Ibarra – outra figura central na promoção do projeto –, enfatizou que as pessoas gestantes devem ter autonomia para decidir seguir ou não com uma gravidez, e que a condição econômica não seria um fator decisivo nesse sentido.
Edição: Luiza Mançano