Trabalhadores indianos do setor de energia elétrica fizeram um dia nacional de protestos nesta segunda-feira (1º), em resposta a uma emenda à Lei de Eletricidade publicada em plena pandemia. A mudança no texto, proposta em abril, flexibiliza as regras para a iniciativa privada assumir o controle do setor e não foi discutida porque as reuniões de acionistas foram suspensas em função da quarentena.
O protesto pacífico foi liderado pelo Comitê Nacional de Empregados do Setor de Energia Elétrica e Engenheiros (NCCOEEE, na sigla em inglês). Os trabalhadores saíram às ruas com distintivos negros no peito em sinal de repúdio às decisões do governo e divulgaram materiais explicativos em prédios administrativos, centrais elétricas e subestações de energia.
O Comitê aponta que, desde 2003, a energia elétrica deixou de ser considerada um bem de interesse público e passou a ser tratada como uma commodity, orientada pelas leis do mercado. A emenda publicada durante a pandemia do novo coronavírus amplia esse entendimento para a distribuição de energia, e não apenas para a geração.
A mudança no texto também prevê o fim dos subsídios aos consumidores de baixa renda, que era garantido por meio da taxação das contas dos mais ricos.
Além do preço da energia, que tende a subir, os trabalhadores afirmam que a desregulamentação do setor aumenta o risco de demissões e apagões, por se tratar de uma atividade altamente especializada.
“Não podemos aceitar que os trabalhadores sejam tratados como bodes expiatórios por um governo que se entrega às leis do mercado”, diz o manifesto do Comitê.
Uma carta com os motivos do protesto foi enviada ao Ministério de Energia da Índia, que não se pronunciou sobre o tema até o momento.
Direitos trabalhistas
Sindicatos, movimentos populares e partidos de oposição vêm acusando o BJP, partido do primeiro-ministro ultradireitista Narendra Modi, de aproveitar a pandemia para cortar direitos de trabalhadores em vários estados.
Na última semana, dez centrais sindicais fizeram um protesto pacífico – respeitando as normas de isolamento – e enviaram uma carta à Organização Internacional do Trabalho (OIT) denunciando medidas desproporcionais tomadas por estados comandados pelo BJP.
Os estados em que as violações são consideradas mais graves são Madhya Pradesh, no centro da Índia, Uttar Pradesh, no norte, e Gujarat, no oeste. Os três suspenderam por três anos, por exemplo, a Lei dos Sindicatos (1926), que garante liberdade de funcionamento às entidades, e a Lei de Disputas Industriais (1947), que assegura o direito de greve e garante espaços de negociação coletiva.
Entre as medidas aprovadas pelo BJP nos estados estão a elevação das jornadas de operários para até 72 horas semanais e a flexibilização de normas sanitárias e de segurança.
Os governos de Madhya Pradesh, Uttar Pradesh e Gujarat usam como pretexto a necessidade de reaquecer a economia após a quarentena. Surajit Mazumdar, professor de economia da Universidade Jawaharlal Nehru (JNU), na capital Nova Delhi, afirma que o efeito imediato dessas medidas será o aumento da lucratividade do setor industrial e a ampliação das desigualdades.
“De nada adianta estimular a abertura de novos negócios se não há demanda por produtos porque as pessoas perderam o poder de compra. A única maneira de aumentar o emprego e recuperar a economia é aumentar o gasto público”, explica, em entrevista ao portal indiano Newsclick.
O primeiro-ministro Modi vem sendo pressionado pela oposição para aumentar o salário mínimo e alavancar o poder de compra da população, em consonância com o que propõe o professor da JNU.
Uttar Pradesh, o primeiro estado indiano a mudar regras trabalhistas em meio à pandemia, excluiu mulheres e crianças da reforma e não alterou mecanismos de inspeção dos locais de trabalho. O estado, que tem uma população equivalente ao Brasil, flexibilizou jornadas de trabalho e condições para pagamento de horas-extras e benefícios.
Segundo país mais populoso do mundo, a Índia inicia nesta segunda-feira (1) a quinta fase de medidas de contenção do novo coronavírus. O governo contabiliza 191 mil infectados e 5,4 mil mortes por covid-19.
*Com Peoples Dispatch.
Edição: Vivian Fernandes