Em uma queda de braço com o Congresso para aprovar o orçamento da construção de um muro na fronteira com o México, o presidente estadunidense, Donald Trump, decidiu apresentar uma medida unilateral e declarar emergência nacional para a realização da obra. O anúncio foi feito nesta sexta-feira (15), em cerimônia nos jardins da Casa Branca.
“É uma ótima coisa a fazer, porque temos uma invasão no nosso país de drogas, de tráfico humano, de todo tipo de criminosos e gangues”, disse Trump.
O cumprimento da promessa de campanha custará 8 bilhões de dólares -- o equivalente a R$ 29 bilhões -- aos cofres públicos e dependerá de um remanejamento do orçamento, aprovado na noite da última quinta (14) sem a liberação dos recursos totais para o muro.
Trump reforçou que esta não é a primeira vez que se declara emergência nacional -- decreto que concede poderes extraordinários ao presidente. George W. Bush utilizou dessa prerrogativa após os atentados de 11 de setembro de 2001, e Barack Obama, durante a epidemia da gripe H1N1, em 2009.
A legislação estabelece que as emergências nacionais podem durar até um ano. A renovação pode ser feita pelo mandatário até 90 dias antes do encerramento.
O Congresso pode reverter a medida por meio de uma resolução conjunta, que passaria pela Câmara dos Deputados, de maioria democrata, e seguiria para o Senado, de maioria republicana. Mesmo que passe pelas duas Casas, o presidente poderia anular a resolução, o que obrigaria o Congresso a reunir uma quantidade maior de votos para invalidar o veto presidencial.
Contestações judiciais também podem ser realizadas com base na própria legislação estadunidense. Além das questões técnicas, os tribunais precisariam julgar se há ou não uma situação de emergência na fronteira e se o muro responderia à demanda de segurança nacional.
Sem paralisação
A manobra de Trump para garantir recursos para o muro ocorre um dia depois da aprovação de uma lei que permite que o governo financie áreas públicas e de gestão -- evitando, assim, uma nova paralisação parcial do governo, o chamado shutdown.
Na tentativa anterior de aprovar orçamento para o muro, o impasse entre congressistas e governo resultou em uma paralisação de 35 dias no funcionamento de serviços públicos, a mais longa da história do país. Nesse processo, cerca de 800 mil funcionários foram colocados de licença ou trabalharam sem remuneração.
O shutdown terminou quando Trump aceitou um acordo para reabrir o governo sem a verba para o muro.
Críticas negativas
Ao repercutir a medida tomada por Trump, o jornal The New York Times publicou uma matéria intitulada "Drible de Trump no Congresso deve ficar na história como violação extraordinária". O periódico entrevistou juristas que afirmaram que os custos para a democracia do país podem ser pesados a longo prazo.
Segundo o jornal, “a disposição de Trump de invocar poderes de emergência para contornar a oposição do Congresso deve ficar na história como uma violação extraordinária das normas constitucionais -- e estabelecer um precedente que futuros presidentes, dos dois partidos, poderiam seguir para atingir suas metas políticas de forma unilateral.”
Em entrevista ao New York Times, William Banks, professor de direito da Universidade de Syracuse, alertou para o rompimento do processo democrático: "É uma verdadeira ameaça institucional à separação de poderes usar poderes de emergência para permitir que o presidente ignore o Congresso e construa por iniciativa própria uma muralha que nossos representantes eleitos optaram por não custear".
Para a pesquisadora da escola de direito da Universidade de Nova York Elizabeth Goitein, a medida de Trump poderia constituir abuso de poder e abriria caminho para que chefes de Estado aleguem emergência a fim de escapar às restrições democráticas ao poder presidencial.
"Cada vez que um presidente faz alguma coisa que seria impensável sob um governo anterior, e cada vez que ele age de maneira que estamos acostumados a ver em regimes autoritários, um pedacinho de nossa democracia morre - e nesse caso o pedaço é bem grande", disse Goitein, em entrevista ao New York Times.
Edição: Daniel Giovanaz