A posse do republicano Donald Trump como presidente dos Estados Unidos nesta segunda-feira (20) será marcada pela presença de bilionários e empresários do setor tecnológico, mídias sociais e consumo do país. Jeff Bezos, da Amazon, Mark Zuckerberg da Meta, e Elon Musk, dono do X e da SpaceX, acompanharão a cerimônia em Washington que dará início a mais um mandato do magnata à frente da Casa Branca.
Enquanto Bezos e Zuckerberg desembolsaram U$ 1 milhão (cerca de R$ 6 milhões), cada um, em doação para o evento, Musk fez diversas contribuições para Trump desde sua campanha presidencial. O valor total que o empresário sul-africano naturalizado estadunidense gastou com o republicano foi de U$ 250 milhões (cerca de R$1,5 bilhão).
Em troca, Trump prometeu um cargo em seu governo. Musk comandará, ao lado de outro bilionário, Vivek Ramaswamy, o Departamento de Eficiência Governamental.
Na análise do escritor estadunidense Danny Caine, autor do livro Como resistir à Amazon e porque (2023; Editora Elefante), a proximidade desses CEOs de grandes empresas nos Estados Unidos está ligada às medidas que o governo do presidente democrata Joe Biden tomou para regulamentar suas companhias.
O fim do serviço da checagem de fatos pela Meta em 7 de janeiro está “totalmente relacionada” ao retorno de Trump à Casa Branca, exemplifica ao Brasil de Fato.
“Desde a decisão da Meta em interromper a verificação de fatos até quase tudo o que Elon Musk fez com o Twitter tornam as mídias sociais mais hostis às vozes que não são de extrema direita”, pontua.
Leia a entrevista completa a seguir:
Brasil de Fato: As mídias sociais estão mais próximas da extrema direita? Por quê?
Danny Caine: Em teoria, a mídia social é uma tecnologia neutra e pode ser utilizada por pessoas de qualquer convicção política. No entanto, na realidade, os CEOs das empresas que administram as plataformas de mídias sociais estão definitivamente tentando obter favores da nova administração presidencial. Isso faz com que os CEOs remodelem a plataforma de modo a atender à extrema direita. Desde a decisão da Meta em interromper a verificação de fatos até quase tudo o que Elon Musk fez com o Twitter, desde retirar o banimento de contas fascistas ou neonazistas até o enfraquecimento acentuado do recurso de bloqueio desse tipo de conta. Todas essas mudanças tornam as redes de mídia social mais hostis às vozes que não são de extrema direita.
Com a última decisão de Mark Zuckerberg de encerrar a verificação de fatos na Meta, é possível dizer que a Internet é fascista?
Não acho que a Internet em si seja fascista, já que a tecnologia é, em teoria, apenas uma ferramenta. Entretanto, algumas das pessoas que controlam o acesso a partes importantes da Internet por meio de suas corporações monopolizadoras estão demonstrando tendências fascistas.
O que Zuckerberg pretende com esse anúncio? Ele está de alguma forma relacionado ao retorno de Donald Trump à Casa Branca?
Zuckerberg está tentando refazer o Facebook de uma forma favorável a Trump. Isso está totalmente relacionado ao retorno dele à Casa Branca. De acordo com as atuais leis antitruste [regulamentações que visam proteger a concorrência] que já estão em vigor, muitas dessas grandes empresas de tecnologia podem ser regulamentadas, processadas ou desmembradas. O governo do [presidente democrata Joe] Biden tomou medidas importantes para controlar o poder das grandes empresas de tecnologia, e os CEOs delas sabem disso. Eles sabem que a melhor maneira de aliviar essa pressão sobre eles e sobre seu modelo de negócios é trabalhar para cair nas boas graças do governo Trump.
Nesse contexto, os sonhos do software livre, do ativismo cibernético e da democratização da Internet estão mortos?
Eu realmente espero que não. Para cada CEO de extrema direita, há milhares de ativistas lutando por uma sociedade mais livre (e, por extensão, pela Internet livre). Eles só terão sucesso se as grandes corporações de tecnologia não alcançarem o poder absoluto. Resta saber se isso acontecerá.
É possível para a esquerda reverter esse domínio da extrema direita nas mídias sociais? Ou o uso dessas plataformas já significa submissão ao projeto da extrema direita?
Não quero que a esquerda simplesmente use o manual que a extrema direita usou para assumir o controle das principais plataformas de mídia social. O manual da extrema direita é criar uma oligarquia de bilionários influentes e poderosos às custas dos trabalhadores, dos pobres e dos usuários da Internet. O objetivo da esquerda é construir uma sociedade livre onde todos possam prosperar, e não tornar algumas pessoas ricas. Acho que a esquerda precisa criar alternativas, e não tentar conquistar o terreno que a direita já conquistou.
Você é o autor do livro 'Como resistir à Amazon e por quê'. Como a Amazon está relacionada a esse debate sobre tecnologias, embora seu foco principal seja o consumo?
Essas empresas querem capturar todos os dados que puderem de seus usuários para extrair dinheiro deles com mais eficiência. O Instagram faz isso com fotos, o Facebook com conexões de amigos e textos, o Spotify com o que você escuta e a Amazon com dados de compras e controle do mercado de terceiros. É tudo o mesmo jogo. As plataformas não são o produto para eles, nós somos o produto. Mídia social, música, compras são apenas lados diferentes da mesma moeda.
Como você avalia a greve que os funcionários da Amazon fizeram no Natal? Ela foi eficaz? O que deve mudar daqui para frente?
Em meus anos de defesa anti-Amazon, acho que nunca vi a conversa pública sobre a Amazon ser tão proeminente como foi durante as greves de Natal. Dessa forma (forçando as questões trabalhistas da Amazon à luz do público), as greves foram monstruosamente eficazes. Dito isso, os trabalhadores da Amazon ainda estão sendo mal pagos e sobrecarregados em ambientes incrivelmente perigosos, portanto, ainda há muita luta a ser travada.
Edição: Leandro Melito