A Central de Trabalhadores da Bolívia (COB, na sigla em espanhol) e o governo boliviano chegaram a um acordo para o reajuste dos salários nesta terça-feira (24). O aumento no salário mínimo será de 5,85% enquanto o salário-base aumentará 3%. O anúncio foi feito pelo presidente Luis Arce ao lado dos dirigentes sindicais. Com o reajuste, o salário mínimo passa a ser de 2.500 pesos bolivianos (R$ 1.866,90 na cotação atual).
O reajuste foi anunciado depois de semanas de negociação entre a central sindical e o governo. O grupo que representa os trabalhadores da Bolívia queria um aumento de 8% no salário mínimo e 7% no salário-base. Durante o anúncio, o presidente Luis Arce agradeceu a “maturidade” da central sindical de entender o momento econômico do país e disse que os salários vão valer desde janeiro e serão pagos de maneira retroativa a partir de maio.
“Com estes aumentos, temos a certeza de que a economia não só se manterá estável, como continuará a crescer, apesar dos efeitos externos e internos no país, continua a avançar e a crescer”, disse Arce.
Em seu discurso, ele ainda disse que a questão deve ser discutida de maneira “racional” e não ter como base “os caprichos de ninguém”. Ao lado de Luís Arce estava o secretário-executivo da COB, Juan Carlos Huarachi. O dirigente sindical afirmou que a proposta da central foi “saudável” e que o governo respondeu a situação econômica nacional.
O cientista político e professor da Universidade Mayor de San Andrés Marcelo Arequipa disse ao Brasil de Fato que o consenso sobre o salário não foi simples. De acordo com ele, Arce é considerado um governo que tem em sua base de apoio organizações sociais, o que é usado pela oposição para criticar medidas que aumentem os gastos do governo. O pedido também ficou acima do esperado pelo governo, já que a inflação anual na Bolívia terminou em 3,1% em março.
“Se assume que Arce forma parte das organizações sociais no país. Então, ao formar parte disso, sempre está sujeito a como tentar racionalizar os pedidos que muitas vezes são maximizados. Pediram uma porcentagem muito grande de reajuste. Essa racionalização também tem que propor uma alternativa. Todos os anos a Bolívia tem reajuste”, afirmou Arequipa.
O aumento dos salários também tem um pano de fundo político. O partido do presidente, Movimento ao Socialismo (MAS), passa por uma disputa interna que envolve o atual chefe do Executivo e o ex-presidente Evo Morales. Esse embate interno começou quando Evo voltou à Bolívia em 2020, após passar um ano exilado na Argentina por conta do golpe de Estado que levou à derrubada de seu governo, em 2019.
Evo começou a criticar as medidas do governo e chegou a dizer que não havia mais ministros do MAS e segeriu que o presidente deu uma guinada à direita. Os apoiadores de Luís Arce respondem afirmando que a postura da liderança histórica do MAS pretende rachar o governo para que ele volte ao poder.
As eleições da Bolívia serão em 2025 e Evo Morales não poderá ser candidato. O Tribunal Constitucional Plurinacional da Bolívia decretou em dezembro de 2023 que presidentes e vice-presidentes só poderiam exercer o cargo por dois mandatos, de forma seguida ou não. Essa era uma lacuna que já existia na Constituição boliviana. Antes, a Carta Magna afirmava que o presidente não poderia exercer o cargo por mais de dois mandatos, mas não especificava se eram seguidos ou não. Com a sentença judicial 1010, Evo Morales, que foi presidente por quatro mandatos, não poderia voltar ao poder.
Segundo Arequipa, o aumento dos salários também entra nesse jogo político como uma “resposta” às críticas de que o governo de Arce tem uma postura “neoliberal”.
“Tem um peso político porque Evo tenta dizer com a oposição que estamos em crise e que Lucho é um governo neoliberal. E isso é uma forma de resposta, porque o discurso é de que, se fosse um governo neoliberal, estaria mais próximo aos empresários. Então quebra politicamente essa ideia”, afirma o professor.
Edição: Lucas Estanislau