Depois de quase um mês do fim do período de inscrição para as eleições presidenciais da Venezuela, a oposição parece ter chegado a um nome para concorrer contra o atual presidente Nicolás Maduro no pleito. Edmundo González Urrutia, apresentado pela coalizão Plataforma Unitária, recebeu o aval do governador de Zulia, Manuel Rosales, e da ultraliberal María Corina Machado e deve ser o candidato de consenso do setor mais radical da direita.
Apesar do consenso dos dois opositores em torno do nome, Urrutia é um nome desconhecido da política e dos venezuelanos. Nunca disputou um cargo eletivo, não costuma dar entrevistas e sequer faz publicações nas redes sociais desde 2017. A falta de conhecimento do público em torno de Urrutia foi a aposta dos grupos opositores, mas tira peso político na disputa.
Para o sociólogo e professor da Universidade Central da Venezuela, Atílio Romero, o perfil “discreto” de Urrutia não pode continuar a partir de agora se ele realmente for o candidato da oposição.
“Ele é mais próximo da Ação Democrática e de Rosales. Tinha um discurso radical como toda a oposição, mas agora se aproxima mais do discurso democrático. Vai precisar falar, não pode ficar quieto sendo candidato”, afirmou ao Brasil de Fato.
Urrutia tem origem na classe média venezuelana. Nascido no Estado de Aragua, se formou em Relações Internacionais pela Universidade Central da Venezuela, fez mestrado na mesma área na American University, em Washington, D.C. e seguiu carreira como diplomata. De 1990 a 1991, Urrutia foi diretor do Ministério das Relações Exteriores. Foi nomeado embaixador na Argélia em 1991, ocupando o cargo até 1993. Voltou ao Ministério das Relações Exteriores em 1994 como diretor-geral de Política Internacional.
De 1998 a 2002 foi embaixador na Argentina durante os governos de Rafael Caldeira e Hugo Chávez. Deixou o cargo em 2002, depois do golpe contra o então presidente. Ele teria apoiado o movimento golpista e saiu da embaixada depois que Chávez voltou ao poder. Fez parte do conselho editorial do jornal de oposição El Nacional e foi presidente da junta diretora da coalizão opositora Mesa da Unidade Democrática (MUD).
Nesta segunda-feira (22), González Urrutia fez uma publicação agradecendo "o apoio firme e corajosos" da Plataforma Unitária e disse que a semana será "desafiadora e decisiva para o nosso país". Mesmo que a temperatura agora marque uma estabilização na busca por um nome, até a data das eleições, em 28 de julho, muita coisa pode mudar.
Consenso em partes
O nome de Urrutia foi escolhido pela Plataforma Unitária depois de uma novela envolvendo María Corina Machado e Manuel Rosales. A ultraliberal está inabilitada por 15 anos e não pode disputar o pleito. Ela tentou emplacar a professora de filosofia Corina Yoris como substituta, mas seu partido não pôde inscrevê-la. Já Rosales se inscreveu de última hora para que “a oposição não ficasse sem opções”. No entanto, já depois de terminado o prazo para inscrições, Urrutia foi registrado pela Plataforma Unitária.
A partir de então, começou uma negociação e uma troca de farpas entre Machado e Rosales. A ex-deputada chegou a afirmar que não apoiaria o governador de Zulia, que respondeu dizendo que Machado promove “violência” nas eleições.
Os dois lados tentaram resolver a questão, mas diversos desencontros adiaram a reunião para 17 de abril. O acordo caminhou até que em 19 de abril Rosales e Machado anunciaram apoio a Edmundo Gonzáles Urrutia.
No entanto, a disputa até chegar no nome de Urrutia parece não ser o fim de uma disputa em uma oposição sem unidade. No sábado (20), o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) anunciou que estava prorrogando o prazo para mudanças nas candidaturas em 72 horas. O prazo final é esta terça-feira (23).
A extensão do prazo dá tempo para partidos históricos da Venezuela, como o Comitê de Organização Política Eleitoral Independente (Copei), que articulam fortalecer a candidatura de nomes como Juan Carlos Alvarado ou Antonio Ecarri a partir da desistência de outros candidatos. Para Atílio Romero, esse movimento mostra como a oposição segue sem unidade para as eleições.
“Esse setor continua fragmentado. Essa ideia de reduzir o número de candidatos pode ser um tiro no pé. Se tem um polo forte com vários pequenos, ele consegue centralizar para enfrentar Maduro, mas com vários candidatos fortes, ele se fragmenta. O Copei pode ser um divisor de águas nesse sentido”, disse.
Observadores internacionais
A Venezuela tem recebido nas últimas semanas entidades internacionais que vão observar as eleições. A União Europeia, União Africana e o Centro Carter dos EUA já estiveram no país para discutir com o CNE e com o governo o processo.
Nesta segunda-feira (22), o ministro das Relações Exteriores, Yván Gil, recebeu a Equipe Técnica Eleitoral da ONU para falar sobre o pleito.
Em março, o Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela (CNE) convidou a Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac), Comunidade do Caribe (Caricom), União Africana, União Europeia, especialistas da ONU, Brics e o Centro Carter dos Estados Unidos para observar as eleições de 2024 no país.
A medida faz parte do que foi assinado no acordo de Barbados, em outubro de 2023.
Edição: Lucas Estanislau