O ministro Cristiano Zanin completou um mês no Supremo Tribunal Federal neste último domingo (3). Mesmo com tão pouco tempo, já participou de votações importantes, como a pauta da descriminalização das drogas ou a do marco temporal para os territórios indígenas.
Apesar de estar extremamente visado desde que foi indicado ao cargo pelo presidente, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ainda é cedo para avaliar sua atuação como ministro. É o que afirma o advogado criminalista José Carlos Abissamra Filho, associado ao Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD).
Em entrevista nesta segunda-feira (4) ao Central do Brasil, programa do Brasil de Fato em parceria com a Rede TVT, Abissamra lembrou que os outros ministros já ocupam suas cadeiras há muito mais tempo, e que o mais novo integrante da Corte pode estar em um processo de entendimento da posição que ocupa. O especialista lembrou que o voto de Zanin foi o primeiro a divergir dos demais ministros na avaliação sobre a descriminalização das drogas.
"Me parece que ali, talvez, usando uma expressão popular, seria mais 'ritmo de jogo'. É uma decisão que surpreendeu porque o Supremo tende a colocar o Brasil num patamar mais próximo ao de outros países quando decidem o mesmo tema, e o ministro adotou uma postura que eu vou chamar de 'mais clássica'. Isso acontece com todos os novos ministros. Eles às vezes demoram um pouco para pegar o ritmo da Corte", resumiu Abissamra.
O especialista afirmou que as decisões do Supremo nos últimos tempos têm sido, de alguma maneira, previsíveis. A chegada de um novo nome traz, então, uma carga de imprevisibilidade. Em tempos nos quais o Supremo está em evidência, as decisões de Zanin serão acompanhadas de perto.
"Eu acho que não é possível fazer ainda uma análise muito profunda das decisões do ministro. Um mês é pouco. É um cargo muito importante, a sociedade brasileira já entendeu que tem um peso político, jurídico, muito importante", disse Abissamra, que é mestre e doutor em direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
O advogado comentou ainda as críticas de setores progressistas, especialmente pessoas próximas a Lula e ao PT, aos posicionamentos de Zanin. Ele afirmou que a história mostra que os ministros quase sempre demonstram total independência em relação aos posicionamentos de quem fez a indicação.
"Eu acho que há uma expectativa da sociedade em relação aos ministros que assumem a cadeira por conta daquele movimento político que o indicou. Com o passar do tempo e com a evolução natural do exercício do poder, vai ficando claro que quem assume a posição de ministro é independente. A sociedade fica um pouco 'ah, não faz sentido, foi indicado pelo Lula, então deveria fazer assim e não assado'. A história mostra que não é isso", disse Abissamra, citando como exemplo o ministro Luiz Fux, que, para ele, tem "posicionamento antagônico" em relação à ex-presidenta Dilma Rousseff, que o indicou.
Posicionamentos conservadores não surpreendem a todos
Apesar da votação contrária ao marco temporal (e, portanto, a favor dos direitos dos povos indígenas), o novo ministro tem demonstrado postura conservadora desde que assumiu o cargo, para espanto de muita gente. Mas, para o advogado criminalista José Carlos Portella Junior, integrante do coletivo Advogadas e Advogados pela Democracia, isso não surpreende, já que, quando advogado, o Zanin teve atuação quase sempre focada em questões empresariais.
"Não é uma pessoa oriunda dos movimentos sociais, que entende os dramas da classe trabalhadora, especialmente periférica, negra. É sobre essa população que recai com maior incisividade o poder das agências penais, sobretudo na questão das drogas. Esse fato já era um aviso do que poderia vir nesses temas", disse Portella. "Pela experiência que nós temos de outros ministros oriundos dessa advocacia de colarinho branco, de empresários, geralmente eles vão por um caminho bem conservador."
A advogada Luciana Boiteux, professora de direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), afirma que a indicação de Zanin acende um alerta em setores progressistas para as próximas. Em outubro, por exemplo, ficará vaga mais uma cadeira no Supremo, com a aposentadoria de Rosa Weber.
"Mais do que nunca se faz necessário analisar o currículo de quem está sendo indicado para que se possa ter alguma possibilidade de atuar em pautas progressistas, na defesa dos direitos humanos e minorias. O que a gente viu nos últimos anos foi algo bem diferente", disse a especialista, que atualmente é vereadora da cidade do Rio de Janeiro pelo PSOL.
Edição: Rodrigo Durão Coelho