Golpismo

Gonçalves Dias diz que PM do DF descumpriu plano de segurança no dia 8 de janeiro

À CPMI, ex-ministro da GSI disse que as invasões só ocorreram 'porque o bloqueio da PM foi extremamente permeável'

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Ex-ministro-chefe do GSI, Gonçalves Dias, prestou depoimento à CPMI do 8 de Janeiro nesta quinta-feira (31) - Bruno Spada/Câmara dos Deputados

O ex-ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Marco Edson Gonçalves Dias, conhecido como G. Dias, afirmou nesta quinta-feira (31) que o bloqueio da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) na Esplanada dos Ministérios, em 8 de janeiro, estava “extremamente permeável”.  

Em depoimento à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que investiga os atos golpistas daquele dia,  o general da reserva disse que a corporação não cumpriu à risca o planejamento de segurança no local, apesar de ser a responsável. “Assisti ao último bloqueio da Polícia Militar ser facilmente rompido antes que os vândalos chegassem ao Planalto. Aquilo não podia ter acontecido. Só aconteceu porque o bloqueio da Polícia Militar foi extremamente permeável”, disse aos parlamentares.  

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O general disse que a corporação não cumpriu o Protocolo de Ações Integradas (PAI), elaborado pela Secretaria de Segurança Pública do DF (SSP/DF). O documento, que previa o reforço do efetivo da Polícia Militar, foi elaborado, em 6 de janeiro, em reunião na Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal com o objetivo de desenvolver o Plano de Apoio Integrado (PAI). Ele visava usar a PM do DF para conter possíveis .  

No encontro, estavam representantes dos seguintes órgãos: PMDF, Polícia Civil, Corpo de Bombeiros, Detran, DF Legal, o Senado Federal, a Câmara dos Deputados, o STF, o Ministério das Relações Exteriores e o Departamento de Estrada e Rodagens.   

O PAI determinava um bloqueio e revista dos participantes da manifestação nas proximidades do Buraco do Tatu, área da Rodoviária do Plano Piloto. Isso ocorreria no ponto em que o Eixo Monumental deixa de ser exclusivamente uma rota associada aos órgãos de poder de Brasília, passando a se transformar na Esplanada dos Ministérios e, posteriormente, culminando na Praça dos Três Poderes. 

“Os manifestantes romperam o cordão de isolamento da PM e impediram a revista. Deveria existir, depois dali um bloqueio total que impedisse o acesso à Alameda das Bandeiras e à Praça dos Três Poderes, e ele aparentemente não existiu, ou foi tênue e inexpressivo”, disse G. Dias. “Na avenida em frente do Palácio, a resistência da PMDF foi vencida. A partir de então, passaram a agir como se tivessem uma coordenação e atuaram como se fossem cercar o Palácio.”    

Plano Escudo 

O ex-ministro também disse que havia deixado a pasta na sexta-feira anterior (6/1) com a certeza de que Plano Escudo, protocolo defesa do Palácio do Planalto, estava operante desde a véspera, 5 de janeiro. Mas, três dias depois, em 8 de janeiro, o planejamento não foi executado. O plano é responsabilidade da Coordenação-Geral de Operações de Segurança Presidencial (CGOSP), órgão vinculado ao GSI. 

“Perguntei a ele [o general Carlos José Russo Assumpção Penteado, então secretário-executivo do GSI] por que o bloqueio na frente do Palácio, que deveria ter sido feito pela Polícia Militar do Distrito Federal, não havia sido montado. Aquele era o bloqueio do Plano Escudo do Planalto e tinha que estar montado. Não estava”, disse G. Dias. 

“O bloqueio do Buraco do Tatu foi feito. Entretanto, a revista prevista para ocorrer lá não foi feita. Os manifestantes romperam com facilidade o cordão de isolamento da PM e impediram a revista”, disse G. Dias. “Deveria existir depois daquele ponto um bloqueio total que impedisse o acesso à Alameda das Bandeiras e à Praça dos Três Poderes. Esse bloqueio aparentemente não existiu ou foi tênue, inexpressivo”. 

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“A Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal assegurava que tudo estava sob controle, que ações especiais eram desnecessárias. Aquele era o cenário no momento em que deixei o expediente do dia 6, sexta-feira”, disse. 

"Tendo conhecimento agora da sequência dos fatos que nos levaram às agressões de vândalos e também da ineficiência dos agentes que atuavam na execução do Plano Escudo, aprovado com a coordenação de diversos órgãos civis e militares e de segurança, seria mais duro que fui na repressão. Faria diferente, embora tenha plena certeza de que envidei todos os esforços e ações que estavam a meu alcance para mitigar danos", completou. 

Imagens de Gonçalves Dias no Planalto 

Gonçalves Dias também voltou a se defender das acusações de participação no ato golpista de 8 de janeiro, em Brasília. Em 19 de abril, ele pediu demissão do cargo horas após a divulgação de um vídeo pela CNN Brasil que indicou a sua presença no Palácio do Planalto em 8 de janeiro, momentos após o quebra-quebra promovido por bolsonaristas.   

No vídeo, é possível ver o ex-ministro circulando entre os golpistas. As imagens mostram, também, funcionários do GSI interagindo com alguns deles. O general classificou as imagens divulgadas pela CNN como “editadas e distorcidas”. Ele também afirmou à CPMI que conduziu todos os invasores ao segundo andar, onde teria sido realizada a prisão de 182 pessoas. “Preservei todas as salas do presidente da república, todo o quarto andar, sem nenhuma gota de sangue. Foram 182 presos a partir de minhas determinações”, disse.  

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"Fui treinado a minha vida toda para, em momentos de crise, em momentos difíceis da nossa vida, gerenciar as crises. A senhora não gerencia uma crise apagando fogo jogando gasolina. A senhora gerencia crise conversando com as pessoas e retirando as pessoas", respondeu G. Dias à relatora da comissão, a senadora Eliziane Gama (PSD-AM).  

G. Dias se deslocou até o Palácio do Planalto após o ex-diretor adjunto da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Saulo Moura da Cunha, alertá-lo de uma possível intensificação das manifestações.

Antes, o general Carlos José Russo Assumpção Penteado, e a subsecretária de Operações Integradas da Secretaria de Segurança Pública do DF, a coronel Cíntia Queiroz de Castro, haviam dito que “estava tudo calmo”.

Ao chegar no local, no entanto, e se deparar com os atos, G.Dias pediu reforço para o chefe da Secretaria de Segurança e Coordenação Presidencial, o general Carlos Feitosa Rodrigues. 

Relatórios da Abin 

O general da reserva também negou a suposta fraude nos relatórios feitos pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin) sobre as manifestações, enviados ao Congresso Nacional e à Procuradoria-Geral da República (PGR). 

“Pelo sistema da Abin não havia nenhuma informação. A troca pelo WhatsApp não corresponde à forma de comunicação institucional correta para a transmissão de informações sensíveis. Não havia nenhuma informação sobre o que ocorreria, ainda assim o Plano Escudo do Planalto estava operante por determinação minha. Somente após o 8 de janeiro fiquei sabendo de um grupo de WhatsApp, onde eu não estava”, disse G. Dias aos congressistas. 

Em depoimento à CPMI em 1º de agosto, o ex-diretor adjunto da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Saulo Moura da Cunha, confirmou o envio de alertas sobre a gravidade dos atos golpistas do 8 de janeiro às autoridades responsáveis pela segurança acerca das manifestações bolsonaristas por meio do grupo de WhatsApp.  

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Estavam no grupo representantes de 48 órgãos, como da assessoria de inteligência do Ministério da Defesa, dos centros de inteligência das três Forças Armadas, da Secretaria de Operações Integradas (SEOPI) do Ministério da Justiça e Segurança Pública e da Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal. Jader Silva Santos, que na época era subchefe da Coordenadoria de Avaliação de Riscos do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), também estava no grupo. Gonçalves Dias, então ministro do GSI, não estava presente. 

Cunha também confirmou que o então ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Gonçalves Dias, pediu que fossem retirados os registros de que recebeu os alertas da Abin do primeiro relatório de inteligência enviado ao Congresso Nacional.  

G. Dias alegou que não estava no grupo de WhatsApp para onde foram enviados alertas. Somente Jader Silva Santos estava nele, enquanto representante do GSI. O ex-diretor da agência também rebateu os congressistas que disseram se tratar de uma ilegalidade. “A ordem não é ilegal porque é o ministro que determina quais informações serão encaminhadas”, disse.   

No total, a Abin enviou dois relatórios ao Congresso Nacional sobre os alertas emitidos. No primeiro, enviado em 20 de janeiro, Gonçalves Dias aparece nos registros de receptores dos alertas. Já no segundo, encaminhado em 8 de maio, seu nome foi suprimido. 

“É uma versão delirante. Não mandei ninguém adulterar nada, nenhum documento. Apenas tão somente que organizasse as informações que deveriam ser dadas ao Congresso dentro de uma lógica única: os alertas de fontes abertas haviam sido passados por um grupo de WhatsApp. Como não estava nos grupos e não constava o nome de pessoas no relatório, apenas de órgãos, determinei que as informações fossem padronizadas. Nunca fui usuário de grupo de WhatsApp.” 

Edição: Rodrigo Durão Coelho