Após a última sessão da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST), realizada nesta terça-feira (29), a deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP) avalia que o cenário do jogo político em torno do colegiado se tornou menos favorável à ala bolsonarista, fiadora da CPI. A análise da deputada se pauta também em fatos que antecedem a reunião, como é o caso da situação jurídica do relator, Ricardo Salles (PL-SP), que na segunda-feira (28) se tornou réu em processo que apura um caso de exportação ilegal de madeira. A denúncia contra o ex-ministro do Meio Ambiente de Jair Bolsonaro (PL) foi feita pelo Ministério Público Federal (MPF) e acatada pela 4ª Vara Federal Criminal do Pará.
“Faz três semanas que eles dizem que vão recompor maioria na CPI e não conseguem. Estão há um tempo tentando convencer o Lira a prorrogar a CPI, e todas as declarações dele vão no sentido contrário. Hoje eles não têm votos garantidos sequer para aprovar o relatório do Salles, então, é bem capaz de que a coisa esfrie e acabe por isso mesmo. E, socialmente, o que eu acho que é o mais importante, a CPI se esvaziou politicamente. Eu acho que tem servido para fortalecer o nome do MST. Alguns parlamentares também tiveram destaque e, além disso, o Salles se tornou réu ontem. Acho que tudo isso foi um pouco inesperado para eles", considerou Sâmia ao Brasil de Fato.
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Na sessão desta terça (29), apenas dois dos 20 requerimentos previstos na pauta foram votados pela CPI. Os dois pedidos tratam da convocação de pessoas ligadas ao Instituto de Terras e Reforma Agrária de Alagoas (Iteral) e foram apresentados pelo deputado Fabio Costa (PP-AL). Nos bastidores, parlamentares do campo progressista suspeitam que os requerimentos tenham o interesse de atingir o senador Renan Calheiros (MDB-AL), principal rival público do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), no estado. As convocações seriam, então, uma forma de ajudar a convencer o pepista a aceitar a prorrogação da CPI, medida ventilada pelos bolsonaristas nos últimos meses, mas ainda não efetivada.
Nos bastidores, não se sabe ao certo se a ideia de dilatação do prazo dos trabalhos ainda tem chance de prosperar. A pauta tem vivido um intenso vaivém em meio às disputas que cercam a CPI. Na segunda (28), durante entrevista à rede de TV CNN, o presidente da comissão, Tenente-Coronel Zucco (Republicanos-RS), afirmou que mantém a intenção no radar. “Perdemos duas semanas por causa do recesso, além de uma semana do feriado do mês de junho”, argumentou.
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Lira tem sofrido pressão permanente da ala bolsonarista para a extensão do prazo dos trabalhos, previsto inicialmente para setembro. “A última cartada que eles têm para dar é convencer o presidente a prorrogar a CPI. Querem a todo custo fazer isso, mas eu não acho que a convocação de nomes de Alagoas seja suficiente, tendo em vista que os líderes, inclusive o líder do próprio partido do Lira [André Fufuca], deu declaração hoje de que não está mais a fim de que essa CPI vá até as últimas consequências”, disse Sâmia Bomfim.
Líder do PP, André Fufuca (MA) substituiu nesta terça-feira a deputada Ana Paula Leão (MG), que tem posicionamentos mais conservadores, por Mário Negromonte Jr. (BA), cuja postura política é mais simpática ao governo Lula. A mudança foi vista como um aceno à gestão, que em breve deverá ceder um ministério ao partido, a partir das costuras que vêm sendo feitas nas últimas semanas. A alteração ajudou a dificultar o placar das votações para a ala bolsonarista.
“Foi uma sessão decisiva porque foi um teste de quórum dos novos deputados que entraram na base do governo. Eles [bolsonaristas] perceberam que poderiam perder as votações, por isso eles mesmos tiraram os próprios requerimentos para tentar aprovar numa outra oportunidade. Depois o Salles pediu para o presidente encerrar a sessão”, destaca Sâmia, em referência ao fato de 18 dos 20 requerimentos não terem sido votados.
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Freio
Na avaliação da psolista, o cenário revelado nesta terça ajuda a frear as conquistas almejadas pela ala bolsonarista na CPI, que tem sido palco de diferentes ataques ao MST por parte de deputados do segmento. “Não foi convocada sessão para esta quarta. O presidente teria que ter convocado com 24 horas de antecedência. Não sei o que aconteceu, se ele se esqueceu, se já estava contando com alguma derrota, mas ele não fez essa convocação. Pode ser que tenha na quinta, mas a Câmara é muito esvaziada em dia de quinta. A próxima semana será mais curta por causa do feriado [de 7 de setembro] e a outra é perto do prazo-limite da CPI”, pontuou.
“A gente sai daqui otimista no dia de hoje. Claro que tudo pode acontecer, a base [do governo] é muito instável, e não necessariamente uma base ideológica que esteja aqui com o compromisso de defender o movimento, mas a gente pode comemorar até os próximos dias, pelo menos”, emendou Sâmia.
Edição: Rodrigo Chagas