O Supremo Tribunal Federal (STF) recebeu uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI) que contesta trechos da Emenda Constitucional 117/2022, que anistiou os partidos políticos que descumpriram a cota e os valores mínimos relacionados à inclusão racial e de gênero em eleições anteriores à norma. A emenda foi aprovada pelo Congresso Nacional em 5 de abril de 2022 e passou a valer já para as eleições municipais de 2020.
A ADI questiona o artigo 2 da emenda que estabelece aos partidos políticos que não utilizaram os recursos das cotas a garantia de utilização desses valores nas eleições subsequentes. Nesses casos, a lei determina a proibição da condenação pela Justiça Eleitoral nos processos de prestação de contas de exercícios financeiros anteriores que ainda não tenham transitado em julgado até a data de promulgação desta Emenda Constitucional.
A ação também contesta o artigo 3 que determina a não aplicação de sanções de qualquer natureza, inclusive devolução de valores, multa ou suspensão do fundo partidário, aos partidos que não preencheram as cotas mínimas.
O partido Rede Sustentabilidade e a Federação Nacional das Associações Quilombolas (Fenaq), com apoio da entidade Educação e Cidadania de Afrodescendentes e Carentes (Educafro), afirmam que a legislação perpetua a desigualdade, uma vez que anula as políticas afirmativas no campo eleitoral.
“Os dispositivos impugnados, contidos nos artigos 2º e 3º da mencionada Emenda, são incompatíveis com os princípios fundamentais e as garantias individuais e coletivas estabelecidas na Constituição. (...) . O objetivo desta ação é obter declaração de inconstitucionalidade de dispositivos de emenda constitucional violadores de cláusulas pétreas e preceitos fundamentais, notadamente todas as formas de discriminação racial decorrente de ações afirmativas por cotas de gênero e raciais em eleições, previstos na Constituição e em tratados internacionais de que o Brasil é signatário”, afirmam as organizações.
“No âmbito eleitoral, medidas como o financiamento especial para candidaturas de pessoas negras, mulheres e outros grupos sub-representados, têm como finalidade corrigir distorções e promover representação mais inclusiva. Essas medidas não constituem discriminação, mas sim resposta concreta às desigualdades estruturais e à exclusão que esses grupos enfrentam.”
O pedido para que os trechos da Emenda Constitucional 117/2022 sejam considerados inconstitucionais ocorre ao mesmo tempo em que a Câmara dos Deputados discute outra proposta com o mesmo objetivo, a PEC 9/2023.
A emenda 117/2022 aprovada em abril de 2022 concedeu anistia às legendas por terem descumprido regras nas eleições municipais de 2020. Agora, se o Congresso aprovar a PEC 9/2023, a anistia poderá ser estendida para o pleito de 2022. Isso significaria que, mais uma vez, os partidos políticos poderiam ser perdoados por não cumprirem as cotas de raça e gênero estabelecidas pela legislação eleitoral.
Em maio deste ano, a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou a admissibilidade da PEC 9/23. Na ocasião o deputado Tarcísio Motta (Psol-RJ) classificou a proposta como “vergonhosa”. “Anistia não só os problemas que aconteceram por conta da Emenda 117. Ela é vergonhosa também porque anistia todas as eleições anteriores, todos os problemas de prestação de contas de partidos”, disse.
Edição: Leandro Melito