O relatório “Conflitos no Campo Brasil 2022”, elaborado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) e divulgado nesta segunda-feira (17), aponta que a Amazônia Legal concentrou 59% dos conflitos por terra em 2022. A porcentagem aumentou em relação a 2021, quando o bioma foi palco de 51% das ocorrências.
Impulsionada pela falta de governança e pelo enfraquecimento dos órgãos ambientais federais e estaduais, a Amazônia se tornou palco de uma expansão desenfreada da fronteira agrícola, associada diretamente ao desmatamento ilegal e ao crime ambiental, conforme análise da CPT.
Os conflitos por terra na floresta amazônica cresceram em ritmo duas vezes mais intenso do que em outras regiões. Entre 2021 e 2022, as ocorrências no bioma saltaram de 695 para 926 em 2022, um aumento de 33%. Em todo o território nacional, o crescimento no período foi de 16,7%.
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Evolução anual dos casos de conflitos por terra na Amazônia Legal, segundo a CPT:
2013: 495
2014: 437
2015: 568
2016: 804
2017: 668
2018: 627
2019: 797
2020: 1044
2021: 695
2022: 926
“Os números explicitam a relação direta entre Estado e agronegócio. Trata-se de uma relação histórica baseada na exploração das comunidades, na morte de pessoas, na destruição da natureza e dos modos de vida das comunidades. Isso precisa acabar”, diz Carlos Lima, da coordenação nacional da CPT.
Entre as vítimas de conflitos por terra no bioma, o relatório destaca as centenas de crianças Yanomami vítimas do garimpo ilegal, além do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips, assassinados por integrantes de uma quadrilha internacional de pesca ilegal na Terra Indígena Vale do Javari (AM).
Indígenas foram vítimas de 38% dos assassinatos
Com os conflitos, vêm os assassinatos: 34 das 47 mortes no campo registradas no Brasil - 72% - ocorreram na Amazônia. Um sintoma, segundo a CPT, de desafios significativos em segurança pública, proteção dos direitos humanos e omissão ou conivência do poder público com a violência.
A análise da identidade social revela que a maioria das vidas perdidas foram dos povos originários. Em 2022, 38% dos assassinatos tiveram indígenas como vítimas (18 mortes), seguidos por sem-terras (9), ambientalistas (3), assentados (3) e trabalhadores assalariados (3). Os dados são relativos a todo o território nacional.
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Elaborados desde 1985, os relatórios anuais da Comissão Pastoral da Terra mostram que as comunidades indígenas despontam como principais vítimas a partir de 2019. Em 2022, os povos originários foram atingidos por 28% dos conflitos por terra. Na sequência estão posseiros (19%), quilombolas (16%), sem-terras (12%) e famílias assentadas da reforma agrária (9%).
Além dos indígenas da região Norte, a violência ocorreu em 2022 contra os Pataxó no sul da Bahia e os Guarani-Kaiowá no Mato Grosso do Sul. Nos dois casos, a violência é praticada por milícias rurais e policiais estaduais, que respondem a interesses de fazendeiros e grileiros de terras.
“Um dos mais graves epicentros de violência”
“A curva ascendente de conflitos na Amazônia Legal a torna um dos mais graves epicentros da violência no campo na atualidade. Esse cenário reflete a determinação política do governo federal em transformá-la num palco de exploração e devastação, criando um verdadeiro campo minado”, escreveu a CPT.
Em outra categoria analisada pela CPT, 'Violência Contra Pessoa', a floresta amazônica foi palco de 64,5% das ocorrências, com 360 casos em 2022, aumento anual de 40%. Além dos homicídios, a categoria abrange tentativas de assassinato, mortes em consequência de conflitos, ameaças de morte, torturas, prisões e agressões.
Já entre os causadores da violência no campo, os fazendeiros seguem em primeiro lugar, com 23%. Em seguida está o governo federal (16%), empresários (13%) e grileiros (11%). A CPT aponta que a principal mudança em relação a 2021 foi o crescimento da participação do governo federal, que saltou 6% no período.
Edição: Vivian Virissimo