Organizações da sociedade civil se uniram para pedir o cancelamento da decisão que libera o cultivo e o comércio do trigo transgênico HB4 no Brasil. Um documento foi elaborado e enviado no último dia 20 ao ministro da Casa Civil, Rui Costa, alegando ilegalidades no processo de aprovação do alimento, além de alertar para riscos à saúde da população e ao meio ambiente.
A plantação do trigo transgênico no país foi aprovada pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) no dia 1º de março, mas entidades denunciam falta de análises técnicas e debates públicos suficientes. Elas pedem também a suspensão da importação da farinha de trigo transgênico HB4 da Argentina.
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O colaborador da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), Leonardo Melgarejo, explica que as preocupações sobre a “liberação precipitada” do trigo HB4 é que pela primeira vez um organismo geneticamente modificado se destina diretamente à alimentação humana. No caso de outros produtos transgênicos, como o milho, por exemplo, é destinado à alimentação animal e chega aos humanos de forma indireta.
“O grande problema nesse caso é que esse trigo é veículo para um herbicida que é comprovadamente muito perigoso à saúde humana e animal e ao ambiente. As análises de risco realizadas com a farinha de trigo, que foi utilizada como subterfúgio para que o plantio fosse aprovado no Brasil, deveriam merecer uma preocupação maior, não consta que tenham sido analisados impactos sobre animais, mesmo que tenham sido sobre ratos que não nos representam tão bem assim, mas não foram analisados o ciclo de vida completo do animal, foram ensaios de muito curto prazo, então os problemas de longo prazo de intoxicação crônica desaparecem em estudos de 90 dias”, diz.
De acordo com Leonardo, estudos publicados em outros países mostram que há impactos significativos na divisão celular de seres vivos. “Nós podemos esperar distorções em gerações seguintes pelo contato frequente com esse veneno. Estudos realizados na Argentina mostram também que seres aquáticos em contato com a água com resíduos desse veneno perdem a capacidade de locomoção. Eles passam a ser presas mais fáceis para seus predadores porque eles se tornam abobalhados, eles perdem a coordenação, o que é interpretado como impacto sobre o sistema nervoso”, explica Melgarejo.
Base alimentar
O trigo faz parte da base alimentar de grande parte da população do país e uma das justificativas para aprovação do produto transgênico é de que ele seria essencial no combate à fome por conseguir sobreviver em diferentes ambientes, inclusive em biomas afetados pela seca.
A advogada socioambiental e integrante da Organização Internacional GRAIN, Larissa Packer, diz que essa é uma “conclusão equivocada” e que não há estudos suficientes que comprovam a justificativa.
“Esse é o mesmo discurso de 20 anos atrás que falava que a população está aumentando e nós não temos comida no mundo, então precisamos de novas tecnologias para aumentar a produtividade e a gente sabe que a gente tem alimentos suficientes, o problema não é de escassez de insumos, mas sim a distribuição desses alimentos, já que a cadeia alimentar global vem sendo capturada por poucas corporações do agronegócio, justamente as de biotecnologia que detêm a patente sobre esse pacote tecnológico: a semente transgênica associada a um agrotóxico”, explica.
Já Maurício Roman, da direção nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), diz que é preciso publicizar os métodos de cultivo do trigo para a população, assim como os riscos, pois “sem esse debate com as pessoas não há legalidade no processo de aprovação”.
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“Onde que foi realizado um estudo técnico que diz que esse produto vai produzir mais? Que seu grão vai fazer uma farinha melhorada ou não vai causar nenhum malefício às pessoas ou aos consumidores? Onde entrou a questão do plano de saúde? Essa nova liberação tem que ser melhor averiguada por isso a gente está pedindo ao governo que tenha cautela ao tomar essa deliberação para que haja um melhor estudo, a população tem que discutir isso, a população quer mesmo um trigo transgênico?”, afirma.
Para Maurício, a melhor solução para o combate à fome no país é investir na produção de alimentos saudáveis para todos. “Nós precisamos é de políticas públicas voltadas para os pequenos assentamentos, para as pequenas famílias produtoras e para as famílias de subsistência, uma política pública diferenciada do estado, isso que se necessita hoje”, finaliza.
A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança respondeu, em nota, às organizações que pedem a suspensão do cultivo e comércio do produto transgênico, afirmando que o trigo HB4 é seguro ao meio ambiente e à saúde humana e animal. Quanto ao fato do trigo absorver agrotóxicos proibidos na Europa, a CTNBio disse não deliberar sobre o uso de herbicidas e que isso é de competência da Anvisa.
Fonte: BdF Rio de Janeiro
Edição: Mariana Pitasse