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Cuba se aproxima de eleições com maior número de candidatos jovens, mulheres e negros

Entenda como pleito funciona; Assembleia Nacional tem o poder de indicar o presidente e vice-presidente do país

Havana (Cuba) |
Contagem de votos de referendo em Cuba, em 2022 - Yamil Lage / AFP

No dia 26 de março, 470 deputados serão eleitos para a Assembleia Nacional do Poder Popular de Cuba, o mais alto órgão político do país, por um período de cinco anos. Há mais candidatos jovens, negros e mulheres participando deste pleito.

A campanha na ilha não tem a forma de propaganda, como nos países capitalistas. Não há anúncios sorridentes nas ruas, nem spots publicitários com promessas. Nas semanas que antecedem as eleições, os candidatos realizam visitas a bairros, locais de trabalho e centros estudantis, onde são convocadas e organizadas assembleias para intercâmbio com a população. Nestes encontros públicos, os postulantes ao Parlamento cubano conversam com os eleitores e escutam suas preocupações, perguntas, reclamações e propostas.

Um quinto de todos os candidatos são jovens entre 18 e 35 anos de idade. Isto representa um aumento em comparação com a atual legislatura. Mais da metade das candidatas são mulheres.

A média mundial de mulheres no Parlamento, de acordo com o Fórum Econômico Mundial, é de apenas 26%. Ruanda, com 61% do Parlamento composto por mulheres, tem o maior índice de participação feminina.

Ao mesmo tempo, podem ser feitos progressos na questão racial. Enquanto na legislatura anterior 40% de seus membros eram negros, este número aumentou para 45% nos atuais candidatos.

"O poder político em Cuba tem a particularidade de ser reconhecido como um poder único. É precisamente porque não podemos falar de uma divisão de poderes. É um poder único que reside na Assembleia Nacional do Poder Popular. Este é o órgão máximo de poder no Estado cubano, dos quais diferentes funções são delegadas a outros órgãos que compõem a estrutura do Estado cubano. Portanto, a Assembleia Nacional do Poder Popular é o mais alto órgão de poder do Estado que tem funções constituintes e legislativas. A Assembleia Nacional é composta por deputados eleitos diretamente pelo povo. O presidente, vice-presidente e secretário da Assembleia são eleitos na Assembleia", explica o advogado Loyet Ricardo em entrevista ao Brasil de Fato.

Ao contrário dos sistemas políticos multipartidários, os candidatos ao legislativo cubano não são eleitos através de competição entre diferentes agremiações. Mas, ao contrário do que muitas vezes se acredita, tampouco é o Partido Comunista Cubano que escolhe os candidatos para a Assembleia. Ao contrário, as candidaturas são construídas pelas chamadas "comissões de candidatura".

As comissões de candidatura são formadas por representantes das lideranças de diferentes espaços setoriais e sindicais de participação que, por sua vez, são constituídas pela Federação de Estudantes Universitários, a Central de Trabalhadores de Cuba, a Associação Nacional de Pequenos Agricultores, a Federação de Estudantes do Ensino Médio, a Federação de Mulheres Cubanas e os Comitês de Defesa da Revolução. Estas comissões propõem diferentes candidatos que serão votados nas eleições.

Os representantes eleitos não recebem um salário superior ao do trabalhador médio. Da mesma forma, os funcionários são obrigados por lei a prestar contas a seus eleitores e seu mandato pode ser revogado a qualquer momento.


O Capitólio de Havana, sede do Legislativo de Cuba / Yomangani / Wikimedia Commons

"A participação se dá entre o povo e nos mecanismos que o povo tem e que são reconhecidos na Constituição e nas leis para ser eficaz, para poder participar. Em Cuba, não podemos falar somente de democracia e, portanto, de participação no exercício do voto, mas também no exercício do direito reconhecido do povo de controlar o exercício desse poder. O poder que eles colocam nas mãos do Estado. Na capacidade de fazer parte do processo decisório, de poder exigir que o Estado seja responsável por sua gestão e pela satisfação das necessidades e exigências da população", avalia Loyet Ricardo.

Taxa de participação é desafio

Um dos fatores que mais levanta questões sobre estas eleições é o nível de participação. Cuba enfrenta atualmente uma grave crise econômica que produziu um mal-estar social que se manifesta de muitas maneiras. Um deles tem sido um distanciamento político que tem levado a uma diminuição da participação política e eleitoral. 

Entre 1976 - ano em que a primeira Constituição foi sancionada após o triunfo da Revolução Socialista de 1959 - e 2010, o índice de participação eleitoral variou entre 95,2% e 95,9% dos eleitores. Isto coloca o nível de participação dos eleitores bem acima do da maioria dos países. Um exemplo disso é o próprio caso do Brasil, com o maior comparecimento dos eleitores nas eleições de abertura democrática de 1989, quando 88% dos eleitores votaram - o maior nível de participação até hoje.   

Durante os anos seguintes, embora o nível de comparecimento eleitoral em Cuba tenha sofrido um ligeiro declínio, ele permaneceu em níveis elevados. Nas eleições de 2015, os índices de afluência às urnas foram de 89%, e nas eleições municipais de 2017, a abstenção foi de 14%.

Entretanto, nas eleições para delegados do Poder Popular, uma espécie de conselho, realizadas em 2022, a abstenção aumentou acentuadamente, atingindo 31,5% do número total de eleitores. Este número - embora normal para os padrões da maioria dos países - foi a maior taxa de abstenção na história das eleições cubanas desde o triunfo da Revolução.

Edição: Thales Schmidt e Patrícia de Matos