O Congresso do Peru aprovou a abertura de um processo de impeachment contra o presidente Pedro Castillo, acusado de corrupção pelos parlamentares opositores. Com 73 votos favoráveis, 32 contrários e seis abstenções o processo - o terceiro já feito contra Castillo - foi referendado na noite da última quinta-feira (1º). A próxima sessão para escutar a defesa do presidente peruano foi adiantada para a próxima quarta-feira (7).
Os congressistas acusam Castillo de não ter "capacidade moral" para chefiar o país. Desta fez, foi o deputado Edward Málaga Trillo (Partido Morado) quem propôs o impeachment, alegando que é "inaceitável que um presidente exerça o cargo com indícios de corrupção ou graves questionamentos morais e éticos". Além do Partido Morado, as bancadas dos partidos Força Popular, Renovação Popular, Avança País, Somos Peru e Aliança para o Progresso (APP) também apoiaram a moção.
São necessários 87 votos, equivalente a 2/3 do total de 130 congressistas, para destituir o mandatário.
A socióloga e ex-ministra da Mulher, Anahí Durand não crê na possibilidade de derrubada de Castillo. "Tudo indica que não terão os votos. É mais uma demonstração do golpismo, não estão preocupados com a corrupção, estão buscando derrubar o presidente desde que ele assumiu, quando começaram a denunciar uma suposta fraude", declarou em entrevista ao Brasil de Fato.
Entenda o caso
Esta não é a primeira vez que Pedro Castillo enfrenta uma tentativa de impeachment promovida pelo Parlamento. Nas últimas eleições gerais, a antiga legenda do presidente, Peru Livre obteve a maior bancada, com 37 deputados, no entanto eram necessárias alianças com partidos de centro-esquerda e centro-direita para garantir a maioria no Legislativo.
Antes de chegar à metade do mandato, o presidente peruano já derrotou duas tentativas de abertura de processo de impeachment, mas para isso teve de fazer concessões e abrir seu governo a setores no campo da direita.
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A primeira moção foi feita pela deputada Patricia Chirinos (Avança País), em novembro de 2021, acusando o mandatário de possuir um gabinete paralelo que comandava seu governo. No entanto, a proposta obteve o apoio de apenas 46 congressistas.
O segundo pedido foi promovido pelos partidos de extrema-direita, Renovação Popular e Força Popular, acusando Castillo de liderar esquemas de corrupção para desviar fundos do Estado e beneficiar empresas privadas através de licitações de obras públicas. A votação aconteceu em março deste ano e a moção contou com apoio de 55 parlamentares, insuficiente para iniciar o processo.
Guerra de braço
A atual Constituição do Peru, aprovada durante o regime de Alberto Fujimori, estabelece uma espécie semi-presidencialismo, dando ao Legislativo espaço no Executivo, assim como também permite ao presidente o fechamento do Congresso.
Por isso, Castillo acusa a oposição de tentar desestabilizar seu mandato, através da reprovação do seu governo, negando os gabinetes de ministros propostos e caçando o mandato de funcionários do Executivo.
Em um ano de gestão, o presidente peruano alterou seu gabinete ministerial em cinco ocasiões. Em cada uma das reformas, os partidários do Peru Livre e outras legendas de esquerda que apoiaram a sua candidatura, como Novo Peru, foram perdendo espaço no governo, até que em junho deste ano, Castillo se desligou do partido Peru Livre.
Embora uma das principais propostas de campanha de Pedro Castillo fosse a convocatória de uma constituinte, o projeto de lei de abertura e regulamentação do processo constituinte está parado desde abril no Congresso.
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"Viemos de uma crise política antiga, desde 2016 vivemos essa sequência de destituição de presidentes e fechamento de Congresso, o que deteriorou os limites constitucionais no país. Infelizmente, os setores que controlam o Congresso estão manobrando a legislação para poder aferrar-se ao poder sem ter vencido as eleições", denuncia a ex-ministra Anahí Durand.
Pedido de diálogo
O presidente peruano convocou os opositores ao diálogo nacional. "Seguindo o espírito com o qual iniciei meu governo e que está expresso nas recomendações da OEA, faço um chamado aos chefes das instituições de Estado e aos líderes políticos e sociais para dialogar e assegurar a governabilidade", disse o mandatário.
Além do conflito com o Legislativo, Castillo também enfrenta resistência no Judiciário, tendo cinco investigações abertas contra ele e sua família pelo Ministério Público (MP).
No dia 12 de outubro, o MP peruano encaminhou ao Congresso uma acusação de corrupção e tráfico de influência contra Castillo, alegando que o presidente lidera uma organização criminosa para fraudar licitações públicas.
"É uma série de atos que estão sendo feitos e ameaçam a institucionalidade democrática, ameaçam a figura presidencial e as ações do Executivo", comentou o ministro de Justiça a meios locais peruanos, Félix Chero.
Em seguida, o presidente acionou a Carta Democrática Interamericana da Organização dos Estados Americanos (OEA) para "defender a democracia" do Peru.
O Conselho Permanente do organismo aprovou o envio de uma missão que deveria observar o exercício das instituições peruanas e o cumprimento da lei, assim como promover uma mesa de diálogo nacional.
Na última quinta-feira (1º), o grupo de alto nível da OEA publicou um informe preliminar, alegando alta instabilidade democrática, polarização entre poderes e confrontação permanente.
A missão recomenda que se convoque uma instância formal de diálogo entre todos os poderes para uma "trégua política" e que se o impasse continuar, o Tribunal Constitucional do Peru deveria agir.
"O cenário é complexo. A OEA foi objetiva no seu informe ao indicar que existe um setor golpista que não está disposto a dialogar e vai seguir nessa via. Isso é perigoso. Acredito que paralelamente é necessário avançar numa proposta de uma assembleia constituinte para resolver a crise de fundo. E um terceiro ponto é manter o diálogo com os setores que têm disposição a dialogar", analisa Durand.
Mesmo com parecer da missão da OEA, o Congresso levou adiante o pedido de impeachment. "Apesar de tudo, seguirei trabalhando pela vigência do Estado constitucional de direita, o equilíbrio entre poderes, a democracia fundada na vontade popular e por um país próspero que respeite os poderes do Estado", reiterou Pedro Castillo.
Se a destituição for aprovada na próxima quarta-feira (7), a vice-presidenta Dina Boluarte assume o governo.
Edição: Rodrigo Durão Coelho