A tese de que o candidato bolsonarista ao governo de São Paulo Tarcísio de Freitas (Republicanos) teria sido alvo de um atentado no dia 17 de outubro, em Paraisópolis, zona sul de São Paulo, está cada dia mais frágil. O Brasil de Fato teve acesso ao Boletim de Ocorrência (BO) lavrado pela Polícia Civil após o episódio. O documento mostra que a cena do crime foi alterada pela Polícia Militar.
Para o ex-ouvidor das Polícias de São Paulo, Benedito Mariano, o BO coloca em xeque a versão do atentado. "Pode ter sido uma armação, está muito estranho. Pode ter havido cooperação dos policiais que estavam lá. Eu acho que essa ocorrência não foi devidamente esclarecida. Eu tenho dúvidas se houve tiroteio, é urgente que as câmeras dos uniformes apareçam. Além do Boletim de Ocorrência, sabemos também que a equipe do Tarcísio pediu que as imagens fossem apagadas."
Ainda de acordo com Mariano, "é possível que uma vida tenha sido ceifada para que uma tese fosse projetada. Não houve atentado contra o candidato, isso é blefe. Eu acho que não houve confronto, então precisamos saber o que aconteceu", finaliza.
No BO, um dos policiais que participaram da ocorrência, que terminou na morte de Felipe Silva de Lima, de 27 anos, afirma que o tenente Ronald Quintino Correa Camacho foi até a rua Manoel A. Pinto, onde o corpo do jovem estava e retirou uma lista de objetos da cena do crime.
"Um coldre, celular, relógio, um carregador de pistola, além de diversos cartuchos e estojos, que arrecadou no local, afirmando que seria para que não fossem perdidos ou subtraídos por populares", informa o policial militar no Boletim de Ocorrência.
Tenente-coronel aposentado da Polícia Militar de São Paulo, Adilson Paes de Souza lamentou a alteração da cena do crime e disse que a "atitude é bem comum na PM". "Isso é fraude processual, tem policiais condenados por isso. O que o tenente fez é um ato comum, de alteração da cena, e fazer valer a versão deles, para sustentar a tese adotada pelos policiais."
Outro lado
Tarcísio de Freitas se manifestou por nota. "É importante esclarecer que a campanha nunca levantou a tese de atentado. Essa afirmação não foi feita por Tarcísio. Questionamentos sobre a cena do crime devem ser feitos diretamente à polícia, que é quem acompanha as investigações e a quem cabe responder sobre o assunto."
A tese de atentado foi levantada pela emissora Jovem Pan, linha auxiliar do candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL) na mídia. Ato contínuo, bolsonaristas passaram a politizar o episódio e tratá-lo como uma ofensiva à campanha.
Em seu programa eleitoral do dia 17 de outubro, a campanha de Jair Bolsonaro corroborou a tese. "O candidato Tarcísio de Freitas e sua equipe foram atacados por criminosos em Paraisópolis".
No mesmo dia, o vice da chapa de Bolsonaro, Braga Netto, usou a palavra "atentado" para se referir a troca de tiros que ocorreu na região. "Você não entra em uma comunidade feito a do Alemão sem ter uma autorização do tráfico. Você tem que conversar com o tráfico antes, porque mesmo que o tráfico não ataque, pode ter tiroteio. Veja o que aconteceu com o Tarcísio, acabou de sofrer um atentado." A declaração foi concedida à Rede Vida.
Netto, ao citar o Alemão, tenta associar o tráfico de drogas a Luiz Inácio Lula da Silva (PT), candidato à presidência. Quando foi à comunidade, o petista usou um boné com a inscrição "CPX". Bolsonaristas passaram a espalhar a notícia falsa de que a expressão seria a sigla de uma facção criminosa.
Procurada, a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP-SP) não respondeu até o fechamento da matéria.
Edição: Thalita Pires