Quando a Petrobras anunciou o terceiro reajuste do diesel deste ano, no dia 11 de maio, o presidente Jair Bolsonaro (PL) decidiu reposicionar seu governo para tratar da estatal. Na ocasião, o presidente demitiu o então ministro das Minas e Energia, almirante Bento Albuquerque, e escalou Paulo Guedes, da Economia, para cuidar da companhia.
Pouco mais de um mês depois da mudança, as primeiras consequências da “gestão Guedes” começam a aparecer: combustível ainda mais caro, caos na chefia da estatal e rumores cada vez maiores de privatização da empresa.
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Guedes aumentou seu poder na Petrobras, primeiramente, colocando no Ministério das Minas e Energia (MME) um subordinado: Adolfo Sachsida, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Economia, comandado por Guedes.
Sachsida chegou ao MME prometendo dar início a estudos para privatizar a Petrobras. Um dia após assumir o cargo, entregou ao próprio Guedes um pedido formal para que o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) avaliasse a desestatização. Esse pedido já foi aceito e a privatização da Petrobras já está em análise.
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Já no dia 23, Guedes conseguiu que Caio Mário Paes Andrade, seu secretário especial de Desburocratização, fosse indicado à presidência da Petrobras. Preocupado com os efeitos do alto preço da gasolina e do diesel sobre sua campanha à reeleição, Bolsonaro quis mostrar força, anunciou a demissão de José Mauro Ferreira Coelho – ex-presidente da Petrobras empossado dias antes de ser demitido – e concordou em nomear outro subordinado de Guedes à chefia da estatal.
Esse movimento, porém, criou um caos na direção da companhia. Andrade não tem experiência no setor de petróleo exigida em lei para que ele comande a Petrobras. Logo que seu nome foi anunciado, petroleiros denunciaram esse problema.
O conselho de administração da Petrobras, então, resolveu pedir uma análise minuciosa do currículo de Andrade antes de aceitá-lo como presidente da empresa. Publicamente demitido, Ferreira Coelho acabou ganhando sobrevida à frente da estatal.
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Novo aumento cria crise
Com ele ainda à frente da empresa, a Petrobras anunciou mais um aumento do diesel e também da gasolina, na sexta (17). A alta foi discutida pelo conselho de administração da empresa um dia antes de ser comunicada. O governo tem maioria no conselho. Bolsonaro, entretanto, resolveu culpar Ferreira Coelho pelo reajuste.
Bolsonaro ameaçou articular a criação de uma CPI para investigar Ferreira Coelho e outros membros da chefia da Petrobras. Seu aliado, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), cobrou a renúncia de Ferreira Coelho.
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Ele até resistiu a um final de semana. Nesta segunda-feira (20), porém, a Petrobras comunicou que ele havia pedido demissão do cargo.
A renúncia de Ferreira Coelho não resolveu o problema que o levou à demissão. Os preços da gasolina e do diesel vendidos pela Petrobras realmente subiram. Só em 2022, acumulam alta de 31% e 68%, respectivamente.
Privatização como objetivo
O economista Eric Gil Dantas, do Observatório Social do Petróleo (OSP), afirmou que essa nunca foi a preocupação de Guedes. Segundo Dantas, o ministro é defensor da política de preços da Petrobras, que tem causado sucessivos reajustes.
Dantas afirmou que o que Guedes quer, na verdade, é desestabilizar a Petrobras para colocá-la à venda. Ele, por sinal, tem sido bem sucedido.
“Por trás desse ataque à Petrobras está o plano do Guedes para privatizar a Petrobras. Esse plano inclui a nomeação do Sachsida no MME e de Andrade na presidência da estatal”, explicou Dantas. “Nisso, Paulo Guedes avançou.”
Em entrevista ao Brasil de Fato, Rosângela Buzanelli, funcionária e membro do conselho de administração da Petrobras, já havia alertado sobre o plano orquestrado do governo para vender a estatal. Segundo ela, a iniciativa também inclui o presidente da Câmara, Lira, que defendeu a aprovação de um projeto de lei simplificado para a privatização.
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No domingo, o colunista Lauro Jardim, d’O Globo, informou que Sachsida tem praticamente pronto o projeto para desestatização da Petrobras. Ele só aguardaria um sinal do presidente Bolsonaro para enviá-lo ao Congresso.
Segundo Jardim, Sachsida vê um momento político favorável à discussão da venda do controle da Petrobras justamente por conta da alta dos combustíveis, cujo preço em última instância é controlado pelo governo.
O coordenador-geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP), Deyvid Bacelar, reafirmou a responsabilidade do governo e de Bolsonaro sobre os valores da gasolina, diesel e gás de cozinha. Segundo ele, o preço desses produtos tem subido porque o governo os mantém atrelados ao custo do petróleo no exterior, mantendo o chamado preço de paridade de importação (PPI).
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“Se Bolsonaro quisesse, já teria mudado a política danosa do PPI. Ele teve mais de três anos para isso. O PPI não é lei, pode ser abolido com a orientação do Presidente da República, da mesma forma como foi criado em outubro de 2016, no governo Michel Temer”, afirmou.
Bacelar também vê Guedes e Bolsonaro articulados para destruir a reputação da Petrobras. “Trocas sucessivas de presidente e diretoria da estatal fazem parte da mesma estratégia em busca de destruição da imagem da empresa”, afirmou.
Edição: Nicolau Soares