A Reforma do Ensino Médio, aprovada em 2017, trouxe efeitos negativos para os alunos da rede estadual de São Paulo. Os estudantes têm possibilidades de escolha limitadas, há falta crônica de professores e baseia a expansão da carga horária no modelo online de aulas. Essa é a conclusão da Nota Técnica Novo Ensino Médio e Indução de Desigualdades Escolares na Rede Estadual de São Paulo, produzida pela Rede Escola Pública e Universidade (Repu).
O estudo analisou o funcionamento do Novo Ensino Médio no Estado de São Paulo, que foi o primeiro a implementar a reforma de maneira massiva. A mudança foi concretizada durante a pandemia de covid, o que prejudicou a participação de estudantes e da sociedade.
Análise: O “novo ensino médio”: traição à juventude que frequenta a escola pública
Um dos grandes apelos do Novo Ensino Médio, a liberdade de escolha para os alunos, não se concretizou. “Em 2021, os estudantes tiveram que responder a um extenso questionário online, onde deveriam escolher pelo menos 6 entre 35 opções de formações. Entretanto, os alunos só podem cursar um itinerário formativo”, explica Fernando Cássio, professor adjunto da Universidade Federal do ABC e integrante da Repu.
“Esse tipo de questionário faz com que todas as opções possíveis sejam bem votadas, o que acaba justificando qualquer escolha de itinerários por parte da escola”, afirma. Além disso, as ementas dos itinerários só foram disponibilizadas depois do término da consulta aos alunos.
Leia também: Reforma do Ensino Médio: os 40% que se distanciam da educação pública de qualidade
Na prática, 1.327 escolas de Ensino Médio da rede estadual (35,9% do total) ofertam apenas dois itinerários formativos entre dez possíveis para o 2º ano, o mínimo exigido pela Secretaria Estadual de Educação de São Paulo (Seduc-SP). Cada itinerário engloba uma série de matérias voltadas a um campo específico, como humanidades ou ciências exatas.
Os itinerários formativos mais oferecidos pela rede estadual são ‘Cultura em Movimento’, que inclui as áreas de Linguagem, História, Geografia, Arte, Filosofia e Sociologia, e ‘Meu Papel no Desenvolvimento Sustentável’, que inclui as áreas da Física, Química, Biologia e Matemática. Como o estudante só pode escolher um itinerário, a formação nas matérias que não estão contempladas em opção fica comprometida.
Sem escolha
Além disso, dados do Censo Escolar 2020 (Inep) mostram que 334 dos 645 municípios do estado de São Paulo possuem apenas uma escola pública de Ensino Médio. Os estudantes dessas cidades não têm qualquer opção além de aceitar os itinerários oferecidos. Em cidades maiores, a liberdade para escolher o itinerário também é limitada. As matrículas são realizadas de acordo com a proximidade com o endereço de residência do estudante. A transferência não é proibida, mas é dificultada pelo sistema de matrículas.
O estudo também conclui que estudantes com renda média e escolaridade da família mais elevadas têm, em geral, maior possibilidade de escolha de trajetórias escolares em comparação a estudantes mais pobres. “As análises mostram que a variedade de itinerários formativos depende muito mais das condições materiais das escolas, como salas de aulas disponíveis, equipe de professores e outros fatores relacionados à gestão escolar”, afirma Cássio.
Entenda: Reforma do ensino médio vai dar “menos escola a quem mais precisa”
Escassez de professores
A nota técnica mostra ainda que, dois meses após o início do ano letivo, 22,1% das aulas dos itinerários formativos do Ensino Médio do 1º semestre de 2022 ainda não haviam sido atribuídas a nenhum professor. Isso equivale a um dia a menos de aula por semana para esses estudantes. A situação dos períodos vespertino e noturno é ainda mais grave: 1,5 dia de aula a menos por semana.
Outra promessa do Novo Ensino Médio, o aumento da carga horária, também mostrou problemas. Em 90,30% das turmas (13.314 turmas) do 1º e 2º anos da rede estadual, essa expansão está sendo feita a distância com a mesma plataforma utilizada para o ensino remoto durante a pandemia. Para os estudantes do período noturno e das escolas de perfil socioeconômico mais baixo, a expansão de carga horária presencial é quase inexistente.
O estudo recomenda que as instâncias de controle competentes acompanhem de perto a implementação do Novo Ensino Médio no estado de São Paulo, por conta do elevado risco de violação do direito à educação dos estudantes mais vulneráveis da rede estadual, em especial o atingimento da carga horária de 3 mil horas nos três anos do Ensino Médio.
:: Pesquisador explica por que a reforma do ensino médio é "perversa" ::
Edição: Rodrigo Durão Coelho