As 12 escolas de samba do Rio de Janeiro que integram o grupo especial desfilarão na Marquês de Sapucaí, no centro da capital, nesta sexta-feira (22) e no sábado (23), para alegrar as arquibancadas do sambódromo e os espectadores em casa, além de disputarem o título de melhor carnaval de 2022, depois do adiamento da festa por conta da variante ômicron da covid-19.
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A partir das 22h de sexta, desfilam, nesta ordem, Imperatriz Leopoldinense, Mangueira, Salgueiro, São Clemente, Viradouro e Beija-Flor. Já no sábado, a partir do mesmo horário e indo até de manhã, passam pela Sapucaí as seguintes agremiações: Paraíso do Tuiuti, Portela, Mocidade, Unidos da Tijuca, Grande Rio e Vila Isabel.
O Brasil de Fato preparou um resumo de cada enredo que será levado à Sapucaí nos dois dias de carnaval. A escola vencedora será conhecida na terça-feira (26) e sucederá a niteroiense Unidos do Viradouro, detentora do título do carnaval de 2020, já que em 2021 não houve desfiles do grupo especial em decorrência da pandemia.
Imperatriz Leopoldinense
Carnavalesca: Rosa Magalhães
Fundada em 1959, a Verde, Branco e Ouro de Ramos, na zona norte do Rio, abre a primeira noite do grupo especial com o enredo "Meninos, eu vivi... onde canta o sabiá, onde cantam Dalva e Lamartine", uma homenagem ao carnavalesco Arlindo Rodrigues, que trabalhou com o também carnavalesco Fernando Pamplona no Theatro Municipal.
Arlindo passou pelo Salgueiro, pela Mocidade e, por fim, fez seus desfiles na Imperatriz. Influenciado pelo romantismo nacionalista, levou à Sapucaí temas como o descobrimento do Brasil, a poesia e a música de Gonçalves Dias e Villa-Lobos, a negritude na louvação à Bahia e o carnaval de Lamartine Babo, a quem conheceu pessoalmente.
Mangueira
Carnavalesco: Leandro Vieira
Segunda mais antiga escola em atividade, fundada em 1928, a Verde e Rosa da Mangueira, na zona norte, vem com o enredo "Angenor, José & Laurindo" e homenageia simplesmente um dos inventores de toda a sua poesia e do imaginário popular da escola, o pedreiro batizado de Angenor, mas que entrou para a eternidade com o nome Cartola, o príncipe do princípio.
É a voz de outro preto, diz o enredo, que dá sonoridade à poesia de Cartola. José gritou alto vendendo jornais até se tornar Jamelão, a voz eterna da escola, "voz que guarda o visgo saboroso de um jamelão colhido fresco", diz Leandro Vieira. O terceiro rei da Coroa é Laurindo, conhecido como Delegado, mestre-sala que deu à agremiação décadas de excelência e notas máximas, o mais famoso bailarino da escola e aquele que riscava o chão com o seu samba no pé.
Salgueiro
Carnavalesco: Alex de Souza
Fundada em 1953, a Vermelho e Branca do Andaraí, na zona norte do Rio, faz uma viagem no tempo e nos espaços da cidade que se constituíram como pontos de resistência da cultura negra. A começar pelo próprio Morro do Salgueiro, a escola passeia pela Praça Onze, o berço do samba, e bairros como a Saúde, Gamboa e Santo Cristo, que integraram a chamada Pequena África.
"No Rio batuqueiro / Macumba o ano inteiro / Não nego meu valor, axé / Gingado de malandro / Kizomba e capoeira / Caxambu e jongo, fé na rezadeira / Tempero de Iaiá, não tenho mais, sinhô / E nunca mais, sinhá / Sambo pra resistir / Semba meus ancestrais / Samba pelos carnavais", vai cantar a Acadêmicos do Salgueiro na Avenida.
São Clemente
Carnavalesco: Tiago Martins
A Amarelo e Preta de Botafogo, na zona sul do Rio, foi fundada em 1961 e faz uma homenagem ao humorista Paulo Gustavo, que morreu em maio de 2021, aos 42 anos, por complicações da covid-19. O enredo "Minha vida é uma peça" brinca com o espetáculo "Minha mãe é uma peça", grande sucesso nos palcos de teatros do Brasil e franquia que teve uma das maiores bilheterias do cinema brasileiro, e conta a vida do humorista da infância ao estrelato.
O samba imagina a chegada de Paulo Gustavo ao céu, seu encontro com Dercy Gonçalves e Grande Otelo e fala da "mãe de todo brasileiro": "Dona hermínia mandou avisar que pode / Brincar na Avenida e dizer no pé / Mulher com mulher, tudo bem / Homem com homem, também / O negócio é amar alguém", canta o samba.
Confira o samba da São Clemente
Unidos do Viradouro
Carnavalescos: Marcus Ferreira e Tarcísio Zanon
Atual campeã, a Vermelho e Branco de Niterói, fundada em 1946, vai ousar na Avenida traçando paralelos entre o carnaval de 2022 pós-covid e o de 1919, que ficou conhecido nos livros de História e pela imprensa da época como "o maior carnaval da história", tudo porque veio como a "desforra da peste", em referência à vingança contra a gripe espanhola, maior pandemia do século XX e que assolou o Rio de Janeiro em 1918.
"Não há tristeza que possa suportar tanta alegria", diz o enredo que a Viradouro cantará na Sapucaí a partir de samba no pé, alegria, fantasias e os versos, que são uma carta de amor escrita à folia: "Tirei a máscara no clima envolvente / encostei os lábios suavemente / e te beijei na alegria sem fim / Carnaval, te amo, na vida és tudo pra mim / Assinado: um pierrot apaixonado / que além do infinito o amor se renove / Rio de janeiro, 5 de março de 1919".
Beija-Flor
Carnavalesco: Alexandre Louzada
Os integrantes da Azul e Branco de Nilópolis, fundada em 1948, entram na Sapucaí com o enredo "Empretecer o pensamento é ouvir a voz da Beija-Flor", sobre a contribuição intelectual negra para construção de um Brasil mais africano. "Nossa civilização conhece e respeita os pensamentos esculpidos em mármore greco-romano. Mas por que não talhar os saberes em ébano?", questiona a escola de samba da Baixada.
A Beija-Flor afirma a necessidade de uma "afrosofia" e conta, no enredo, que falamos e escrevemos em bom "pretuguês" para o mundo inteiro ouvir, evoca o Teatro Experimental Negro e todo o pensamento e reflexão que veio de povos africanos para o nosso país: "A nobreza da corte é de Ébano / Tem o mesmo sangue que o seu / Ergue o punho, exige igualdade / Traz de volta o que a história escondeu", canta o samba.
Paraíso do Tuiuti
Carnavalesco: Paulo Barros
A Amarelo ouro e azul pavão de São Cristóvão, bairro da zona norte do Rio, foi fundada em 1952 e abre os desfiles do segundo dia na Marquês de Sapucaí. A escola conseguiu sua melhor classificação no grupo especial em 2018, sendo a vice-campeã, e em 2022 apresenta o enredo "Ka Ríba Tí Ÿe - Que Nossos Caminhos se Abram".
A escola vai celebrar os ensinamentos dos orixás e daqueles que povoaram o mundo, trazendo em suas almas a diáspora africana. A Tuiuti canta o passa para enaltecer o presente da cultura negra. É o que ensina o provérbio iorubá incluído por Paulo Barros no enredo da agremiação: "Somente nos tornamos verdadeiramente quem somos ao lançar nossos olhares sobre os ombros daqueles que chegaram antes de nós. Lembrar daqueles que vieram antes de nós é uma obrigação sagrada".
Confira o samba da Paraíso do Tuiuti
Portela
Carnavalescos: Renato Lage e Márcia Lage
Escola mais antiga do Rio no grupo especial, fundada em 1923, A Azul e Branco conta a história do Baobá, árvore sagrada testemunha do tempo. Com o enredo "Igi Osè Baobá", a agremiação de Madureira lembrará que a árvore de origem africana à sabedoria, resistência e ancestralidade e que ela poderia ser um portal misterioso para o mundo do divino.
A continuidade do baobá, conta a Portela, está hoje nos quilombos, favelas ou periferias, onde os rebentos brotaram como galhos distintos que se estenderam por toda América, expressando a identidade preservada da terra de seus ancestrais, a África. Maracatu, maculelê, tambor de crioula, caxambu, jongo, funk e tantas outras manifestações afro-brasileiras, assim como o Samba são lembrados pela escola.
Mocidade Independente
Carnavalesco: Fábio Ricardo
Fundada em 1955, a Verde e Branco de Padre Miguel, na zona oeste do Rio, rende homenagem a Oxóssi, orixá que tem sob seu domínio o arco e a fecha, com o enredo "Batuque ao Caçador". O refrão canta: "Oxóssi é caçador de uma flecha só / Herdeiro de Iemanjá, irmão de Ogum Aquele que na cobra dá um nó / Aquele apaixonado por Oxum".
Com isso, a Mocidade remete às divindades religiosas, mas lembra também divindades terrenas que construíram a agremiação. Grandes nomes da "Bateria Nota 10", como a escola ficou conhecida, são lembrados: Mestre André, Mestre Coé, Mestre Quirino, Mestre Jorjão e baluartes como o criador do surdo de terceira Tião Miquimba são citados na letra do samba da escola.
Unidos da Tijuca
Carnavalesco: Jack Vasconcelos
A Azul pavão e amarelo ouro, primeira escola de samba da região da Tijuca, fundada em 1931 a partir da união de blocos da área e que completou 90 anos em 2021, leva à Marquês de Sapucaí a lenda do surgimento do guaraná com o enredo "Waranã - A Reexistência Vermelha".
A Unidos da Tijuca toma como base os contos presentes no “Sehaypóri, o livro sagrado do povo Saterê-Mawé”, do escritor da etnia Sateré-Mawé, Yaguarê Yamã, para representar a mitologia da planta, que teria nascido por conta da desobediência de um curumim, além de dar luz a resistência e reexistência de um nossos povos originários, que ainda habitam a região amazônica brasileira.
Confira o samba da Unidos da Tijuca
Acadêmicos do Grande Rio
Carnavalescos: Leonardo Bora e Gabriel Haddad
Mais uma representante da Baixada no grupo especial e relativamente jovem se comparada a outras agremiações, tendo sido fundada em 1988, a Vermelho, Verde e Branco de Duque de Caxias faz seu carnaval com o enredo "Fala, Majeté! As sete chaves de Exu" para desmistificar a imagem ruim de um dos orixás mais importantes das religiões de matrizes africanas e mostrar que ele representa livramento e prosperidade.
"Exu, potência e gingado, ponto riscado na carne, palco das festas da gente. Brinca o Carnaval em transe, desafia, des(con)fia, desconcerta, bate a bola no asfalto, pisa no sapatinho, samba despudorado, dança inflado de vida, palhaço, e trança a crina do cavalo. (...) Exu de tinta e de sangue: é dose, tudo come, tudo sabe, tudo viu. De curto pavio! Lamento de poetinhas – porque tudo é perigoso, divino-maravilhoso", contam os carnavalescos na apresentação do enredo.
Vila Isabel
Carnavalesco: Edson Pereira
E fechando os desfiles de 2022 do grupo especial, a Azul e Branco de Vila Isabel, na zona norte do Rio, fundada em 1946, homenageia uma de suas maiores figuras, o sambista, cantor e escritor Martinho da Vila, no enredo "Canta, canta, minha gente! A Vila é de Martinho". Autor de diversos sambas para a escola, a história de Martinho se confunde com a história da Vila e vem desde a década de 1960.
Na Sapucaí, o samba da Vila Isabel vai pegar carona nos sucessos e no talento de décadas do artista, fazendo alusão e rememorando alguns de seus versos: "Partideiro, partideiro, ó / Nossa Vila Isabel brilha mais do que o sol / Canta, negro rei, deixa a tristeza pra lá / Canta forte, minha Vila, a vida vai melhorar!", diz o samba, que chama o mestre de "senhor da sapiência, escritor da consciência / E a cadência de andar, de viver e sambar".
Confira o samba da Vila Isabel
Fonte: BdF Rio de Janeiro
Edição: Mariana Pitasse