O Exército de Libertação Nacional (ELN) afirma que o áudio divulgado nos últimos dias sobre envio de tropas para o território venezuelano a fim de "velar pela segurança do país" e "combater milicianos das FARC" seria uma montagem. Na mensagem, um suposto dirigente da guerrilha colombiana teria dito que o ELN atua há 37 anos na Venezuela e que essa guerra atual seria contra as FARC, por isso os venezuelanos não deveriam se intrometer.
Em entrevista exclusiva ao Brasil de Fato, o comandante Aureliano Carbonell afirmou que trata-se de uma montagem para "gerar tensões e desestabilizar a região fronteiriça" entre Colômbia e Venezuela, e acusa o Estado colombiano de estar por trás das falsas evidências.
Desde o último domingo (16), tanto o governo colombiano como o venezuelano enviaram militares e armamento de guerra para a fronteira entre o departamento de Arauca (Colômbia) e de Apure (Venezuela).
O presidente Iván Duque anunciou a alocação de mais 700 soldados na região de Arauquita no último domingo para conter o conflito armado que teria provocado o desalojamento de 170 famílias, incluindo ex-combatentes.
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Já do lado venezuelano não foi confirmada a quantidade de efetivos, mas o comando da Força Armadas Nacional Bolivarianas (Fanb) também anunciou reforços com soldados e até aviões de guerra para barrar a presença de cerca de 50 soldados do ELN no município venezuelano de José Antonio Páez, região de Gabarra.
Com assinatura dos Acordos de Paz, em 2016, setores majoritários das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia - Exército do Povo (FARC-EP) concordaram em abandonar as armas e fazer parte do processo de reinserção na sociedade civil.
No entanto, cerca de dez grupos dispersos em distintas regiões do país se negaram a participar do processo e se organizaram em dissidências armadas.
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"Não se trata de um enfrentamento entre o ELN e os setores das FARC que se sentaram para estabelecer o Acordo de Paz. É algo muito pontual com um grupo comandado por Arturo Paz, que também é chamado de Jerônimo, que se declara membro das FARC, mas está trabalhando com o governo colombiano e criando dificuldades na fronteira", afirmou Aureliano Carbonell.
O comandante da guerrilha colombiana afirma que, no último ano, com as dificuldades econômicas geradas pela pandemia e o abandono da implementação dos Acordos de Paz por parte do governo colombiano, houve a retomada de cultivos ilegais no departamento de Arauca, promovido por grupos irregulares. Ainda de acordo com Carbonell, a 10ª Frente comandada por Arturo Paz seria um desses grupos.
"Entre outros problemas está o cultivo de coca. Vemos isso como um retrocesso. É isso que originou todos os problemas em Arauca. Após o processo de substituição de ilícitos, Arauca tornou-se um produtor importante de cacau e banana da terra. Apesar das imensas dificuldades da vida no campo colombiano, foi possível gerar essa dinâmica de produção agrícola e isso é muito positivo", afirma.
O rio Arauca, que se estende por 296 km na fronteira colombo-venezuelana, seria a única barreira natural entre o departamento colombiano do mesmo nome e o estado de Apure, sendo uma região de livre circulação entre as populações dos dois países, apesar da ruptura das relações diplomáticas em 2010.
"Nós pensamos que também há interesses de criar dificuldades para o outro lado da fronteira. É uma zona que não possui grandes plantações de coca, mas se conseguem aumentar a produção ali, usarão isso como elemento para atacar a Venezuela", alerta Carbonell.
A Colômbia é considerada o maior produtor de cocaína do mundo, com cerca de 171 mil hectares cultivados, que abastecem aproximadamente 70% do mercado mundial, de acordo com relatórios das Nações Unidas. Outros estudos independentes apontam que cerca de 2% do PIB colombiano, equivalente a US$ 19 bilhões (aproximadamente R$ 95 bilhões), seriam resultado do tráfico de drogas.
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Uma consequência do narcotráfico é a ampliação da violência. A ONU aponta que 80% das vítimas de homicídios, em 2019, viviam nas zonas produtoras de coca.
Guerra entre guerrilhas?
Meios de comunicação colombianos ainda sugeriram que o ELN também estaria buscando controlar parte do território venezuelano. Isso porque haveria uma disputa com as Forças Patrióticas de Libertação Nacional (FPLN), guerrilha venezuelana vinculada à organização Corrente Revolucionária Bolívar e Zamora (CRBZ), que controla a Cidade Comunal Simón Bolívar, na região de Gabarra.
O ELN nega qualquer hostilidade com organizações políticas venezuelanas e está disposto a "resolver confusões e dialogar com quem corresponde".
"O problema está na Colômbia, mas obviamente também repercute na Venezuela. Nós estamos abertos a esclarecer qualquer situação. Nosso interesse é não gerar qualquer dificuldade do lado venezuelano, nem com a população, nem com as Forças Armadas", afirmou o comandante da guerrilha colombiana.
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No município venezuelano de José Antonio Páez, o prefeito José María Romero, membro da Corrente Revolucionária Bolívar e Zamora e do governante Psuv, voltou a rechaçar o que considera a "exportação do conflito armado colombiano".
"O governo colombiano tenta exportar seu modelo de narcotráfico e guerra. Observamos como personagens do governo visitaram o departamento de Arauca, pelo menos para a mídia falam em envio de militares, mas realmente o que querem é exportar a guerra".
E ainda finalizou assegurando que as organizações políticas que atuam na região estão dispostas a colaborar com as Forças Armadas. "Aqui há um povo organizado e consciente", disse o prefeito Romero.
Violência continuada
Somente nas duas primeiras semanas do ano, a Colômbia já registrou mais de 30 assassinatos na região de Arauca. De acordo com Instituto de Desenvolvimento da Paz (Indepaz), na última segunda-feira (17), o defensor de direitos humanos Miguel Carillo foi assassinado no município colombiano de Arauquita, somando três líderes sociais mortos em 2022 e 1.289 desde a assinatura dos Acordos de Paz de 2016.
👥 Nombre: Miguel Carrillo
— INDEPAZ (@Indepaz) January 17, 2022
📆 Fecha: 17/01/21
📍 Lugar: Arauquita, Arauca
Con Miguel Carrillo serían 03 los líderes y defensores de DDHH asesinados en 2022 y 1289 desde la firma del acuerdo de paz. pic.twitter.com/TpwEnMpO9o
Em 2021, a Colômbia teve a maior taxa de homicídios desde 2014, com um aumento de 8,2%, para um total no período de 13.709 assassinatos, segundo dados oficiais.
Em abril do ano passado já havia acontecido um confronto armado na fronteira entre Arauca e Apure, que durou cerca de 20 dias e terminou com 17 mortos e 3 mil desalojados. O episódio, foi denunciado pelo ELN como uma operação orquestrada pelo exército colombiano com apoio dos EUA.
Edição: Arturo Hartmann