CRIME AMBIENTAL

Força-tarefa determina que Imerys forneça água, abrigo e tratamento médico para moradores no PA

Mineradora cometeu diversos crimes em território paraense. Após explosão, moradores denunciam também vazamento de caulim

Brasil de Fato | Barcarena (PA) |

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Sem um plano emergencial, a articulação da comunidade acontece via WhatsApp em caso de crimes ambientais no município. - Catarina Barbosa/Brasil de Fato

Nesta quarta-feira (8), o Ministério Público Federal (MPF), o Ministério Público do Pará (MPPA) e a Defensoria Pública do Estado (DPE-PA) cobraram da mineradora francesa Imerys Rio Capim Caulim providências urgentes para conter os danos provocados pelo incêndio na noite da última segunda-feira (6) em um dos galpões da planta de beneficiamento da empresa, em Barcarena (PA).

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Em reunião com representantes da mineradora, as instituições exigiram que a empresa forneça água potável, transporte, alojamento e tratamento médico – incluindo medicação – para comunidades do município.

A empresa ficou de dar resposta sobre essas demandas no início da noite desta quarta-feira, quando a reunião com o MPF, MPPA e DPE será retomada.

Explosão seguida de incêndio

Na última segunda-feira (6) uma explosão seguida de incêndio e emissão de fumaça tóxica preocupou moradores da cidade, sobretudo, os que moram a poucos metros da empresa como os que residem no bairro industrial. Os moradores relatam dor de cabeça, enjoo, vômito, desmaio e irritação nos olhos. Eles afirmam que a empresa não prestou nenhuma assistência. 

O Brasil de Fato esteve no local no dia seguinte ao ocorrido e acompanhou a primeira assembleia da comunidade do bairro industrial nesta terça-feira (7), para cobrar medidas da Imerys e das autoridades locais.

Diversas entidades de defesa aos direitos humanos e ao meio ambiente estiveram presentes para cobrar providência, entre elas, o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), a Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (FASE) e o Ministério Público Federal (MPF), além das associações de moradores. 

:: Depósito químico da mineradora Imerys explode e pega fogo em Barcarena no Pará ::

Em nota, a prefeitura de Barcarena confirmou a alta procura nas Unidades Básicas de Saúde "desde a noite da segunda-feira (6) até a manhã desta quarta (8), 71 pessoas procuraram atendimento nas unidades de saúde, com sintomas leves e moderados de desconforto respiratório, em consequência do incêndio ocorrido nas instalações da Imerys", afirma uma nota enviada pela assessoria.

Mobilização da comunidade

Na reunião organizada pelos moradores o clima era de indignação e revolta. A população de Barcarena afirma que as empresas instaladas no município exploram o território, mas ofertam pouco ou nenhuma contrapartida aos moradores. "Não temos saúde ou educação de qualidade, não temos ruas asfaltadas. A Imerys tem um projeto onde ensina artesanato para quem mora aqui. Artesanato. Ou seja, as empresas lucram milhões, bilhões e o que deixam para quem vive e nasceu aqui? Essa cidade parece desenvolvida para você?", questiona uma moradora que preferiu não se identificar. 

A crítica que ela faz é ao projeto Casa Imerys, que realiza projetos e ações sociais nas comunidades vizinhas ao município paraense de Barcarena, por meio da Casa Imerys, e nas minas de extração de caulim, em Ipixuna do Pará.

Apesar do receio de muitos moradores em mostrar o rosto, as comunidades afetadas pela mineração contam com diversas lideranças engajadas em dar visibilidade aos crimes ambientais. Uma delas é Kezia Caetano, liderança da Associação de Desenvolvimento Comunitário e Cultural de Vila do Conde (Adecovac). Ela conta que a Imerys não ofereceu nenhum suporte durante o incêndio. 

"A empresa fechou as portas. Eles não acionaram a comunidade para que pudéssemos nos proteger, não informaram o que estava acontecendo. Isso é uma coisa lamentável para todos nós", diz. 

Segundo Kezia, há anos diversas comunidades de Barcarena lutam para ter um plano emergencial em caso de crimes ambientais de forma que as pessoas possam lutar por suas vidas e de seus familiares.

"A gente não tem uma sirene, a gente não tem um alarme, não tem ninguém para sair avisando, nem ao menos um carro som. Não tem ninguém. Não tem esse plano emergencial. Então a gente tem que se unir na verdade e fazer essa cobrança para que a gente tenha, porque Vila do Conde só tem uma entrada e uma saída. Se acontece alguma coisa pior aqui dentro com outras química que tem lá dentro (da Imerys), a Vila do Conde não estava mais existindo", afirma. 
 

Sem plano emergencial 

Sem um plano emergencial, a articulação da comunidade acontece via WhatsApp em caso de crimes ambientais no município.

Luis Carlos, morador de bairro industrial, em Vila dos Cabanos, conta que a noite do dia 6 de dezembro foi desesperadora e que por sorte tinha internet no celular e conseguiu avisar a família, caso contrário seus dois filhos e a mãe, que estão mal devido a inalação da fumaça, poderiam ter morrido em casa. 

"Foi uma noite difícil. Nós até pensamos em ir ao posto de saúde, mas todo mundo dizia que a situação lá estava complicada. Só não foi pior a situação, porque temos um morador da comunidade que é socorrista e ele ajudou as pessoas. Muita gente tossindo, desmaiando, foi horrível. Eu acho que nós aqui do bairro Industrial temos que cobrar mais dessa empresa Imerys. Não é de hoje que lá vem causando impacto ambiental aqui na comunidade", afirma.

O produto queimado foi o hidrossulfito de sódio, um pó de cor esbranquiçada, com odor de enxofre usado na exploração mineral do caulim. 

Ângela Vieira, moradora da comunidade Vila Nova/Itupanema, estava na Unidade Básica de Saúde (UBS) de Vila do Conde acompanhando um amigo que acabou falecendo por outro motivo e presenciou a chegada de moradores passando mal por conta da fumaça. "Eu não sabia da explosão, porque estou sem internet, mas vi a movimentação. Foi quando descobri que todo mundo estava passando mal por conta da fumaça", conta. 

Ela diz ainda que a situação de risco de Barcarena é constante. "Nós vivemos aqui em um bomba relógio. Entra ano saindo a mesma coisa e ninguém faz nada pela gente. Ninguém faz nada. Nós somos um povo esquecido aqui em Barcarena". 

Para a militante do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Jaqueline Damasceno, a mineração tem gerado inúmeros prejuízos para as populações tradicionais e os crimes seguem impunes.

"Esse é mais um episódio em que essas grandes empresas mineradoras cometem um crime muito grande colocando a vida das famílias e dessas localidades em risco. Em Mariana e em Brumadinho a situação era a mesma. No momento do ocorrido existe uma movimentação para dizer que vai tomar alguma providência, mas acaba que no final a população continua em abandono, continua sofrendo com as consequências da poluição tanto da lama lá, quanto da fumaça aqui"., explica. 

O que diz a Imerys?

Em nota, a empresa afirma que o incêndio foi controlado no mesmo dia da explosão. Leia a nota na íntegra: 

Um dos galpões da planta de beneficiamento da empresa, em Barcarena. A ocorrência foi controlada ainda na mesma noite, sendo a fumaça completamente dissipada em poucas horas. O incêndio ocorreu exclusivamente em uma pequena parcela do produto químico hidrossulfito de sódio. O hidrossulfito de sódio pode provocar irritação temporária do aparelho respiratório, caso seja inalado. As investigações estão em curso com a participação das autoridades locais, sem riscos detectados de novos focos de incêndio. A Imerys está em contato direto com a Prefeitura de Barcarena, auxiliando no que for aplicável e necessário". 

Disse ainda que "o hidrossulfito de sódio pode provocar irritação temporária do aparelho respiratório, mas não respondeu sobre as consequências a longo prazo e nem sobre os questionamentos sobre o plano de evacuação". 

Por fim, a Imerys diz que está colaborando com as autoridades locais e a Prefeitura de Barcarena, auxiliando no que for necessário e nega as denúncias de vazamento de caulim no Igarapé Dendê. "A Imerys confirma que nenhum outro incidente foi registrado além do citado acima ou qualquer outro efeito visual além da fumaça identificada".

Edição: Anelize Moreira