Pelo menos três institutos de pesquisa apresentaram, no último domingo (16), suas projeções para o segundo turno das eleições presidenciais no Peru, que será realizado no próximo dia 6 de junho. Com diferenças, todos falam de um cenário em aberto, no qual o candidato Pedro Castillo, do Partido Peru Livre, segue na liderança, enquanto Keiko Fujimori, candidata da extrema direita (Força Popular), vem encurtando a distância entre os dois a cada semana. Mas a campanha presidencial se encontra em um terreno mais pantanoso do que o das pesquisas: entre as ruas e a imprensa nacional, que parecem estar indo em direções divergentes.
Nas últimas semanas, Pedro Castillo - o candidato de esquerda que ninguém previa que chegaria a esta altura da disputa - suspendeu sua caravana pelo sul do país e chegou a Lima, capital do Peru. A mídia acusa o candidato de ter uma campanha desorientada, mas Castillo permanece fiel a sua estratégia, que inclui comícios abertos e uma proposta voltada para uma nova Convenção Constituinte, a abertura de um Ministério de Ciência e Tecnologia e a luta contra a corrupção.
O desembarque em Lima
A menos de três semanas da votação, a campanha inaugurou um novo capítulo na capital peruana. Na última segunda-feira (17), os dois candidatos assinaram uma Declaração Cidadã em defesa da democracia, da institucionalidade e dos direitos humanos. O ato foi um evento obrigatório que aconteceu sob o olhar atento de um de seus promotores, o Cardeal e Arcebispo de Huancayo, Pedro Barreto, que disse estar preocupado com a polarização no país.
Nesse mesmo dia, Pedro Castillo se reuniu com organizações sociais na Casa dos Trabalhadores da Mineração, onde líderes sindicais, trabalhadores informais, mulheres indígenas, movimentos camponeses e representantes do comércio se reuniram com o candidato. "Você têm que estar na Convenção Constituinte", afirmou Castillo na ocasião. As lideranças peruanas manifestaram seu apoio, mas não antes de sublinhar pelo menos duas condições: que não sejam esquecidas caso ele chegue ao poder, e que mantenha a direita peruana longe de seu gabinete. O descontentamento gerado pelo ex-presidente Ollanta Humala ainda está presente.
A região metropolitana de Lima é o lugar mais difícil para o candidato do Peru Livre. É o que indicam os números, mas também um panorama histórico da sociedade de Lima, que gosta de se vangloriar de seu status cosmopolita e vê com certa desconfiança as profundezas do Peru, hoje encarnado na candidatura de Pedro Castillo. Após sua vitória no primeiro turno, o intelectual Héctor Béjar já estava antecipando uma "feroz campanha" contra o nativo de Cajamarca. "O que está por vir é muito sério no Peru, vai ser um mês de grande tensão".
O departamento de Lima representa um terço do eleitorado peruano, ou seja, 8 milhões dos 24 milhões que irão às urnas em junho. A região metropolitana de Lima é uma vasta área onde uma parte importante da vida comercial e social do país se desenvolve. Mas, como dizem seus próprios habitantes, na verdade existem "muitas Limas", um reflexo da desigualdade estrutural que também pode ser vista em outras metrópoles latino-americanas.
A campanha na mídia
Na imprensa nacional hegemônica, a campanha contra Castillo é bastante evidente, com acusações que são reproduzidas com o mesmo roteiro. Por um lado, há uma tentativa de minar a autoridade do candidato do Peru Livre e de rivalizar com Vladimir Cerrón, governador de Junín, que é chamado de "dono do Peru Livre". Cerrón é apresentado como o homem forte do partido e não há um esforço para explicar este antagonismo com Castillo, tido como certo.
Outra reclamação recorrente é a ausência de um plano governamental - que foi publicado nas redes sociais no domingo - e a suposta improvisação no reta final da campanha. "Nunca vimos um jornalismo tão programático", brinca um apoiador de Castillo. Quão decisiva é a palavra da mídia? Ninguém sabe, considerando que o resultado do primeiro turno das eleições surpreendeu a todos.
Keiko Fujimori, por sua vez, parece concentrada em dialogar com seus apoiadores e consolidar o núcleo Fujimorista com gestos de reconciliação, como o reencontro público com seu irmão, Kenji Fujimori, após um longo distanciamento político e familiar. Os irmãos protagonizaram uma disputa pública em 2018 a respeito do indulto de seu pai, o ditador Alberto Fujimori, e alianças com o então presidente, Pedro Pablo Kuczynski.
A herança fujimorista está presente na sociedade peruana, mas ausente no debate eleitoral. Keiko, de fato, defende, sem grandes reservas, o equilíbrio histórico de seu pai. Na última semana, ela definiu como "planejamento familiar" a esterilização forçada realizada por Alberto Fujimori em quase 300 mil mulheres peruanas, muitas delas camponesas.
O conceito em disputa é o de "mudança", algo que Keiko tentou usar a seu favor falando de "mudança para melhor", ao que seu rival respondeu: "Mudança não é com um K de Keiko, mas com um C de Castillo". No esforço de atacar o candidato Peru Libre, a agenda em debate acaba sendo a dele, algo que estimula seus apoiadores.A militância próxima à Castillo acredita que a descrença no que eles chamam de "imprensa marmelada" é maior do que o poder de influência dos meios de comunicação tradicionais.
Equipes técnicas
Nessa terça-feira (18), foram anunciadas as equipes técnicas de ambos os candidatos, com nomes de destaque em áreas estratégicas e uma prévia das diretrizes nas diferentes áreas de governo. Em um evento em Puente Piedra, na zona norte de Lima, Castillo apresentou o seu diante de uma multidão, embora tenha esclarecido que a equipe apresentada não representa necessariamente um futuro gabinete ministerial.
A equipe expressa a diversidade regional na qual o Peru Libre tanto insiste, ou seja, não reúne apenas personalidades de Lima. Entre seus membros estão a candidata à vice-presidência, Dina Boluarte; Juan Pari e Hernando Cevallos, ambos ex-congressistas; os economistas Celeste Rosas, Andrés Alencastre e Roberto Vela Pinedo; Anahí Durandt, que foi chefe do plano de governo do Juntos pelo Peru; o ex-procurador Avelino Guillén; e o físico Modesto Montoya, que parece ser um nome confirmado para chefiar o Ministério da Ciência e Tecnologia, caso Castillo vença.
Outro nome reconhecido é Juan Cadillo, professor e engenheiro que ganhou o Prêmio Ministerial Palmas e foi classificado entre os 50 melhores professores no Global Teacher Prize 2017. A lista é completada por Julián Palacín, Rolando Paucar e Ricardo López Risso.
A apresentação desta equipe de especialistas foi um pretexto para realizar um comício de campanha na periferia de Lima, que estava lotado e colorido, em contraste com o anúncio de portas fechadas de Keiko Fujimori. "Não vamos cair em provocações", advertiu Castillo, tendo em vista a longa campanha pela frente, que pode ser decisiva para os peruanos e até mesmo para a reconfiguração da região.
Edição: ARGMedios