WASHINGTON

Ação no Capitólio revela "conluio" entre invasores, polícia e secretário de Defesa

A análise é do Partido Socialismo e Libertação dos EUA, que critica também declaração esvaziada do presidente eleito

Tradução: Roxana Baspineiro

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Simpatizantes de Donald Trump invadem violentamente o prédio do Capitólio dos EUA após a manifestação "Stop the Steal" em 06 de janeiro de 2021 em Washington DC - SPENCER PLATT / GETTY IMAGES NORTH AMERICA / Getty Images via AFP

O Partido Socialismo e Libertação dos Estados Unidos divulgou uma declaração oficial na última quarta-feira (6), à luz dos eventos que ocorreram no país quando o Congresso do país norte-americano realizava a cerimônia de certificação da vitória eleitoral de Joe Biden e foi interrompida violentamente por simpatizantes do presidente ultradireitista Donald Trump. 

Na nota, os socialistas afirmam que os invasores do Congresso agiram em um “conluio óbvio” com a polícia do Capitólio, onde o ataque foi realizado, e com o Departamento de Defesa e Forças Armadas dos EUA.

Os integrantes do partido questionam a atuação das forças policiais presentes, em uma evidente assimetria em relação ao uso da força policial empregada em protestos antirracistas no país.

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Para eles, a interrupção da sessão de certificação da vitória de Joe Biden revela “são uma grande vergonha para a classe dominante norte-americana no cenário mundial e enfraquecem a posição global do Imperialismo estadunidense”.

A declaração do Partido Socialista desfere ainda uma crítica às declarações do presidente recém-eleito, descrita pela organização como “banais e vazias”.

“O que realmente deveria acontecer é que todos os responsáveis pelo ato histórico de agressão fascista de hoje fossem levados à justiça. Isto inclui especialmente Donald Trump e aqueles da hierarquia militar e policial que usaram suas posições para facilitar os eventos de hoje”, defende o partido.

Nem Biden nem Trump: o que pensa o Partido Socialismo e Libertação dos EUA

Leia a declaração na íntegra:

Hoje [quarta-feira], uma turba fascista – chamada à ação por Donald Trump e agindo em conluio óbvio com integrantes da Polícia do Capitólio, do Departamento de Defesa e possivelmente de outras Forças Armadas – invadiu o prédio do Capitólio dos Estados Unidos e dispersou a sessão do Congresso. O próprio Trump discursou na principal manifestação de protesto em frente à Casa Branca como parte de sua campanha para se agarrar desesperadamente ao poder. A ala de extrema direita que atacou o Capitólio hoje está unida, acima de tudo, pela figura de Trump. Pouco antes da turba marchar em direção ao Capitólio, ele declarou: "O país nunca será recuperado com fraqueza. É preciso demonstrar força". Trump, mais do que qualquer outra coisa, quer evitar um processo legal uma vez fora do cargo, além de manter seu controle político do Partido Republicano.

A Polícia do Capitólio, fortemente armada, quase não resistiu enquanto os fascistas empurravam barreiras, destruíam janelas e invadiam a Câmara do Senado. Uma mulher foi baleada e morta dentro do prédio do Capitólio. Mas no final do caos, após terem atingido seu objetivo, a multidão foi calmamente escoltada para fora do prédio ao invés de ser presa. Se uma ação semelhante à invasão do Congresso pela turba pró-Trump tivesse sido realizada por manifestantes antirracistas durante os protestos que aconteceram em meados de 2020, por exemplo, eles teriam sido recebidos com força letal e esmagadora, sem dúvida.

Os eventos de hoje não poderiam ter acontecido sem algum nível de cooperação entre os fascistas e a polícia. É inconcebível que a polícia não estivesse monitorando as comunicações dos manifestantes pró-Trump que viajaram para Washington e que eles simplesmente desconhessem que havia pelo menos alguma possibilidade de um ataque ao prédio do Capitólio.

O papel do Pentágono nesta crise é outra questão central. A Guarda Nacional em Washington está sob o controle do Secretário da Defesa e do Secretário do Exército, não da prefeita da capital. Ontem, a prefeita Muriel Bowser (Partido Democrata) pediu que o Departamento de Defesa enviasse a Guarda Nacional à cidade, mas seu pedido foi ignorado. Agora, a Guarda está sendo enviada para as ruas, mas somente depois que os fascistas conseguiram invadir o Capitólio.

O conflito dentro da classe dominante

O Secretário de Defesa dos EUA, Christopher C. Miller, não é uma figura independente. Ele foi um oficial das Forças Especiais relativamente de baixa patente antes de ser promovido a uma posição central por Donald Trump, a quem ele deve completamente sua atual posição de autoridade. No domingo passado, 10 ex-Secretários de Defesa do país divulgaram um artigo de opinião conjunto no Washington Post exigindo que os militares não interviessem na transição do poder para Joe Biden. Eles escreveram que "o Secretário de Defesa interino, Christopher C. Miller, e seus subordinados" deveriam "abster-se de qualquer ação política que prejudique os resultados da eleição ou prejudique o sucesso da nova equipe". O grupo de coautores inclui figuras como Dick Cheney, Donald Rumsfeld e Mark Esper. Este último atuou como Secretário de Defesa há menos de dois meses atrás. Deve haver um motivo profundo para que figuras altamente influentes de diferentes grupos da classe dominante se unissem para fazer esta notável declaração. Isto sugere que eles já estavam informados das discussões no interior do Estado especificamente sobre este tipo de trama ou ação.

Os eventos que ocorreram hoje são uma grande vergonha para a classe dominante norte-americana no cenário mundial e enfraquecem a posição global do imperialismo estadunidense. Governos que tradicionalmente têm desempenhado o papel de principais aliados dos Estados Unidos, incluindo Alemanha, Reino Unido e Canadá, têm divulgado declarações condenando a turba que invadiu o prédio do Capitólio. Jen Stoltenberg, o chefe da OTAN, declarou: "Cenas chocantes em Washington D.C. O resultado desta eleição democrática deve ser respeitado".

Uma ampla coalizão de classe dominante poderia se unir para derrubar Trump, que pisou em um pilar fundamental da estabilidade do governo capitalista nos Estados Unidos: a "transferência pacífica do poder". Os principais CEOs, a Associação Nacional de Fabricantes, a Business Round Table (Mesa Redonda de Negócios) e outros pilares da empreitada estadunidense têm se pronunciado condenando Trump. O Congresso se reuniu novamente várias horas após a sessão ter sido dispersada pelos fascistas, e a turba pró-Trump foi condenada pelo vice-presidente Mike Pence e pelo senador republicano Mitch McConnell na reabertura da sessão.

Em uma breve e fraca declaração, Joe Biden fez um apelo à máfia fascista para que se retirasse e afirmações banais e vazias sobre o patriotismo. O que realmente deveria acontecer é que todos os responsáveis pelo ato histórico de agressão fascista de hoje fossem levados à justiça. Isto inclui especialmente Donald Trump e aqueles da hierarquia militar e policial que usaram suas posições para facilitar os eventos de hoje.

Uma coalizão construída conjuntamente pela polícia, integrantes do Departamento de Defesa e uma turba fascista lançou um ataque sem precedentes ao país. A ameaça da extrema direita só pode ser decisivamente derrotada por uma frente militante e unida da classe trabalhadora internacionalmente.

Edição: Luiza Mançano