GOLPE

Houve fraude nas últimas eleições da Bolívia? Estudos dizem que não

Quase um ano depois, OEA não responde analistas que apontam que resultado não foi manipulado

Brasil de Fato | Caracas (Venezuela) |
Missão de Observação da OEA deu suas primeiras declarações sugerindo fraude apenas um dia depois das eleições, 21 de outubro de 2019 - Reprodução

Faltam duas semanas para as eleições presidenciais na Bolívia, um processo convocado depois que a Organização dos Estados Americanos (OEA) declarou que houve fraude no pleito anterior. O relatório preliminar da OEA foi o estopim para os atos violentos da extrema-direita e o pedido de renúncia, forçado pelo Exército, de Evo Morales e Álvaro García Lineras. 

Agora, o secretário geral da OEA, Luis Almagro, antes mesmos das novas eleições, voltou a declarar "medo de uma possível fraude" em reunião com o ministro de Governo boliviano Arturo Murillo. No entanto, todo o poder eleitoral, que decide o processo, foi reformado depois do golpe de Estado, de acordo com indicações de Jeanine Áñez e de outros setores conservadores, como o candidato pelo partido Comunidad Ciudadana, o ex-presidente Carlos Mesa. 

As declarações de Almagro se dão justamente no momento em que todas as pesquisas de opinião mantêm o favoritismo do Movimento Ao Socialismo (MAS), com cerca de 26% das intenções de voto. Especialistas apontam que a vantagem de Luis Arce em relação à Mesa poderia ser ainda maior, já que as pesquisas não são realizadas nas zonas rurais do país, onde o partido de Morales tem amplo apoio. 

Para analistas, as eleições na Bolívia foram um exemplo do posicionamento político da OEA. Passado quase um ano, diversos estudos científicos apontam que não houve manipulação dos resultados. Nenhum deles obteve resposta das autoridades do órgão ou da missão de observação eleitoral enviada à La Paz em outubro de 2019. Relembre alguns deles.

 

Novembro de 2019 

O primeiro foi publicado em novembro de 2019, apenas um mês depois das eleições, pelo Centro de Pesquisa Econômica e Política (CEPR), com sede nos Estados Unidos. De acordo com o estudo, o relatório da OEA não oferecia provas de que houve fraude e a missão dava declarações inconsistentes em termos técnicos, trabalhadas com o objetivo de induzir a população boliviana e a comunidade internacional à crença de que o pleito que reelegeu Evo Morales foi manipulado. 

O sistema eleitoral boliviano havia sido reformado para o processo de 2019 por sugestão da própria OEA e consiste em duas etapas. Primeiro a Transmissão de Resultado Eleitoral Preliminar (TREP), que é o primeiro resultado enviado pelos estados através de um sistema online. Depois os números passam por uma nova revisão manual até ser emitido o resultado oficial.

Todo o processo foi acompanhado por seis jurados eleitorais em cada urna, totalizando cerca de 200 mil pessoas. Além de mais de 200 observadores internacionais. Só a missão eleitoral de observação da OEA era formada por 92 delegados.

:: Leia também: "Vamos dar golpe em quem quisermos", diz Elon Musk, dono da Tesla, sobre a Bolívia ::

A comissão da OEA começou a declarar fraude quando haviam sido apurados pouco mais de 80% dos resultados preliminares, que como o nome já diz, dão um panorama prévio, não oficial ao resultado. 

Para atender as críticas da missão, o Tribunal Superior Eleitoral da Bolívia, na época chefiado por Maria Eugenia Choque, retomou do zero a contagem preliminar antes de avançar para a segunda etapa. O TSE então revelou que a chapa do Movimento Ao Socialismo se reelegeria no primeiro turno, já que a legislação determina que quem obtenha mais de 40% da votação com dez pontos de diferença do segundo colocado está eleito. 

Nesse momento a OEA emitiu uma primeira nota afirmando sua "preocupação pela mudança drástica na tendência de resultados".

No entanto, o Centro de Pesquisa Econômica e Política comparou os dois resultados duas vezes, em novembro de 2019 e em março de 2020, e confirmou que a tendência já apontava para uma vitória de Morales com uma margem superior a dez pontos percentuais. 


México concedeu asilo a Evo Morales depois do golpe de Estado de outubro de 2019. / Divulgação/Presidência da Bolívia

Fevereiro de 2020

No começo desse ano, outra instituição estadunidense se debruçou sobre o resultado eleitoral boliviano e concluiu que não houve manipulação. Cientistas do Instituto de Tecnologia de Massachusets (MIT - pelas siglas em inglês) realizaram mil simulações diferentes de acordo com os resultados prévios, aqueles que são coletados pelo Trep e em todas Morales e Garcia Linera ganharam com mais de 10% do segundo colocado, Carlos Mesa.

Jack Williams e John Curiel, coordenadores da pesquisa do laboratório de Ciência e Dados Eleitorais do MIT, afirmaram que foram hostilizados por autoridades do governo golpista depois que refutaram a análise da OEA. 

:: Disputa pelo lítio se acirra e escancara diferença entre candidatos na Bolívia ::

Junho 2020

Já em junho deste ano, um novo estudo foi publicado no jornal The New York Times, realizado por pesquisadores da Universidade Tulane e da Universidade da Pensilvânia, também nos Estados Unidos. Novamente apontaram que os dados comprovam que o processo foi lícito.

Edição: Marina Duarte de Souza