Um estudante de 14 anos foi morto durante uma operação da Polícia Federal (PF) e da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core) no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, na região metropolitana do Rio de Janeiro, na tarde da última segunda-feira (18). João Pedro Mattos Pinto foi atingido na barriga enquanto brincava no quintal de casa. O adolescente foi levado em um helicóptero da Polícia Civil após ser baleado. Até a manhã desta terça-feira (19), a família estava sem informações sobre o jovem.
Segundo o Corpo de Bombeiros, o corpo da vítima foi deixado na segunda-feira (18), às 15h, no Grupamento de Operações Aéreas (GOA), na zona sul do Rio. Na manhã desta terça-feira (19), familiares do adolescente estiveram no Instituto Médico Legal (IML) de São Gonçalo e reconheceram seu corpo. João Pedro foi descrito por amigos e familiares como um menino calmo e que frequentava a igreja.
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Para a gestora de dados da plataforma Fogo Cruzado, Maria Isabel Couto, nem mesmo os dois meses de pandemia da covid-19 e a quarentena decretada pelo governo estadual, que fazem com que menos pessoas estejam nas ruas, foram suficientes para amenizar as estatísticas sobre violência em ações policiais envolvendo crianças e jovens - quando se compara com o mesmo período de 2019.
“Em 2019, 38 adolescentes foram baleados no estado do Rio contra 24 neste ano. Em tese, seria algo positivo, mas já estamos há dois meses em quarentena e nesse período houve grande redução de pessoas nas ruas. Se formos além, veremos que a violência não diminuiu. Em 50% dos casos de adolescentes baleados neste ano havia ações policiais. No ano passado, foram 53% baleados na presença de policiais”, explica Maria Isabel ao Brasil de Fato.
Segundo a pesquisadora, os dados são claros em mostrar a falta de engajamento das polícias na proteção da vida das pessoas e atuação errada de agentes de segurança pública. Maria Isabel Couto chama a atenção ainda para o fato de que o Complexo do Salgueiro foi cenário recente de uma chacina em que a Core também estava presente.
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“Há um ano e meio, outra operação ainda mal investigada e sem respostas resultou em uma chacina. Agora, novamente, um caso envolvendo a Core termina de forma trágica. O caso do João Pedro é um caso absurdo de um adolescente baleado e morto dentro de casa, levado pelo socorro, que morre e a família não é notificada disso. É um descaso muito grande com os familiares dessa vítima, é preciso alertar para isso”, avalia a gestora do laboratório de dados.
#procurasejoaopedro
No Twitter, um dos trend topics que despontou nesta terça-feira (19), pela manhã, foi a hastag #procurasejoaopedro. Diversas figuras públicas e lideranças comunitárias compartilharam a hashtag pedindo respostas sobre o menino desaparecido após ser baleado.
Em sua conta, Guilherme Boulos, liderança do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), questionou o episódio. “No meio da pandemia, o Rio de Janeiro tem mais um menino negro desaparecido, depois de ter sido baleado pela polícia em São Gonçalo. Onde está João Pedro?”.
Pouco tempo depois, quando soube que o corpo do menino havia sido identificado no Instituto Médico Legal (IML), de São Gonçalo, Boulos novamente se manifestou na rede social, responsabilizando o governador do estado, Wilson Witzel (PSC), que chefia a Core: “O corpo do garoto João Pedro foi localizado agora no IML após ser morto pela PM do Rio. Mais uma vítima da política de segurança genocida contra pobres e negros. Witzel posa de ‘defensor da vida’ na pandemia, mas é agente da morte nas favelas cariocas”, disse.
A deputada federal Talíria Petrone (PSol) também se manifestou na rede social. “Depois de horas sem saber do filho, a família de João Pedro, jovem de 14 anos baleado dentro de casa, descobre que ele está no IML. Triste. Avassalador. Até quando o Estado vai enxugar sangue de jovens, pretos e favelados?”.
A hashtag que questiona o desaparecimento de João Pedro foi iniciada pelo seu primo, Daniel Blaz, na noite da última segunda-feira (18). O compartilhamento e a mobilização na rede social foi atingindo diversas contas além dos conhecidos da família, até chegar a figuras públicas. Por meio do Twitter, Daniel também compartilhou as atualizações sobre o caso. Em sua última postagem ele confirmou que a família identificou o corpo do primo no IML e se despediu. “Que Jesus te receba de braços abertos, meu campeão”.
Fonte: BdF Rio de Janeiro
Edição: Mariana Pitasse e Vivian Fernandes