Isolamento

Com 60 mil casos a menos que o Brasil, Índia estende quarentena por mais duas semanas

Novas regras de isolamento são condicionadas ao número de casos de coronavírus em cada distrito do país

Brasil de Fato | Nova Delhi (Índia) |

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Cidadãos mantêm distância em fila para entrar em loja em Calcutá, leste da Índia - Dibyangshu SARKAR / AFP

A quarentena na Índia, prevista para terminar nesta segunda-feira (4) foi prolongada por mais duas semanas, até o dia 17. O país identificou 46.437 casos do novo coronavírus, quase 60 mil a menos que o Brasil, e contabiliza 1.566 mortes por covid-19 até o momento. As medidas de isolamento social são consideradas as mais rígidas entre todos os países afetados pela pandemia.

Para viabilizar uma retomada gradual das atividades econômicas, o governo indiano dividiu os 733 distritos do país em zonas verdes, laranjas e vermelhas, com regras de circulação condicionadas ao número de infectados.

A maioria dos cidadãos vive em áreas vermelhas, consideradas as de maior risco. É o caso da capital Nova Delhi, de Mumbai, na costa oeste, e de Agra, no estado de Uttar Pradesh, onde está o Taj Mahal, ponto turístico mais visitado do país.

A classificação dos distritos será revisada semanalmente para eventuais redefinições das normas de isolamento. Em todo o país, seguem bloqueados os voos, viagens interestaduais de trem, carro e ônibus. Também não há previsão de reabertura de escolas, universidades, hotéis, shopping centers, cinemas, academias, bares, restaurantes e templos.

Nas zonas vermelhas, passa a ser permitido o comércio virtual de itens essenciais. Escritórios também podem ser reabertos com um terço da capacidade e com as devidas medidas de distanciamento físico. Nas zonas laranjas, passam a circular táxis com até dois passageiros. Lojas de bebidas podem ser reabertas. Ônibus estão permitidos somente nas zonas verdes, com 50% da capacidade.

A Índia é o segundo país mais populoso do mundo, com 1,3 milhão de habitantes – seis vezes mais que a população brasileira. 

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Para o médico Yogesh Jain, que atende comunidades vulneráveis no estado de Chhattísgarh, oeste do país, a retomada das atividades econômicas é urgente, especialmente em áreas com baixa incidência da covid-19. O profissional analisa que o período de isolamento rígido produziu resultados significativos, mas começa a causar dificuldades – inclusive, no acesso ao sistema de saúde.

“Nós precisamos proteger as pessoas de outras doenças, para além da covid-19. Temos pacientes que estão interrompendo tratamento de tuberculose ou câncer. Precisamos ter transporte público novamente, para que as pessoas possam acessar o sistema de saúde”, afirma, em entrevista ao portal Newsclick. “Exceto para as grandes aglomerações, é hora de retomarmos as atividades em locais onde as pessoas conseguem manter distanciamento social e garantir sua higiene”.

A tuberculose é o principal problema de saúde pública na Índia e mata, em média, 1,2 mil pessoas por dia – cem vezes mais do que no Brasil. 

Jain integra a organização Jan Swasthya Sahyog (JSS), que presta serviços gratuitamente em uma área com 2 milhões de pessoas em situação de vulnerabilidade. Ele reconhece que as mortes por covid-19 devem aumentar, com a flexibilização das regras, o que não significa que o país deva retroceder nas medidas.

“Não podemos dar às pessoas a opção de morrer de covid-19 ou de outra causa. O governo central deve trabalhar para garantir o acesso ao sistema de saúde e reduzir o número de mortes, qualquer que seja a causa”, completa. Na interpretação do médico, o próximo desafio da Índia será aprimorar o sistema de testagem para facilitar o controle e a prevenção do vírus.

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Polícia bloqueia ruas da região sul da capital Nova Delhi para diminuir fluxo de veículos durante a pandemia / Praveen S. / Brasil de Fato

Críticas

O Dia do Trabalhador, comemorado na última sexta-feira (1º), foi marcado por questionamentos ao primeiro-ministro Narendra Modi. Representantes de organizações sindicais afirmam que o governo central negligenciou a situação dos trabalhadores migrantes, que poderiam ter sido avisados com antecedência sobre os bloqueios. Milhares deles foram surpreendidos com as medidas de isolamento e tentam até hoje retornar a pé para suas casas, sem poder acessar os benefícios concedidos pelo Estado.

Outro questionamento é em relação à incapacidade do Estado de pagar em dia o benefício de R$ 500 prometido às famílias vulneráveis. O investimento total, durante o período de paralisações, será de mais de R$ 330 bilhões.

Segundo A. R. Sindhu, secretária nacional da Central Indiana de Sindicatos (CITU), a situação é mais grave para os que tiveram jornada e salários reduzidos em abril e aguardam compensações por parte do governo central.

“Não há nenhuma previsão estatutária para o pagamento de salários integrais. O governo central não faz nenhum movimento nesse sentido e pede que o trabalhador tente obter essa compensação junto aos governos locais”, relata. “Grandes indústrias, companhias elétricas e de fornecimento de água não pararam de trabalhar, e o governo central não pode empurrar esse problema para os estados. Ele precisa repassar dinheiro aos estados, que estão arrecadando menos impostos sobre bens e serviços”.

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Mais de 40 milhões de pessoas foram demitidas desde o início da pandemia. Sindhu afirma que as dez maiores centrais sindicais do país têm reportado ao governo central as violações de direitos trabalhistas ocorridas no último mês. Porém, o primeiro-ministro e sua equipe têm adotado medidas econômicas e estratégias para o fim da quarentena sem ouvir o que os trabalhadores têm a dizer.

“As políticas não são debatidas e as opiniões dos sindicatos não são ouvidas. Nós fazemos parte de organizações tripartite, mas esses mecanismos foram negados pelo governo Modi”, lamenta. “Nenhuma das opiniões dos sindicatos foi considerada. Estamos chegando ao 40º dia de lockdown e só anteontem recebemos um convite para uma reunião de três minutos com o ministro do Trabalho”, desabafa a sindicalista.

A Índia é o 15º país em número de casos de covid-19, seis posições atrás do Brasil.

Edição: Rodrigo Chagas