Anunciada anteriormente para esta terça-feira (7), a votação da Medida Provisória 905, conhecida como “MP do Contrato Verde e Amarelo”, pelo plenário da Câmara dos Deputados foi adiada para quarta (8). Cercada de protestos, a pauta acentua a reforma trabalhista e por isso conta com dura rejeição dos partidos do campo da oposição — PT, PDT, PSB, PSol, PCdoB e Rede — e também de entidades da sociedade civil organizada.
Além de condenarem o conteúdo da MP, eles criticam a pressa do governo em votar o texto em meio à pandemia do coronavírus. Atualmente, o Congresso Nacional faz votações de forma remota, pela internet, por conta da política de isolamento social que vem sendo adotada no país. Nesse novo esquema de trabalho, apenas algumas lideranças partidárias participam presencialmente das sessões de votação, enquanto os demais parlamentares votam de casa. Interlocutores da sociedade civil não acompanham de perto as discussões, como ocorria anteriormente, porque o Legislativo restringiu a circulação de grupos de pessoas nos prédios.
Para o secretário de Assuntos Jurídicos da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Valeir Ertle, o momento é inoportuno para a votação de uma medida como a MP 905, que conta com objeções de diferentes lados. Em uma enquete virtual realizada pela página da Câmara, por exemplo, 85% dos internautas se disseram contrários à proposta, que também recebeu quase 2 mil emendas de deputados e senadores com pedidos de alteração no texto. No parlamento, o número de emendas serve de termômetro para medir o grau de insatisfação diante de uma pauta.
Por conta das controvérsias, as centrais sindicais defendem o adiamento da votação para um maior aprofundamento do debate sobre a proposta. Valeir Ertle acrescenta que a MP vem na contramão do que a sociedade civil demanda neste momento para enfrentar a piora econômica do país.
“Tem é que manter os empregos, os salários e pressionar pra que não se vote essa MP, que é um absurdo. A CUT está pressionando, trabalhando junto a todos os deputados, articulando todo o movimento sindical pra que não seja votada, pra que saia da pauta de amanhã e caduque essa medida provisória”, disse Ertle ao Brasil de Fato.
Do ponto de vista do conteúdo, a MP reduz encargos e direitos trabalhistas na contratação de jovens com idade entre 18 e 29 anos e pessoas com mais de 55 anos que estejam há um ano sem emprego. O texto prevê o chamado “contrato verde e amarelo”, com previsão de duração para dois anos e salário máximo de R$ 1.567,50. Dentro dessa nova modalidade, a alíquota de contribuição para o FGTS cai de 8% para 2%, a multa do FGTS em caso de demissão é reduzida de 40% para 20% e o empregador também fica isento do pagamento de contribuição previdenciária, salário-educação, entre outras coisas.
Aliados do Planalto argumentam que, ao reduzir os custos dos patrões, a medida iria ajudar na geração de empregos. Já os opositores protestam afirmando que a proposta cria empregos dentro de uma lógica de precarização e nivela por baixo os direitos trabalhistas.
Caso não seja votada até o dia 20 deste mês, a MP perde a validade e os efeitos. Depois de passar pela Câmara, o texto ainda será votado no plenário do Senado. Por conta disso, os aliados do governo correm contra o tempo para tentar agilizar a tramitação da matéria.
“Isso é uma inversão de prioridades, uma insensatez. Primeiro, temos que cuidar da saúde do povo, dessa pandemia que está aí, e não criar um outro problema pro Brasil. Aprovar isso é gerar mais incerteza e uma insegurança maior também pra população”, critica Carlos Rogério Nunes, da direção nacional da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB). Para o dirigente, “a pauta trabalhista do Congresso deveria ser positiva, e não negativa”.
Transparência
Também sob protestos, o relatório da MP 905 foi aprovado no ultimo dia 17 pela comissão mista que avaliou a pauta no Congresso Nacional. A votação se deu com a presença dos deputados e senadores do colegiado, mas sem a vigilância da imprensa e de entidades da sociedade civil organizada, que não puderam acompanhar de perto o processo por determinação do presidente da comissão, o senador Sérgio Petecão (PSD-AC). Ele vetou o acesso de jornalistas e do público externo alegando que seria um protocolo contra a multiplicação da covid-19.
Apesar da transmissão das sessões pela internet, a nova dinâmica criou dificuldades adicionais no que se refere à transparência e ao acesso a informações de interesse público. Tais fatores, somados à pressa na tramitação da matéria, dificultaram também o trabalho da imprensa no acompanhamento da MP. Nos bastidores da cobertura, alguns repórteres passaram a ter mais dificuldade com as apurações sobre as articulações políticas que circundam a MP, já que agora os atores envolvidos no jogo não estão todos concentrados no mesmo local por conta da pandemia.
Juliana Nunes, da coordenação-geral do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal (SJPDF), observa esse cenário com preocupação. “É difícil dar conta de cobrir e de colocar pra sociedade o que está posto ali a ponto de ela também conseguir construir uma reflexão sobre a pauta, por isso nós consideramos extremamente açodado o Congresso votar essa MP neste momento, sem que haja um debate público mais amplo e diante desse prejuízo pra própria cobertura jornalística”, afirma.
Edição: Vivian Fernandes