Segurança Pública

Rebeliões atingem 4 presídios em SP; presos estão expostos a contágio por coronavírus

Após suspensão da saída temporária mais de 1.300 presos figuram de penitenciárias paulistas

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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“Os presídios são incubadoras de doenças", afirma Ariel de Castro - Agência Brasil

Até às 10h da manhã desta terça-feira (17), 573 dos 1.356 presos que fugiram de penitenciárias paulistas na tarde desta segunda-feira (16) foram capturados pela Polícia Militar (PM) do Estado de São Paulo.

O número de fugitivos foi confirmado pela PM, mas a Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) afirmou que ainda realiza a contagem para saber o número exato. 

Segundo a SAP, a situação foi controlada nos Centros de Progressão Penitenciária (CPD) de Mongaguá, Tremembé e Porto Feliz, e na ala de semiaberto da Penitenciária II de Mirandópolis, cidades nas quais houve rebelião de encarcerados seguida por fugas, afirma a secretaria. 

Suspensão da saída temporária

Ainda de acordo com a secretaria, as “insubordinações” ocorreram depois que a Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo suspendeu a saída temporária de uma semana de presos do regime semiaberto.

O desembargador Ricardo Anafe afirmou, no despacho, que a decisão foi tomada em cima de um pedido da própria SAP para suspensão da saída em decorrência da potencial transmissão do coronavírus no ambiente penitenciário. 

"Cabe ressaltar que a presente medida não configura supressão ao direito de saída temporária, legalmente previsto na Lei de Execução Penal (artigo 122 da Lei nº 7.210/84), mas tão somente visa resguardar a saúde coletiva da população carcerária neste momento crítico, com garantia de gozo oportuno, em perfeita harmonia entre o interesse individual e a supremacia do interesse público", escreveu na decisão.

A SAP afirma que a “medida foi necessária, pois o benefício contemplaria mais de 34 mil sentenciados do regime semiaberto que, retornando ao cárcere, teriam elevado potencial para instalar e propagar o coronavírus em uma população vulnerável, gerando riscos à saúde de servidores e de custodiados”.

Superlotação

Todas as prisões rebeladas estão em condição de superlotação, segundo informações da SAP. O CPD de Mongaguá abriga 2.796 detentos, mas a sua capacidade máxima é de 1.640 presos.

A unidade de Mirandópolis também abriga quase o dobro do limite. Em Porto Feliz, são 700 encarcerados a mais. Em Tremembé, que tem capacidade para 2.672 infratores, tem 3.006.

No Irã, que soma 988 mortes causadas pelo Covid-19, até a manhã desta terça-feira (17), cerca de 120 mil detentos com penas menores do que cinco anos foram liberados para prisão domiciliar. 

Combate ao coronavírus nas prisões brasileiras

Em uma carta aberta à população brasileira, a Pastoral Carcerária manifestou preocupação diante da possibilidade da propagação do novo coronavírus nas penitenciárias brasileiras.

“Se o vírus se espalhar pelas prisões brasileiras, as consequências serão desastrosas. 80% dos casos de coronavírus têm sintomas leves, como uma gripe; no entanto, os presos e presas possuem imunidade muito baixa por conta das condições degradantes existentes no cárcere”, diz a nota. 

A organização afirma, por exemplo, que a incidência de tuberculose nos presídios é 30 vezes maior do que fora desses estabelecimentos. De acordo com o Ministério da Justiça, cerca de 62% das mortes de encarcerados são decorrentes de doenças como AIDS, sífilis e tuberculose.

“Sem o coronavírus, a situação de doenças se alastrando, como sarna, tuberculose, hepatites, HIV, já é muito grave, imagina agora com esse coronavírus que é mais agressivo do que as outros doenças transmissíveis que já acontecem no cárcere”, afirmou Petra Silvia, coordenadora nacional da Pastoral Carcerária, que lamenta a posição da Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo de suspender a saída temporária. 

“Na contramão, acontece que outros tribunais de outros estados, como por exemplo Rio Janeiro, Goiás, Bahia, Mato Grosso, Minas Gerais, já deram orientações para os juízes da execução penal para liberar as pessoas mais vulneráveis do semiaberto para a prisão domiciliar”, afirma. 

Ariel de Castro, advogado e ex-conselheiro de política penitenciária de São Paulo, afirmou que “os presídios são incubadoras de doenças".

"Muitos presos possuem doenças respiratórias. A tuberculose, por exemplo, é uma doença que há muitos anos tem se alastrado no sistema prisional exatamente pela falta de higiene, pela falta de cuidados médicos, pela falta de atendimento de saúde [no sistema penitenciário]”, aponta.

Diante desse cenário, a preocupação aumenta quando o assunto é coronavírus nas prisões. "Gera riscos tanto para os presos que lá estão levando em conta que não possuem atendimento médico adequado e muitos poderão acabar morrendo. E gera risco para os visitantes, familiares dos presos, funcionários do próprio sistema penitenciário e para os familiares desses funcionários", ressalta Castro.

Prisão domiciliar para presos de regime aberto e semiaberto

Em Minas Gerais, o presidente do Tribunal de Justiça do Estado, Nelson Messias de Morais, também decidiu tomar providências em decorrência da pandemia causada pelo Covid-19.

O desembargador determinou que todos os presos condenados em regime aberto e semiaberto deverão seguir para prisão domiciliar. A medida também vale para os encarcerados por conta de não pagamento de pensão alimentícia.

O presidente do TJ mineiro também determinou a revisão de todas as prisões cautelares assim como o encarceramento de indivíduos que se enquadram no grupo de risco, como os diabéticos, cardiopatas, maiores de 60 anos, pós operados, portadores de HIV, tuberculose e insuficiência renal.

Todos os presos beneficiados por essa decisão deverão comparecer uma vez por mês em uma unidade prisional para registro das atividades e da situação processual.

Suspensão dos prazos processuais

Também nesta segunda-feira (16), o presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo,  Geraldo Francisco Pinheiro Franco, determinou a suspensão dos prazos processuais, do Tribunal do Júri e das audiências por um período de 30 dias. Segundo Franco, o objetivo é impedir a transmissão do coronavírus entre a população encarcerada, evitando a apresentação de presos.

A medida também suspendeu as entrevistas de cunho psicossocial e as perícias nas unidades prisionais, nos Centros de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente e nas entidades de acolhimento.

Ficam afastados do trabalho, por um mês, magistrados e servidores com mais de 60 anos, pessoas com deficiência, gestantes e portadores de doença crônica.

“Greve branda”

A suspensão da saída temporária foi um capítulo a mais em relação às tensões dentro das penitenciárias paulistas. Desde janeiro, o Primeiro Comando da Capital (PCC) determinou que integrantes da facção em São Paulo fizessem uma espécie de “greve branda”, incluindo a recusa a ir às audiências.

Agentes penitenciários afirmaram ao portal UOL que os detentos reivindicavam a saída de membros do PCC de presídios de Brasília e melhores condições alimentícias nas cadeias. O chefe da facção, Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, e outros integrantes da cúpula estão encarcerados na capital do país.

Edição: Leandro Melito