Legado

Cineasta que filmou Chico Mendes um mês antes do assassinato rebate Ricardo Salles

Denise Zmekhol comenta declaração "pobre e mal-informada" de ministro sobre o líder extrativista morto há 30 anos

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
Um dos registros mais conhecidos feitos por Zmekhol, que conheceu de perto a luta de Chico Mendes
Um dos registros mais conhecidos feitos por Zmekhol, que conheceu de perto a luta de Chico Mendes - Foto: Denise Zmekhol

O seringueiro e ativista ambiental Chico Mendes, assassinado há pouco mais de 30 anos por sua luta em defesa da Amazônia, foi chamado de "irrelevante" pelo atual ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. A declaração, feita durante uma entrevista de Salles para o programa Roda Viva, da TV Cultura, na última segunda-feira (11), expôs o ministro dentro e fora do país: Salles disse que não faz diferença, hoje em dia, quem seja Chico Mendes. Para completar, insinuou que Chico Mendes tinha benefícios pessoais com o ativismo.

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Para rebater as declarações de Salles, o Brasil de Fato entrou em contato com a cineasta Denise Zmekhol, que esteve com o seringueiro um mês antes de seu assassinato, e testemunhou de perto a luta pela preservação da floresta. As entrevistas e filmagens foram usadas, em 2009, no lançamento do documentário "Crianças da Amazônia" -- que recebeu 15 prêmios internacionais e foi exibido em redes de televisão na França, Reino Unido e Estados Unidos.

No filme, Zmekhol recupera imagens e gravações de  andanças pela Amazônia entre 1987 e 1990, além de gravações realizadas 15 anos depois, narrando o reencontro com povos indígenas e comunidades rurais extrativistas beneficiadas pelo legado de Chico Mendes. Zmekhol também é autora de algumas das fotos mais difundidas do seringueiro, no fim de 1988.


Chico Mendes: simbolo internacional da luta pela Amazônia (Foto: Denise Zmekhol)

"Uma pessoa na posição dele [Ricardo Salles] ter feito uma declaração tão pobre e mal-informada, como ele fez, é lamentável. Chico foi um grande símbolo de luta pela Amazônia e em defesa do meio ambiente. Muita gente conheceu a luta pela preservação da Amazônia pelo Chico Mendes. Não se trata de uma pessoa irrelevante", rebate. 

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Pouco antes de morrer assassinado por um fazendeiro da região, ao chegar em casa, no dia 22 de dezembro de 1988, o então presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri (AC) foi o único brasileiro a ganhar o prêmio Papel de Honra Global 500, da Organização das Nações Unidas (ONU). Chico Mendes denunciou ao mundo a expulsão de milhares de seringueiros de suas terras pelo agronegócio. 

Manter a floresta viva era crucial para o trabalho de seringueiros e trabalhadores extrativistas, muitos deles indígenas, que atuavam na coleta de castanha. 

"Ele teve essa percepção genial de juntar índios e seringueiros, que chegaram a ter conflitos em um período anterior, em torno da defesa de um bem universal, que é a floresta amazônica. Sem contar todo seu carisma e sua capacidade de diálogo e articulação, que o levou a ter essa presença internacional tão forte", analisa Zmekhol. Para a cineasta, a agenda ambiental tem o potencial de unificar os interesses de todos os povos do planeta: "A única coisa no mundo que está ligando todos os povos e lugares do planeta, o que nos une a todos, é justamente o meio ambiente. A gente tem que aprender a viver nesse planeta de forma compartilhada", aponta.  

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A cineasta entende que o país vive um momento de retrocessos, em que uma agenda "anti-ambiental", semelhante aos tempos da ditadura militar, volta a ganhar espaço. "Achei que era tão fora do nosso futuro essa coisa da ditadura, mas de repente você começa a ver esse ranço reaparecendo, reprimindo o pensamento das pessoas, especialmente das minorias", lamenta.

Antes de assumir o Ministério do Meio Ambiente, Ricardo Salles foi secretário particular do ex-governador de São Paulo (SP), Geraldo Alckmin (PSDB), de 2013 a 2014, e Secretário do Meio Ambiente de São Paulo, de 2016 a 2017. 

Edição: Daniel Giovanaz