Entidades representantes de rádios comunitárias repudiaram a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que declarou constitucional o “proselitismo de qualquer natureza” na difusão de rádios comunitárias. A decisão da Corte, por sete votos a dois, se deu no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) 2566, que contestava um artigo da Lei 9612 de 1998.
Geremias dos Santos, da Associação de Radiodifusão Comunitária, afirma que a Lei, apesar de vedar o proselitismo, engessa a possibilidade de financiamento das emissoras, que lutam por sua sobrevivência. As dificuldades econômicas, aliadas à decisão do Supremo, poderão levar muitas estações a serem “capturadas”.
“Nós ficamos preocupados que muitas rádios poderão ficar na mão de partidos. A maioria das cinco mil rádios [comunitárias] estão em municípios pequenos, a influência política e religiosa é muito grande. Com a falta de finanças, vai ter rádio com a programação quase toda religiosa”, prevê.
Diante do argumento de que a vedação ao proselitismo seria um ataque à liberdade religiosa, Pedro Martins, da Associação Mundial de Rádios Comunitárias, lembra o caráter público das rádios.
“Uma concessão pública não pode ser destinada ao uso exclusivo de uma religião. Não quer dizer que não pode falar de religiosidade, mas que contemple a diversidade que tem no país. Liberdade significa pluralidade. A gente não pode aceitar que a diversidade possa ser sufocada”, defende.
Renata Mielli, coordenadora-geral do Fórum Nacional de Democratização da Comunicação, afirma que o discurso que relaciona proselitismo a liberdade de expressão é enganoso, já que o primeiro, na verdade, limita a liberdade de outras vozes.
“O STF, nos últimos anos, tem tido uma visão ultra-liberal da liberdade de expressão. Uma liberdade sem contrapesos. Isso acaba tendo um efeito contrário. No caso da comunicação, garantir que veículos não estejam minimamente vinculados a partidos ou religiões é o que garante a liberdade de expressão e que haja um abordagem democrática”, analisa.
Julgamento
O relator do caso, ministro Alexandre de Moraes, votou pela constitucionalidade do dispositivo, afirmando que este garantia a pluralidade. O ministro Edson Fachin foi o primeiro a abrir divergência com Moraes, defendendo que o proselitismo é parte integrante do direito à liberdade religiosa e de expressão.
Moraes rebateu a tese lembrando o caráter público das rádios comunitárias e que o "Estado não pode oferecer instrumento para que se realize proselitismo, seja religioso ou não. No caso de religioso, mais grave ainda porque Estado é laico". O único ministro a concordar com o relator, entretanto, foi Luiz Fux. Gilmar Mendes e Dias Toffoli estavam ausentes.
Edição: Diego Sartorato