O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) divulgou, no início de fevereiro, a decisão que permite que um candidato financie em até 100% a própria campanha eleitoral, agora que as doações de empresas estão proibidas.
Presidido pelo ministro Luiz Fux, o TSE impôs apenas um valor limite para cada cargo. Os candidatos ao Planalto, por exemplo, podem gastar até R$ 70 milhões do próprio bolso. Quem concorre ao governo do estado, até R$ 21 milhões, com variação de limite entre as regiões do país. Quem disputa o cargo de deputado federal pode bancar até R$ 2,5 milhões. Já os candidatos a deputado estadual, até R$ 1 milhão.
Para a professora Maria Aparecido Aquino, do departamento de História da Universidade de São Paulo (USP), a decisão acentua desigualdades permitidas no sistema eleitoral. "As campanhas acabam se transformando em campanhas milionárias o que faz com que uma pessoa que não tem condições, mas que poderia ser um excelente candidato, não tenha possibilidade de acessar" explica.
A professora avalia que a medida tomada em nome do "combate à corrupção" vai na contramão da proposta e pode tornar os casos de desvios e recebimentos ilícitos ainda mais nefastos. Segundo ela, a decisão privilegia os ricos. "Privilegia os interesses econômicos. É a manutenção dos privilégios de quem já tem privilégios", afirma.
Um dos possíveis candidatos, o apresentador e empresário Luciano Huck, poderá colocar boa parte do seu capital de cerca R$ 300 milhões em sua campanha, caso decida concorrer à Presidência.
O advogado Aldo Arantes, que também é cientista político e ex-integrante da Comissão Especial de Mobilização da Reforma Política da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), considera que a decisão do TSE vem na esteira do golpe contra a presidenta Dilma Rousseff, que consolidou os interesses do mercado através de medidas como a reforma trabalhista, por exemplo.
O que eles querem é exatamente liquidar com qualquer possibilidade de resistência parlamentar para aprofundar o processo de desmonte do estado brasileiro e das conquistas sociais", conta.
Arantes vê ainda o financiamento de campanha como ponto que fragiliza a democracia. "Essa questão do papel do poder econômico nas eleições é fato determinante da degradação do sistema de representação parlamentar nas democracias representativas", analisa.
Desigualdades
Em 2016, por exemplo, João Doria (PSDB) injetou R$ 4,44 milhões do próprio bolso na própria campanha para a prefeitura de São Paulo, o equivalente a 36% das receitas dele. O tucano foi eleito em primeiro turno.
O tema foi fruto de muita controvérsia durante a votação da reforma política, ocorrida em outubro de 2017, quando foi aprovada a regra que proibia que candidatos injetassem mais do que 10% de seus rendimentos nas campanhas. No entanto, Michel Temer vetou a medida, permitindo mais uma vez o autofinanciamento sem limites.
Meses depois, o Congresso derrubou o veto de Temer mantendo a limitação de 10% da renda. Porém, como isso ocorreu a menos de um ano da disputa, criou-se a dúvida jurídica sobre o que valerá de fato nas eleições de 2018.
A recente decisão do TSE é vista pelo cientista político como uma manobra já que o financiamento empresarial está proibido.
"Ao estabelecer que uma pessoa pode financiar sua campanha você evidentemente permite que o poder econômico se sobreponha aos interesses da coletividade", afirma Aldo Arantes.
O TSE pode mudar esse entendimento sobre o autofinancimento de campanha até o dia 5 de março, data limite para a publicação de todas as regras das eleições de 2018.
Edição: Camila Salmazio