Nesta segunda-feira (16) se celebra o Dia Mundial da Alimentação Saudável, que tem a finalidade de chamar a atenção da população mundial para os problemas relacionados à fome e desnutrição, que assola cerca de 815 milhões de pessoas em todo o mundo, segundo dados das Organizações das Nações Unidas (ONU).
Além disso, os movimentos populares do campo também aproveitam a data para fazer o debate em torno do modelo de produção agrícola e denunciar o alto consumo de agrotóxicos praticado pelo agronegócio. O Brasil, por exemplo, é o campeão no uso de agrotóxicos na agricultura, ao utilizar quase 900 mil toneladas na safra de 2015, de acordo com dados do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg).
Para debater essas questões, o Brasil de Fato conversou com a culinarista e apresentadora Bela Gil. A importância da implementação da agroecologia e da soberania da agricultura familiar foram os pontos que permearam a entrevista.
A apresentadora e chef de cozinha também reiterou a necessidade de incluir no prato da população brasileira alimentos livres de agrotóxicos.
Preocupada com os efeitos nocivos dos agrotóxicos, Bela destaca a Política Nacional de Redução de Agrotóxicos (PNaRa), que, entre outros pontos, visa barrar diversas iniciativas defendida pelo "Pacote do Veneno" proposto pela Bancada Ruralista no Congresso Nacional, que pretende mudar o nome de "agrotóxicos" para "defensivo fitossanitário", além de alterar a venda, rotulação e distribuição destes produtos.
Brasil de Fato: Dia 16 de outubro é comemorado o Dia da Alimentação Saudável. Segundo dados do IBGE, o consumo nacional de ingredientes ativos de agrotóxicos dobrou. Como você avalia isso?
Bela Gil: Eu acho que afeta deixando a gente doente, obesos, com doenças crônicas. Eu acredito que essa forma como a gente produz comida vem afetando a saúde da população, porque a gente parou de diversificar o campo. A gente devasta e planta uma, duas ou três monoculturas e isso acaba afetando o modo como a gente consome, como a gente come.
Com a chegada de Michel Temer no poder, temos visto diversas ofensivas da bancada ruralista no Congresso. Você concorda?
Isso não vem de hoje, isso vem de muito tempo. O Brasil é baseado numa economia agrícola e o modo como a gente produz comida tem que mudar. A gente não pode mais basear a nossa economia nisso, do jeito que está.
Então acho que não vem de hoje. Que eu me lembre não teve nenhum presidente, nenhum representante para levantar a bandeira de uma produção mais agroecológica, mais sustentável, com um impacto menor no meio ambiente, na nossa saúde. Mas sempre frisando o poder da economia, comemorando as toneladas de soja, que são exportadas e colhidas. Então eu acho que é um problema mesmo cultural da política.
Como você enxerga a tentativa de ruralistas de alterarem a lei de agrotóxicos?
Eu acho que é a tentativa de sempre de poder controlar o que a população vem consumindo. Envenenando o prato dos brasileiros, porque a gente pode mudar. A questão é que não querem. Eu acho que é um absurdo, uma vergonha pro Brasil a gente ter este tipo de representante na bancada, querendo fazer com que a gente coma veneno.
Então fica uma conversa um pouco esquizofrênica de "Dia da Alimentação saudável", fazer com que as pessoas comam melhor e tratar a obesidade, etc, envenenando as pessoas, fazendo com que os produtos orgânicos sejam, muitas vezes, menos acessíveis, mais difíceis de achar. Muitas vezes mais caros. É bem complicado.
Você acha importante, então, apoiar o PNaRa, a Política Nacional de Redução de Agrotóxicos, proposta por movimentos populares?
Eu acho que esse é o caminho que a gente tem. A gente usa a nossa força, nosso poder enquanto indivíduo para poder mudar. Enquanto nosso governo não faz o seu papel, de proteger e levar uma comida segura para a população, eu acho muito importante esses movimentos, todos os movimentos que debatem as questões dos venenos e mostram para a população com pesquisas, debates o porquê e como esses venenos estão nos matando.
Quais seriam as saídas possíveis para que toda população pudesse comer comida saudável?
Eu acho que é mudando a forma como o campo produz. Eu acho que se a gente começar a transformar as monoculturas em cultivos agroecológicos, agroflorestais, diminuindo as propriedades, distribuindo melhor os espaços de terra, fazendo com que o campo produza de uma maneira mais justa, mais limpa, a gente consegue sim levar comida para a mesa de todos os brasileiros.
O Brasil hoje é um grande produtor de alimentos, mas que não vai parar no prato de quem precisa. Muitas vezes vai parar em outros países para alimentar animais ou pra virar base de produtos ultraprocessados, mas não necessariamente para virar comida na mesa do povo. Então eu vejo que o caminho é agroecologia. É a forma mais harmônica e sustentável de se produzir comida e vejo muito a agroecologia como essa resistência, como eu até falei no post, da alimentação saudável e da comida de verdade. Porque é a única forma que a gente tem pra colocar comida sem veneno no prato de todo mundo.
Edição: Simone Freire