Na semana passada, estreou nos cinemas brasileiros o filme “Polícia Federal - a Lei é para Todos”. É a história da operação Lava Jato, contada sob o ponto de vista da Polícia Federal e do Ministério Público. O problema é que essa história está incompleta.
Teori Zavascki morreu em um acidente cujas causas são investigadas até hoje. Edson Fachin assumiu a relatoria da operação no STF. Réus aguardam julgamento em liberdade. Raquel Dodge vai substituir Janot na Procuradoria-Geral da República. A força-tarefa está sob ameaça. O foro privilegiado também. O ex-presidente Lula pode ser absolvido ou preso após decisão em segunda instância. Novas fases da operação acontecem a todo o tempo. Os rumos da Lava Jato são imprevisíveis.
Segundo entrevista recente do ator Roberto Birindelli, que interpreta Alberto Youssef, fazer um filme sobre a Lava Jato é uma “insensatez”. O argumento dele é que não há distanciamento histórico suficiente para produzir uma narrativa. Ou seja, os diretores poderiam esperar mais alguns anos. Mas por que eles não esperaram?
A resposta é simples: a Lava Jato é movida pelo espetáculo. É por isso que as livrarias estão cheias de biografias do juiz Sérgio Moro. O chefe da força-tarefa, Deltan Dallagnol, também lançou livro em meio à operação.
A Lava Jato precisa dos holofotes. Precisa do público ao seu lado. Precisa que as pessoas criem empatia com os investigadores, para que apoiem condenações a qualquer custo. Moro sabia disso desde 2004, quando escreveu um artigo sobre a operação Mãos Limpas, na Itália. Ele elogiou o trabalho cooperado entre a Justiça e a mídia, para deslegitimação da defesa dos acusados.
O lançamento de um filme comercial sobre um processo tão complexo como a Lava Jato só escancara a espetacularização da Justiça no Brasil. E os patrocinadores continuam ocultos, o que alimenta a polêmica sobre quem está por trás desse longa-metragem.
As cenas vazaram, primeiro, no jornal O Globo, e essa é uma pista importante. As organizações Globo ajudaram a articular o golpe de Estado em 2016, segundo o ex-presidente Lula, réu na Lava Jato. Existem dois lados, muito claros, e o filme escolheu um deles para contar a história. Os delegados e procuradores são os mocinhos, e os investigados são os vilões.
Todas as ações penais contra Lula estão em aberto. A condenação, no caso triplex, pode ser derrubada a qualquer momento. Nada mais imprudente do que lançar um filme em que réus sem julgamento são interpretados por atores que não sabem se o personagem é corrupto ou inocente. Aliás, no caso da Lava Jato, não é imprudência: é uma estratégia de comunicação. A estratégia do espetáculo.
Edição: Mauro Ramos