O cenário de agravamento da crise em torno da figura de Michel Temer (PMDB) tem impulsionado as articulações da oposição no sentido de travar a tramitação das propostas legislativas que promovem a retirada de direitos. A partir desta semana, parlamentares de partidos como PT, PSOL, PCdoB e Rede prometem obstruir a pauta de votações. Paralelamente, eles exigem a instalação imediata de uma comissão especial na Câmara Federal para tratar do impeachment do peemedebista.
Já foram protocolados 13 pedidos de deposição de Temer, sendo nove deles na semana passada, mas até o momento o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), não se manifestou sobre o assunto. A criação de um colegiado para apreciar o caso depende de iniciativa do democrata.
Obstrução
Enquanto alguns deputados da base aliada – especialmente expoentes do PSDB e do DEM – tentam sustentar o discurso governista de aparente normalidade, a oposição argumenta que o sufocamento do governo impede a continuidade das pautas de interesse do Planalto.
“Como nós vamos votar qualquer matéria com o país nesta situação em que ele se encontra? Não podemos ser coniventes com essa tentativa de demonstrar que o que está acontecendo é normal. Não iremos votar qualquer coisa antes da instalação da comissão do impeachment”, disse o deputado Alessandro Molon (Rede-RJ).
Para o líder do PSOL na Câmara, Glauber Braga (RJ), as denúncias que vieram à tona com as delações da empresa JBS fortalecem o discurso oposicionista de que faltaria ao governo respaldo para sustentação das matérias legislativas. “Se ele já não tinha legitimidade pra aprovar essas pautas antes disso tudo acontecer, agora é que não tem mesmo”, completa Braga.
Segundo o psolista, o partido deverá levar ao presidente da Casa nesta terça (23), durante a reunião semanal de líderes, a intenção de obstruir os trabalhos, reforçando ainda o pedido pela instalação da comissão do impeachment.
“Além disso, se eles tentarem votar em plenário alguma matéria, tentando dar um clima de normalidade que não existe, vamos obstruir o conjunto das votações, utilizando todos os instrumentos que tivermos – requerimento de retirada de pauta, pedido de leitura de ata, etc.”, disse o líder do PSOL.
A bancada do Partido dos Trabalhadores (PT), a maior da oposição, deve se reunir ainda nesta segunda-feira (22) para definir detalhes da estratégia a ser implementada a partir de agora, mas o grupo já antecipou que seguirá a linha de obstrução dos trabalhos.
“Só se coloca em votação o que disser respeito à PEC [Proposta de Emenda Constitucional] que trata das ‘Diretas já’”, ressalta a deputada Érika Kokay (PT-DF), em referência à PEC 227, que prevê eleições diretas em caso de vacância do cargo de presidente da República na segunda metade do mandato.
“Diretas já”
De autoria do deputado Miro Teixeira (Rede-RJ), a PEC das eleições diretas está parada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) desde junho do ano passado, por conta de articulações da bancada governista. A estratégia dos aliados de Temer tem sido evitar uma alteração na Constituição Federal para que, em caso de renúncia do peemedebista, o grupo possa conduzir um novo nome ao cargo, de forma indireta.
No entanto, com o crescimento da impopularidade de Temer e diante da decomposição da própria base aliada – que vem perdendo apoio desde a semana passada, incluindo o do PSB, que tem 35 deputados –, a oposição conseguiu fechar um acordo com o presidente da CCJ, Rodrigo Pacheco (PMDB-MG), para colocar a PEC em votação nesta terça-feira (22), a contragosto do governo.
“Temos interesse em dar uma resposta ao país e em assegurarmos que a PEC 227 tenha celeridade, exigida pela gravidade da situação”, disse Kokay. Caso seja aprovada na CCJ, a PEC deve contar com uma comissão especial. Após a criação do colegiado, correrá o prazo de dez sessões para a apresentação de emendas, o que já permitiria a apresentação de parecer por parte do relator. O tempo de duração da comissão pode chegar a 40 sessões.
Segmentos populares
Para os parlamentares, a intensificação da crise que circunda a figura de Michel Temer favorece ainda a interlocução do parlamento com as ruas, na tentativa de evitar a aprovação das reformas trabalhista e da Previdência.
Na semana passada, o relator da reforma trabalhista no Senado, Ricardo Ferraço (PSDB-ES), anunciou a suspensão da elaboração do parecer sobre a proposta, alegando ausência de clima político para a continuidade da matéria. Na mesma linha, o relator da reforma da Previdência na Câmara, Arthur Maia (PPS-MA), defendeu, na última quinta-feira (18), a paralisação da tramitação da PEC 287, que institui as novas regras para a aposentadoria.
Para o diretor-executivo da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Júlio Turra, o êxito da Greve Geral, realizada no dia 28 de abril, estaria por trás do contexto de agravamento da crise que atinge o Planalto e a base aliada no Congresso.
“O governo vinha anunciando uma falsa recuperação econômica, vinha dizendo, também falsamente, que vivia seu melhor momento, e confiava na aprovação das reformas, o que já não era evidente em função, fundamentalmente, da Greve Geral. Isso porque ela ajudou a isolar o Temer no sentido de demonstrar sua incapacidade de levar as reformas no ritmo previsto pelo mercado”, analisa Turra.
Para o dirigente, o cenário atual fortalece a luta popular e o possível sucesso do movimento “Ocupa Brasília”, agendado para a próxima quarta-feira (24). Segmentos populares de diversas partes do país deverão ocupar a capital federal em protesto contra o governo, encampando a luta por eleições diretas. “Temos que fazer nossa parte, e isso se dá com muita mobilização”, finaliza Turra.
Edição: Luiz Felipe Albuquerque