Despejo

Famílias Guarani e Kaiowá são desalojadas sem ordem judicial em Dourados (MS)

Para lideranças da região, ação é mais uma sinalização da estratégia do governo interino de reprimir povos indígenas

São Paulo |
Cacique Damiana Cavanha saiu do acampamento levando cruzes representando mortos indígenas vítimas da precaridade da situação do seu povo
Cacique Damiana Cavanha saiu do acampamento levando cruzes representando mortos indígenas vítimas da precaridade da situação do seu povo - Comitê de Defesa Indígena de Dourados

A situação de extrema vulnerabilidade das famílias indígenas Guarani e Kaiowá de Tekohá Apyka'i foi agravada na manhã desta quarta-feira (6) com a ação de despejo realizada pela Polícia Federal, com ordem do juiz Fábio Kaiut Nunes.

Uma grande movimentação policial começou às 5h da manhã desta quarta, quando agentes da Polícia Federal, Polícia Rodoviária, Polícia Militar, Força Tática e Força Especial entraram no acampamento anunciando o despejo. O grupo, formado por cerca de 30 indígenas, pensou em resistir, mas resolveu sair pacificamente intimidado pela força policial com mais de 100 homens.

Equipes de advogados/as do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e de outras entidades ligadas aos Direitos Humanos, articulam ações para contestar a ordem de despejo.

O território Apyka'i está a sete quilômetros do centro de Dourados (MS), sentido Ponta Porã, entre um riacho poluído e uma plantação de cana.

A área está arrendada para a usina São Fernando, de propriedade do pecuarista José Carlos Bumlai, preso na Operação Lava Jato.

Sem ter para onde ir, as famílias voltarão para a beira da BR-463 onde viveram por mais de dez anos.

Nove pessoas já faleceram, oito delas, vítimas de atropelamentos, e uma envenenada por agrotóxicos utilizados nas plantações que circundam o lugar.

As tensões entre o governo Temer e o movimento indígena se acirraram nesta semana quando foi divulgada a informação de que estão em curso negociações para que o general reformado, Roberto Sebastião Peternelli (PSC) assuma a presidência da Funai. Para lideranças da região, a ação de hoje é mais uma sinalização da estratégia do governo interino de reprimir, intimidar e despejar os povos indígenas.

Histórico

Desde maio deste ano, o poder judiciário tenta remover as famílias daquele território. Em junho, o mesmo juiz requisitou ao Ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, o envio de tropas da Força Nacional de Segurança Pública para retirar os indígenas da área.

Na época, a Funai entrou com pedido de Suspensão de Liminar no Supremo Tribunal Federal (STF), para evitar o despejo. Esse pedido ainda tramita no STF e, à revelia do que está sendo requisitado pela Funai, a reintegração de posse ocorreu hoje.

Liderança

Pela manhã, a cacique Damiana Cavanha, 70 anos,  saiu do acampamento Apyka'i levando nove cruzes embaixo do braço, simbolizando as nove pessoas Guarani e Kaiowá que faleceram à beira da BR-463. Todas as vezes que é despejada, Damiana carrega junto consigo o símbolo que lembra seus antepassados e familiares mortos, incluindo seu neto, de apenas 4 anos.

Depois de 4 anos morando no território chamado pelos indígenas de  "tekohá" (terra onde se é), da tradução do guarani, Damiana volta com seu povo para a beira da rodovia.

Indígenas no Mato Grosso do Sul

O Mato Grosso do Sul possui pouco mais de 35 milhões de hectares. As áreas urbanas de seus 79 municípios somam apenas 44,1 mil hectares. Segundo dados do IBGE, os Guarani e Kaiowás ocupam 35 mil hectares Mato Grosso do Sul. Estudos preliminares do Cimi sobre o tamanho das terras reivindicadas pelos indígenas apontam que estas não ultrapassam 900 mil hectares. Isto é, menos de 2,5% do território do estado.

Com informações do Conselho Indigenista Missionário (Cimi)

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