Com o país alarmado por uma "epidemia de incêndios", como afirmou o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino em audiência recente na Corte, o Brasil de Fato conversou com o deputado federal Nilto Tatto (PT-SP), ambientalista, membro da Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados e coordenador da Frente Parlamentar Ambiental.
Em São Paulo, estado de origem do deputado, foram mais de 6 mil focos de incêndios em 2024, o que levou a capital a ter uma das piores qualidades do ar em todo o mundo. Uma ação chegou a ser protocolada na Justiça, na quarta-feira (11), pedindo que a Prefeitura de São Paulo seja obrigada a decretar estado de emergência climática na cidade devido à insalubridade do ar registrada nos últimos dias.
Para Tatto, a situação é resultado de um desmonte das políticas ambientais, a exemplo do que ocorreu durante a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro.
"Aquilo que aconteceu no âmbito federal com o governo Bolsonaro, que desmontou todo o Sistema Nacional de Meio Ambiente, a capacidade do poder público de reagir a esses momentos que a gente está vivendo, no estado de São Paulo vem acontecendo esse desmonte, essa desestruturação", afirma o parlamentar.
Em 5 de agosto deste ano, quando se comemora o Dia do Meio Ambiente, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) anunciou um conjunto de medidas denominado "Pacote Climático", que sofreu críticas, principalmente por relegar ao setor privado responsabilidades sobre políticas ambientais que deveriam ser de competência do Estado, na opinião de ambientalistas.
O Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Estado de São Paulo (Sintaema) publicou texto em que afirma que o pacote ambiental do governo paulista "deixou de lado ações voltadas à mitigação da crise hídrica no estado" e excluiu ações de combate à seca.
"O maior responsável é o governo do estado. E é importante a gente denunciar, porque ato contínuo depois daquele conjunto de incêndios de sexta para sábado, a medida que o governo do estado fez foi somente acudir os grandes produtores de cana, os grandes fazendeiros, os grandes latifundiários", denuncia Tatto.
Outras críticas ao pacote ambiental do governo de Tarcísio de Freitas são a ameaça de privatização dos parques estaduais e unidades de conservação, a "liberação irresponsável de agrotóxicos", retrocessos na legislação ambiental e a venda dos sistemas de água e saneamento. Em julho deste ano, o governo paulista concluiu a privatização da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp).
Cenário nacional
Uma questão estrutural destacada por Tatto é a insuficiência do aparato disponível para o combate aos incêndios pelo volume de focos ativos em todo o país. Numa outra frente, o parlamentar defende que haja apuração rigorosa sobre os incêndios criminosos, e uma mobilização social capaz de pressionar o Congresso Nacional.
"De um lado, você tem o governo preocupado e trabalhando para poder enfrentar a crise climática, mas por outro lado, aquilo que a gente está vivendo no Congresso Nacional, que aprovam muito mais legislação que flexibiliza a legislação ambiental, que não dialoga com aquilo que o próprio governo está fazendo, pelo contrário", denuncia.
Para o deputado, é importante avançar em parâmetros legais rígidos, que estabeleçam responsabilidades duras a quem descumpra a legislação ambiental. "O arcabouço legal, estou falando da legislação, precisa ser mais rígida, chamar à responsabilidade, principalmente dos proprietários, porque de certa forma não está cumprindo com a função social e ambiental da propriedade, quando provoca ou deixa incendiar, tacar fogo, quando é proibido", disse.
Durante coletiva de imprensa Iniciativa do G20 sobre Bioeconomia (GIB), realizada nesta quarta-feira (11), no Rio de Janeiro, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, afirmou que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva estuda medidas para frear o desmatamento e os incêndios, estabelecendo o confisco de terras de autores de queimadas criminosas.
O que fazer?
Tatto defende que, além do aumento do controle ambiental, através de uma legislação mais rígida, é preciso valorizar os povos e comunidades tradicionais, que são os grandes defensores da biodiversidade, além das experiências de agroecologia produzidas nos assentamentos e acampamentos da reforma agrária por todo o país.
"Nós precisamos fomentar a cadeia da restauração, recuperar as áreas de preservação permanente, nascentes, beira de rio, reserva legal. Só no estado de São Paulo, a gente tem pelo menos 5 a 6 milhões de hectares que precisam ser recuperados, que pode ser com agrofloresta, pode ser com [vegetação] nativa. E por isso que é importante, inclusive, o trabalho que o MST está fazendo agora de fomentar essa campanha de plantio de árvores", declarou Tatto, fazendo referência o plano de plantio do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, que pretende plantar 100 milhões de árvores em todo o país, até 2030.
O Brasil de Fato pediu posicionamento do governo paulista sobre as críticas, mas não obteve retorno até está publicação. Se houver resposta, este texto será atualizado.
Edição: Thalita Pires