O Estado Falcón é estratégico na Venezuela. Com a segunda maior refinaria do mundo, o lugar é também uma Zona Econômica Especial e recebe investimentos de empresas privadas para alguns setores produtivos. Mesmo tendo um perfil importante para a economia venezuelana, Falcón é também um estado-chave para a política chavista e a Consulta Popular das Comunas explicitou essa importância.
Dos cerca de 49 mil conselhos comunais que existem no país, 2.414 ficam em Falcón, quase todos em zonas rurais. No último domingo (25), seus integrantes votaram por projetos para as comunas, e demonstraram apoio ao governo nas ruas, para fortalecer políticas para espaços que são responsáveis pelo aprofundamento do socialismo na Venezuela e o debate sobre o chavismo.
A comuna Comandante Hugo Chávez fica na cidade de Punto Fijo, conta com cerca de 7 mil moradores que baseiam sua produção em bens e serviços. O calor abafado e problemas de abastecimento fizeram com que um dos principais projetos votados pelos comuneros fosse a manutenção na rede de água. Além de discutir problemas imediatos, a consulta também é uma forma de mobilizar os comuneros para validar o sistema eleitoral que está em discussão na Venezuela desde a reeleição de Nicolás Maduro.
Os resultados apresentados pelo Conselho Nacional Eleitoral venezuelano (CNE) que indicaram a vitória do atual presidente foram contestados por países do Norte como os Estados Unidos e alguns europeus. O assunto ainda está quente e é discutido também como parte do processo das comunas venezuelanas.
As comunas venezuelanas votaram por projetos de rápida execução voltados para a produção ou para infraestrutura. Cerca de 1,5 milhão de venezuelanos votaram em 49 mil conselhos comunais de 4.505 comunas do país para escolher melhorias em escolas, unidades de saúde, abastecimento de água, energia ou áreas de lazer.
Segundo a porta-voz da comuna, Joana Cardena, as agências desses países passam a imagem para o mundo de que o país está passando por um “grave momento de violência”, o que, para ela, não condiz com a realidade.
De acordo com Cardena, a Consulta Popular também é uma forma de passar ao mundo a mensagem de como está a Venezuela, um mês depois das eleições.
“Aqui na Venezuela não se vive o que estão dizendo lá fora. Quando você vem, se dá conta que quem sai e te dá a mensagem somos nós, os venezuelanos. Se aqui estivesse mal, não teria essa multidão de pessoas dizendo o que eles precisam. E agora, com a transferência de poder que o presidente Nicolás Maduro dá ao povo, a mensagem positiva é a que mandamos aos países de fora. Que na Venezuela é a comunidade e o povo que está governando, não Nicolás”, disse ao Brasil de Fato.
Essas organizações podem ser de quatro tipo, em um nível econômico: empresas de propriedade social direta comunal, as unidades de produção familiar, os grupos de intercâmbio ou as empresas de propriedade social indireta comunal, que são empresas mistas com metade administrada pelo Estado e metade pela comuna.
Toda essa estrutura fomenta o que o ex-presidente Hugo Chávez entendia ser uma revolução bolivariana socialista. Ele projetava a construção de um Estado novo, com novas institucionalidades, novas maneiras de administrar os territórios e trocas na sociedade. Com a lei promulgada em 2010, o governo de Chávez institucionalizou uma forma de organização que não era comum no país. A ideia era descentralizar o poder Executivo para o que passou a ser chamado constitucionalmente de Poder Popular.
A finalidade era que a gestão do Estado fosse feita por uma Federação Comunera. Essa organização seria uma estrutura que reúne as comunas do país. O objetivo é que o governo fosse administrado de baixo para cima, no qual a decisão dos conselhos comunais teriam peso na decisão coletiva da Federação.
A comuna Juntos por um Propósito tem uma produção focada em bens e serviços. O centro de votação encheu no final de semana para a manutenção do posto de saúde. Mas para os comuneros, a ideia é também sedimentar uma autogestão que é a finalidade do socialismo. A porta-voz Indira Mata afirma que há um respaldo da população junto ao governo para garantir não só a vitória nas eleições, mas a continuidade de um projeto que coloque as comunas no centro do debate.
“Para nós, o resultado das eleições não está em discussão. Agora temos um presidente eleito que se chama Nicolás Maduro. O que vamos fazer é consolidar o modelo de governo do nosso presidente. A ideia é que todos os recursos sejam distribuídos nos territórios porque são os que conhecem suas necessidades. Muito mais além das prefeituras e dos governadores, ele quer que o povo seja empoderado e que diga o que precisa e esse é um modelo que acreditamos”, afirma ao Brasil de Fato.
Respaldo eleitoral
Os comuneros também avaliam que a realização da consulta justamente um mês depois das eleições mostra o apoio de parte dos venezuelanos à vitória do governo. Ao lado da comuna Seguidores de Bolívar há um centro hospitalar com a imagem de Maduro na fachada. A unidade foi reformada com base na primeira consulta popular de 2024, que aconteceu em abril. Com o êxito nas obras, o lugar recebeu mais um montante para comprar um ar condicionado para a fisioterapia.
A porta-voz da comuna Seguidores de Bolívar, Joana Cardenas, afirma que tudo isso impulsiona o respaldo da população junto ao governo para garantir não só a vitória nas eleições, mas a continuidade de um projeto que discute a reestruturação e a reorganização da sociedade.
“Nós damos respaldo ao presidente porque ele ainda conta com o povo, o povo está com ele. Porque se não saímos para votar, não temos projetos aprovados. O que eu quero dizer é que as propostas dão impulso aos vizinhos para que eles exerçam seus direitos. E damos a comunidade internacional o recado de que sim, estamos apoiando o presidente Nicolás Maduro”, disse
“O poder reside no povo. Isso é tudo. A importância que têm a mobilização para uma consulta comunal é imprescindível. Sem uma consulta ninguém vai saber o que quer. Sem uma consulta, Maduro não vai saber o que o povo quer. Maduro faz congresso, faz consulta, cada vez que o povo tem que decidir algo, Maduro imediatamente chama uma consulta. Democracia plena, absoluta, total”, afirmou.
O governo da Venezuela anunciou que a transferência de recursos para as comunas começou logo depois da segunda consulta popular do ano. Segundo o ministro das Comunas, Angel Prado, o dinheiro para os 4.500 projetos escolhidos começou a ser destinado na terça (27) e na quarta-feira (28). Cada projeto vai receber US$10 mil (R$ 56 mil na cotação atual).
O ministro afirmou que a maioria dos 27.420 projetos votados foram destinados para melhorias imediatas de serviços públicos, além de manutenção de escolas e quadras.
Edição: Rodrigo Durão Coelho