reparação salarial

A greve da educação federal e o futuro do governo Lula

Em meio à greve de servidores técnicos e docentes, o governo vem utilizando métodos estranhos à boa tradição sindical

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Servidores técnico-administrativos em educação (TAEs) e docentes de universidades federais estão em greve há 90 e 60 dias, respectivamente - Foto: Flickr UTFPR

Uma poderosa greve de trabalhadores da educação federal está perto de completar 90 dias no caso dos servidores técnico-administrativos em educação (TAEs) e próximo de chegar a 60 dias de paralisação de docentes, das universidades e institutos federais. Os comandos nacional e locais de greve estão atuando juntos aos sindicatos nacionais – Andes-SN (Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior), Fasubra (Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnico-Administrativos em Instituições de Ensino Superior Públicas do Brasil) e Sinasefe (Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica).

Entre as principais reivindicações, está na pauta o tema das carreiras, reparação salarial devido aos anos de congelamento promovido pelos governos Temer e Bolsonaro, como também a recomposição orçamentária para melhores condições de trabalho e funcionamento das Instituições Federais de Ensino.

A decisão dos trabalhadores da educação federal em deflagrar greve, pela caracterização que as mesas de negociação estavam produzindo resultado nenhum, já demonstra uma sinalização de que algo não vai bem. Mas o que chama a atenção, é o fato de o governo estar pouco preocupado em resolver essa greve, utilizando inclusive de métodos estranhos à boa tradição sindical numa mesa de negociação. Não estamos falando de qualquer governo, estamos diante de que quem no seu programa eleitoral vencedor na eleição de 2022 tinha o investimento na educação como prioridade, o chefe das negociações da bancada do MGI é um ex-dirigente da CUT e o presidente da república é um ex-sindicalista.  

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Dois argumentos fortes vem sendo apresentados pelos dirigentes sindicais dessa greve e que justifica a revolta, o primeiro é o fato do governo estar apresentando uma proposta que tem o índice de 0% para 2024, prejudicando ativos e os aposentados. Especialmente, esse último, que além de não ter nada de reajuste esse ano, também não recebe os benefícios que vai só para o pessoal da ativa. O segundo argumento é ainda mais pesado, e nos faz pensar se os dirigentes da cúpula do governo aprenderam alguma coisa com o enfrentamento contra os golpistas. Os negociadores do Ministério de Gestão e Inovação (MGI) deram um tratamento muito diferenciado na mesa de negociação para os profissionais da segurança publica. A policia federal, rodoviária federal e policia penal receberam reajustes que em alguns casos chegam a 77%, com índices que serão pagos já esse ano, e tudo isso, sem precisar de fazer 1 dia de greve.

Para agravar de vez toda essa situação, na ultima mesa de negociação com os docentes, na última segunda-feira (27), Jose Lopez Feijóo teve uma atitude que joga no lixo qualquer boa vontade de promover o direito a negociação e o respeito à representação sindical legítima. O negociador chefe do MGI assinou um acordo de greve com o Proifes (Federação de Sindicatos de Professores e Professoras de Instituições Federais de Ensino Superior e de Ensino Básico Técnico e Tecnológico), que é uma entidade sindical que não tem carta sindical, que não indicou greve as suas bases e que tem uma representação totalmente minoritária nessa categoria. As entidades que representam a maioria absoluta dos docentes das universidades e institutos federais (Andes-SN e Sinasefe) tiveram suas contrapropostas ignoradas, com direito a um video que correu pelas redes sociais no qual mostra Feijóo simplesmente virando as costas para dirigentes sindicais que insistiam em ser ouvidos pelos corredores do ministério.

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Ora! O Proifes só pode assinar essa proposta, porque houve uma greve ( movimento paredista no qual essa entidade não tinha acordo) que conseguiu depois de muitos dias de paralisação fazer o governo se mover para apresentar uma proposta diferente da primeira apresentada no inicio das negociações desse ano. Ou seja, o Proifes parasitou essa greve e com a ajuda dos negociadores do MGI conseguiu assinar uma proposta, que ainda que tivesse avanços, não tinha sido considerada suficiente pela ampla maioria das assembleias de docentes para terminar a greve.

Essa atitude gerou revolta contra o método que fere o direito democrático de negociação e obviamente uma reação dos sindicatos que se sentiram prejudicados, que através de uma ação na justiça, conseguiram uma liminar nessa quarta feira, dia 29/05, que anula os efeitos desse acordo, pois o Proifes por não ter carta sindical, não foi considerado uma entidade legitima para assinar tal acordo. Pode ser que essa decisão seja derrubada, mas o desgaste da imagem do governo na relação com sindicatos de trabalhadores da educação já ficou bem arranhada.

Além da greve de docentes e esses fatos inacreditáveis narrados acima, é preciso dar destaque também a greve dos TAE, que no próximo dia 11 de junho vai completar três meses, trata-se da categoria com o pior piso e o pior teto do funcionalismo publico federal. Estamos falando de trabalhadores altamente qualificados, corresponsáveis pelo funcionamento das universidades e institutos federais do país, que são verdadeiras fabricas de produção de pesquisa, ciência e conhecimento.

O que foi ofertado até agora para os Técnico Administrativos em Educação (TAE) é muito aquém do que foi negociado com os profissionais da segurança publica, e o impacto orçamentário da proposta feita a essa categoria representa metade do que foi apresentado aos docentes até agora. O plano de expansão das universidades e institutos federais, a política de cotas que colocou mais jovens da população periférica no ensino superior e a propaganda oficial do governo que dá destaque a educação são elementos muito importantes, mas não vão funcionar plenamente na pratica, sem a valorização dos TAE, que vem sofrendo uma forte evasão de seus quadros, pelo fato da sua carreira (PCCTAE) que está fazendo vinte anos, acumular problemas, contradições, injustiças e péssima remuneração salarial.

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Por ultimo, alertamos sobre qual a conclusão política que o conjunto da categoria de docentes, TAE e suas famílias vão tirar ao final de todo esse processo, pois o tratamento dispensado pelo “governo da reconstrução” não está equivalente a toda luta que os trabalhadores da educação fizeram no ultimo período. Realmente muita coisa foi destruída e precisa ser reconstruída nesse país depois do golpe de 2016 e da experiencia que o povo brasileiro teve diante dos governos Temer e Bolsonaro. Os trabalhadores da educação federal em sua maioria estiveram na linha de frente da luta contra os absurdos da Lava Jato, no combate as consequências da pandemia salvando vidas, na batalha contra a ascensão da extrema direita e do bolsonarismo, e na eleição de Lula em 2022.

Esses sinais de “indiferença” emitidos pelo governo nessa péssima condução nas mesas de negociação com as entidades sindicais da educação federal ainda podem ser revertidos, e precisam ser levados em consideração, especialmente pelos números que as pesquisas de satisfação popular sobre o governo vem demonstrando. É preciso cumprir as promessas de campanha, colocar a educação e seus trabalhadores como prioridade máxima do orçamento federal, se  quisermos pensar um futuro para o governo Lula, diante de uma extrema direita reacionária e neoliberal que está com sangue no olho e com forte capacidade de mobilização.

 

*Gibran Jordão é ex-coordenador-geral da Fasubra (Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnico-Administrativos em Instituições de Ensino Superior Públicas do Brasil) e membro da Travessia Coletivo Sindical e Popular.

**Este é um artigo de opinião e não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.

Edição: Rodrigo Chagas