APÓS PRIVATIZAÇÃO

Copel pressiona por despejo de comunidades em ao menos três cidades da grande Curitiba

Um Termo de Ajuste de Conduta prevê realocação de moradores, mas famílias não sabem se serão instaladas em outro local

Brasil de Fato | Curitiba (PR) |
Moradores são uníssonos na afirmação de que a secretaria de habitação de São José dos Pinhais é inoperante - Pedro Carrano

Localizada no caminho do rio Pequeno, em São José dos Pinhais, às margens da BR 277, boa parte dos moradores da comunidade Jardim Modelo vive dias de insegurança. A Copel – antiga empresa estatal, hoje privada – é autora de um pedido de reintegração de posse contra uma faixa que compreende cerca de 100 famílias.

Os moradores estão perto ou debaixo da rede de energia elétrica da Copel, mas ainda não há delimitação de quem vai ter que sair do local e de quem poderá ficar.

Um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) emitido pela atual gestão do município, datado de outubro de 2023, aponta necessidade de realocação das famílias, instaladas ali desde os anos 1990. Por isso, moradores e lideranças ficaram assustados. Com o TAC nas mãos, aguardavam a realocação oficial para outro terreno, e não uma ordem de despejo.

Eles reivindicam que a empresa espere pela medida de realocação. "A Copel não definiu quem fica e quem sai", afirma Nilton Gonzaga, que mora no local, é da União Nacional de Moradia Popular (UNMP) e do diretório municipal do Psol.

"Não temos certeza sobre qual é a faixa de distância da Copel, uns falam que 17 metros, outros 55 metros, já pedimos, mas nunca tivemos essa informação", aponta.

"Mesmo barco"

"Como a gente vai se virar?", questiona a dona de casa e moradora Jaqueline, que prefere ficar no local onde já vive ao lado do marido e do filho. A dona de casa, que vive lá há dez anos, é uma das pessoas citadas no pedido de reintegração de posse.

Ela se preocupa com a situação das crianças. "Sem condições de pagar aluguel, temos crianças especiais e famílias que trabalham, queremos resposta e ajuda da prefeitura. Não sabemos se a Copel virá despejar a gente", afirma.

Já Diego, motorista, comenta que está "no mesmo barco". 'Estamos juntos mesma situação. Qualquer momento pode dar canetada. Copel está provando pra nós que é desumana", diz.

Morgana, também citada no processo, é uma das mulheres que se aproxima da roda em torno da reportagem do Brasil de Fato Paraná. Ela afirma que paga água e luz, porém está na dúvida se sua casa será removida ou não. "Pagamos a nossa casa, mas ainda não sabemos até onde vamos. Queremos uma resposta, vamos para onde com as crianças?", questiona.

Moradores são uníssonos na afirmação de que a secretaria de habitação de São José dos Pinhais é inoperante, "Não coloca o pé no barro", afirmam. A reportagem do Brasil de Fato Paraná tentou contato com a secretária Camila Monteiro e até agora não teve êxito. A prefeitura de São José dos Pinhais já possui o hábito de despejos individualizados levados a cabo durante a pandemia.


"Queremos uma resposta, vamos para onde com as crianças?”, questiona. / Pedro Carrano

Altos valores de uma empresa privada e menos investimentos sociais

Após a privatização, o valor de mercado da Copel é de R$ 23 bilhões. Ao não ter mais controle público, tem acelerado a pressão pela reintegração de posse e também tem tido falhas no atendimento em todo o Paraná.

"No total, 387 das 399 cidades do estado tiveram falhas no serviço após a venda da Copel. A empresa arrecadou R$ 2,2 bilhões. Deste montante, 50% vão para as mãos dos acionistas. Isso equivale a R$ 1,1 bilhão. Se o povo no Paraná ainda fosse dono da maioria das ações, o estado ficaria com R$ 340 milhões relativos aos 31,1% das ações. Agora, para os cofres públicos, a cifra é de R$ 174 milhões. Parte do lucro que cresceu 102,5% é resultado do não pagamento de PIS e Cofins que poderiam ser utilizados em investimentos sociais", aponta o jornalista Manoel Ramires, colunista do Brasil de Fato Paraná.

Não é apenas em São José dos Pinhais o conflito entre a antiga empresa pública e os interesses da população. Situações semelhantes, de exigência das áreas por parte da Copel, são vistas também em Araucária e, ao lado disso, onze conflitos em Colombo – as duas na região metropolitana de Curitiba.


Antiga empresa estatal e hoje privada, a Copel é autora de pedido de reintegração de posse contra uma faixa que compreende cerca de 100 famílias / Pedro Carrano

Em Colombo, o advogado Adilson Korchak acompanha a situação das famílias. Com a privatização, Korchak aponta que a empresa ingressou com pedido de mudança da Vara da Fazenda Pública, por não ser mais empresa pública e sim privada.

Ele contesta o argumento da empresa de remoção para realização de manutenção das linhas de alta tensão. "Defendi e derrubei liminares com o argumento de que não há nenhum desserviço ali com a manutenção dessas linhas. Poderia fazer a manutenção como já fez em outros episódios", afirma.

Para deputados estaduais, serviço e atendimento piora no interior do Paraná

Somente em 2023, a Copel recebeu vinte e oito mil pedidos de ressarcimento por aparelhos e equipamentos danificados em decorrência de problemas na rede de energia. Desse total, apenas sete mil foram indenizados, o que representa apenas 25% dos equipamentos danificados, prejudicando agricultores, comerciantes e residências.

Para a deputada estadual Luciana Rafanhim, após a privatização da Copel, concluída em 2023, houve uma deterioração na qualidade do fornecimento de energia. "Consumidores residenciais, comerciantes e agricultores estão tendo sérios prejuízos", alerta.

Famílias protestam no dia 25 de abril

"Temos medo de qualquer hora eles virem e nos arrancar daqui – vamos morar debaixo da ponte. Poderíamos até pagar aluguel social, mas não sabemos", afirma Morgana. Nesta mesma semana, haverá ato de protesto reunindo esta e outras três comunidades de São José dos Pinhais, no dia 25 (quinta-feira), às 9 horas, na frente da Câmara Municipal de São José dos Pinhais.


Quatro áreas de ocupação antigas de São José dos Pinhais protestam na quinta-feira na Câmara e na secretaria de habitação de São José dos Pinhais / Divulgação

Outro lado

Em resposta ao contato da reportagem, a Copel afirmou que a ocupação sob linhas de energia podem trazer riscos à segurança dos moradores, "razão pela qual os ocupantes são previamente alertados sobre a irregularidade e notificados para a desocupação". A empresa também alega já estar em diálogo com as partes envolvidas. Leia a nota na íntegra:

"A Copel informa que a ocupação irregular das faixas de servidão situadas sob linhas de transmissão de energia apresenta riscos graves à segurança das pessoas que lá se encontram, por se tratar de rede de alta tensão energizada, razão pela qual os ocupantes são previamente alertados sobre a irregularidade e notificados para a desocupação. Na condição de concessionária do serviço público de distribuição e transmissão de energia elétrica no Paraná, a Copel tem obrigação legal de manter essas áreas livres para pronta execução de atividades de manutenção e recuperação da rede em caso de danos ou desligamentos, a fim de evitar prejuízos aos clientes.

A Copel já vem dialogando com as partes envolvidas. A empresa vai além das obrigações legais e regulatórias, buscando junto ao Ministério Público, aos municípios e à Comissão de Soluções Fundiárias do TJ-PR a solução mais adequada para esses casos de ocupação irregular de faixas de segurança. A Companhia informa, ainda, que as ações para reintegração de posse de terrenos localizados sob linhas de energia estão fundamentadas no Decreto Federal nº 35.851, de 1954, que regulamenta o uso das faixas de servidão de linhas de transmissão, e em decretos de utilidade pública emitidos para instalação dos empreendimentos."

Fonte: BdF Paraná

Edição: Lucas Botelho