Ao indiciar o ex-presidente Jair Bolsonaro por associação criminosa e inserção de dados falsos nos sistemas do SUS, a Polícia Federal levantou a possibilidade de que o esquema de fraude no cartão de vacinação pode ter relação com os planos golpistas que eram discutidos pelo ex-presidente após o segundo turno das eleições de 2022.
Além disso, a PF afirmou, no relatório que indiciou Bolsonaro e outras 16 pessoas, que aguarda dados do Departamento de Justiça dos Estados Unidos para checar se os investigados utilizaram os cartões falsos naquele país.
"O presente eixo relacionado ao uso da estrutura do Estado para obtenção de vantagens ilícitas, no caso a 'Inserção de dados falsos de vacinação contra a Covid-19 nos sistemas do Ministério da Saúde para falsificação de cartões de vacina', pode ter sido utilizado pelo grupo para permitir que seus integrantes, após a tentativa inicial de Golpe de Estado, pudessem ter à disposição os documentos necessários para cumprir eventuais requisitos legais para entrada e permanência no exterior (cartão de vacina), aguardando a conclusão dos atos relacionados a nova tentativa de Golpe de Estado que eclodiu no dia 08 de janeiro de 2023", diz o relatório final da investigação sobre fraude nos cartões de vacinação, assinado pelo delegado da PF, Fabio Alvarez Shor.
A suspeita levantada pelo delegado, que também conduz as investigações sobre tentativa de golpe de Estado que teria sido arquitetada pelo ex-presidente e seus aliados em 2022, indicam que a Polícia Federal busca amarrar as diferentes frentes de investigação envolvendo Bolsonaro.
No caso da fraude nos cartões de vacinação, a PF conseguiu checar as informações apresentadas pelo ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e delator, Mauro Cid. Ele teria recebido uma ordem direta do então presidente para produzir os cartões fraudados e, ainda, teria entregado os documentos impressos ao ex-presidente. A PF conseguiu confirmar, a partir dos dados de logs dos equipamentos do Palácio do Alvorada, que Mauro Cid utilizou um computador da residência oficial para imprimir os cartões de vacinação do ex-presidente e sua filha menor de idade.
Ouvido pela PF na investigação, Bolsonaro negou ter dado a ordem para forjar os documentos, mas admitiu que estava no Alvorada no mesmo dia em que Mauro Cid emitiu e imprimiu os documentos.
Cooperação com os EUA
Um dos passos que o delegado considera importante para avançar nas apurações e nos possíveis desdobramentos do caso de fraudes nos cartões de vacinação é justamente a colaboração com as autoridades americanas para saber se a comitiva que viajou com Bolsonaro aos EUA no fim de 2022 utilizou os documentos fraudulentos para entrar no país.
Como mostrou a investigação da PF sobre a fraude no cartão de vacinação, além de Bolsonaro, alguns de seus auxiliares diretos que viajaram com ele para os Estados Unidos no fim de 2022 também fraudaram seus cartões de vacinação como se tivessem sido vacinados contra a covid-19.
Viajaram para o exterior com Bolsonaro em 30 de dezembro de 2022 o próprio ex-ajudante de ordens e hoje delator, Mauro Cid, e os ex-assessores Max Guilherme Machado e Sérgio Rocha Cordeiro. Os dois últimos, inclusive, foram nomeados no fim de 2022 para fazer parte da equipe de auxiliares a que Bolsonaro tem direito como ex-presidente.
"A investigação aguarda os dados decorrentes do auxilio-jurídico em matéria penal solicitado junto ao Departamento de Justiça dos Estados Unidos – DOJ, que podem esclarecer se os investigados fizeram uso dos certificados de vacinação ideologicamente falsos quando da entrada e estadia no território norte-americano, podendo configurar novas condutas ilícitas", afirma o delegado da PF Fabio Shor no relatório.
Desde que o caso da fraude nos cartões de vacinação do ex-presidente e seus familiares veio à tona, Bolsonaro vem negando qualquer envolvimento em irregularidades.
Edição: Thalita Pires