"É um fato inquestionável que os bilionários do mundo continuam evadindo nossos sistemas tributários por meio de uma série de estratégias", afirmou nesta quinta-feira (29), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, na abertura do G20 Financeiro. Haddad citou dados de um relatório do Observatório Fiscal da União Europeia sobre evasão fiscal, que revela que bilionários pagam uma alíquota efetiva de impostos equivalente a entre 0 e 0.5% de sua riqueza.
"Colegas, eu sinceramente me pergunto como nós, ministros da Fazenda do G20, permitimos que uma situação como essa continue. Se agirmos juntos, nós temos a capacidade de fazer com que esses poucos indivíduos deem sua contribuição para nossas sociedades e para o desenvolvimento sustentável do planeta."
Nesta quinta, os ministros das Finanças e presidentes de bancos centrais discutem a proposta apresentada na quarta (28) pelo Brasil de criação de uma tributação mundial sobre grandes fortunas, apresentada por Haddad na quarta por videoconferência. Após testar negativo para a Covid-19, o ministro compareceu presencialmente ao Pavilhão da Bienal no Ibirapuera em São Paulo nesta quinta.
Na tarde desta quinta, o economista Gabriel Zucman apresenta aos ministros a proposta brasileira de tributação dos super ricos e representantes das Nações Unidas e da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) trazem ao debate as discussões em curso sobre tributação internacional. No final de 2023, a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou a resolução 78/230, "abrindo assim uma nova avenida para a tributação internacional", destacou Haddad.
A OCDE já trabalha dois parâmetros de taxação a nível mundial, voltados para big techs e grandes corporações. A proposta brasileira enfatiza a necessidade de que seja aplicada também uma taxa à pessoas físicas e famílias que concentram grandes fortunas.
Ao final de sua fala, o ministro da Fazenda anunciou que o Brasil busca uma declaração do G20 sobre tributação internacional para a Cúpula do grupo que será realizada em junho no Rio de Janeiro.
Confira a íntegra do discurso de Haddad
Senhoras e senhores,
Bem-vindos ao nosso segunda dia de reuniões.
Começaremos hoje com um tema que talvez seja a chave para resolvermos muitos dos desafios que enfrentamos. Falo de tributação internacional justa e progressiva. Vindo de um processo bem-sucedido de reforma tributária no Brasil, tenho certeza de que há muito que os países podem fazer por si mesmos. No entanto, soluções efetivas para que os super-ricos paguem sua justa contribuição em impostos dependem de cooperação internacional.
Essa cooperação já existe. Nos últimos dez anos, conseguimos avanços muito importantes em áreas como troca de informações, transparência, e níveis mínimos de tributação. Quero aqui reconhecer o trabalho da OCDE e do G20 no inclusive framework. Devemos trabalhar para completar essa agenda de uma maneira equilibrada e garantir a conclusão das negociações do Pilar 1. A OCDE foi convidada a nos apresentar o histórico das negociações de BEPS e os desafios que continuam no horizonte. Quero agradecer a OCDE por ter aceitado nosso convite
e parabenizá-los pelos avanços até aqui obtidos.
Apesar dos avanços recentes, é um fato inquestionável que os bilionários do mundo continuam evadindo nossos sistemas tributários por meio de uma série de estratégias. O mais recente relatório do EU Tax Observatory sobre evasão fiscal demonstrou que bilionários pagam uma alíquota efetiva de impostos equivalente a entre 0 e 0.5% de sua riqueza. Colegas, eu sinceramente me pergunto como nós, Ministros da Fazenda do G20, permitimos que uma situação como essa continue. Se agirmos juntos, nós temos a capacidade de fazer com que esses poucos indivíduos deem sua contribuição para nossas sociedades e para o desenvolvimento sustentável do planeta. Por isso, convidei o professor Gabriel Zucman, um dos maiores especialistas do tema no mundo, para nos apresentar uma proposta de tributação dos super ricos. Sei que há diferentes visões sobre o tema na sala, mas espero que a apresentação seja informativa e abra caminho para futuras discussões baseadas em evidência. Acredito que a tributação internacional de riqueza deveria constituir um terceiro pilar em nossa agenda de cooperação tributária internacional.
Finalmente, quero saudar o fato de que a maioria dos países do mundo expressou claramente o desejo de aprofundar a cooperação tributária internacional por meio de uma Convenção das Nações Unidas. No final do ano passado, a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou a
resolução 78/230, abrindo assim uma nova avenida para a tributação internacional. Embora eu saiba que opiniões sobre essa resolução variam dentro do G20, é evidente que o G20 não pode simplesmente ignorar um fato de tamanha importância. Por isso convidamos as Nações Unidas
para apresentar as perspectivas para a Convenção daqui para frente. Quero também agradecer às Nações Unidas por aceitar nosso convite.
Senhoras e senhores, Não vejo contradição entre as diferentes agendas de tributação internacional que estamos trazendo à mesa. Ao contrário, quero fazer um chamado para que as Nações Unidas e a OCDE trabalhem juntas, unindo a legitimidade e a força política da primeira à capacidade técnica da segunda. Se unirmos esforços e levarmos em conta as pesquisas mais avançadas na área, podemos continuar avançando em nossa cooperação tributária internacional e diminuindo as oportunidades para que um pequeno número de bilionários continue tirando proveito de buracos em nosso sistema tributário para não pagar sua justa contribuição. Por fim, senhoras e senhores, quero anunciar que essa Presidência buscará construir uma declaração do G20 sobre tributação internacional até a nossa reunião ministerial em julho. Consultaremos todos os membros e trabalharemos em conjunto para termos um documento equilibrado, porém ambicioso, que reflita as nossas legítimas aspirações.
Muito obrigado.
Edição: Rodrigo Durão Coelho