"O que eles estão implementando é um plano de negócios para saquear o país". É assim que Charly Fernández, membro da Frente de Organizações em Luta (FOL), classifica os planos do governo de Javier Milei para a Argentina. Por isso que, junto com milhões de outros trabalhadores argentinos, ele aderiu à greve geral convocada para esta quarta-feira (24), que pretende paralisar o país contra os ajustes planejados pelo presidente ultraliberal.
Ao Brasil de Fato, Fernández disse que "o governo pretende desmontar todos os direitos que nós, trabalhadores, conquistamos em nossa história" e comparou o atual momento com a última ditadura militar vivida pelo país (1976 - 1983). "É a mesma coisa que a ditadura militar tentou fazer: que nós, trabalhadores, não tenhamos nenhum direito e destruir nossa capacidade de organização. Por isso, é muito importante que construamos a mais ampla unidade entre os movimentos sociais, juntamente com as centrais sindicais", disse.
Apenas 45 dias se passaram desde que Milei assumiu a presidência e o governo de ultradireita já começou a ser desafiado por uma primeira greve geral. A manifestação foi convocada por todas as confederações sindicais e movimentos sociais contra o Decreto de Necessidade e Urgência e o megaprojeto de lei geral que o governo está tentando aprovar no Congresso, chamado de "Lei Ônibus".
Os resultados das lutas sociais desta quarta-feira serão decisivos para o futuro político do governo. Nesse contexto, Milei não apenas optou por encerrar qualquer tipo de diálogo, mas também decidiu redobrar a aposta e amaça com repressão. Por outro lado, as centrais sindicais e os movimentos sociais sabem que a magnitude das reformas que Milei pretende implementar tem um caráter estrutural que, se forem realmente concretizadas, serão muito difíceis de reverter no curto prazo.
"É mentira que o governo esteja tentando implementar um plano econômico. O que eles estão implementando é um plano de negócios para saquear o país. E a única coisa que essas medidas vão gerar é um nível de miséria maior do que já existe. Além disso, aumentarão a decomposição social e o colapso do tecido social nos setores mais pobres do nosso país", adverte Fernández.
Milei sabe que está correndo contra o relógio. Todos os economistas apontam que março será um mês particularmente difícil, quando as medidas mais fortes do ajuste econômico começarão a ser sentidas pela população. Faltando apenas algumas horas para o início da greve, na madrugada desta quarta-feira, o governo apressou as negociações no plenário das comissões de deputados para assinar um acordo de maioria que permite a tramitação de seu ambicioso projeto de lei geral no Congresso. Dessa forma, o megaprojeto ficou habilitado para ser debatido no Congresso para sua aprovação ainda nesta semana.
Apesar de ser minoria parlamentar, a extrema direita conseguiu o parecer majoritário com a colaboração da autodenominada "oposição aberta ao diálogo". No entanto, das 55 assinaturas do projeto, 34 foram feitas em "dissidência". Se o projeto for aprovado, o governo deve reduzir sua dependência da "oposição aberta ao diálogo", pois entre as várias medidas que pretende aprovar, está a concessão de poderes extraordinários que permitiriam ao Executivo legislar sem passar pelo Congresso.
"Não podemos permitir que a destruição de nossos direitos e a total desregulamentação da economia em favor dos setores econômicos, como pretendem fazer, sejam validadas", diz Agustín Lechi, secretário geral do Sindicato da Imprensa de Buenos Aires (SIPREBA).
O dirigente sindical, que também cruzou os braços nesta quarta-feira, disse ao Brasil de Fato que a imprensa do país tem um papel importante neste momento político. O megaprojeto de Milei pretende privatizar várias empresas públicas do país, incluindo o sistema público de mídia. O principal argumento do governo para essa política é que essas empresas são deficitárias e que sua privatização levaria a uma melhora nas contas públicas. Entretanto, de acordo com o Centro de Economia Política da Argentina (CEPA), em 2023 as empresas públicas de mídia só representarão um investimento de 0,017% do PIB.
"Historicamente, defendemos o direito de todos os argentinos ao acesso à informação e à comunicação. E é a mídia pública que garante que a informação chegue a todo o país. São elas que garantem a transmissão de eventos de interesse público gratuitamente ao nosso povo. Esse é um papel social que não pode ser substituído por empresas privadas".
Lechi explica que, embora esse seja um dos motivos específicos pelos quais a SIPREBA está se mobilizando, o slogan "a pátria não está à venda" tem a ver com todo o plano econômico do governo. "Em resumo, o que o governo está tentando fazer é subjugar a soberania do nosso país. Ele pretende desregulamentar toda a proteção de nossos ativos naturais. Eles querem desregulamentar totalmente o comércio exterior em detrimento de nossa produção. Chega ao ponto de permitir que os estrangeiros comprem a quantidade de terras argentinas que quiserem, sem nenhum limite", disse.
A medida de luta dos trabalhadores argentinos alcançou um importante apoio internacional, que também conta com a oposição de forças de extrema direita. A Central Única dos Trabalhadores no Distrito Federal (CUT-DF) anunciou que realizará um ato de solidariedade em frente à embaixada argentina em Brasília. Da mesma forma, a Central dos Trabalhadores do Uruguai (PIT-CNT) e a Intersindical Francesa farão o mesmo nas capitais de seus respectivos países.
Edição: Lucas Estanislau