Como revelou o Brasil de Fato, antes de se tornar procurador-geral da República no governo Bolsonaro, Augusto Aras utilizou-se de uma investigação que envolvia ameaças a integrantes de seu escritório de advocacia em 2011 para pedir para seus colegas no Ministério Público Federal (MPF) investigarem uma série de episódios ocorridos anos depois e aparentemente sem relação nenhuma com a denúncia original.
Dentre os pedidos de Aras, quase sempre em tom alarmista, estavam solicitações para investigar mensagens de spam que recebia em seu e-mail pessoal e também mensagens de SMS que chegavam em seu telefone funcional. De propaganda de relógio de marca e caneta espiã até e-mail sobre como marcar um encontro com uma mulher "a qualquer hora", nada passou batido por Augusto Aras.
Ao todo, entre 2013 e 2014, foram encaminhados pelo então subprocurador-geral da República pelo menos cinco ofícios para outros integrantes do MPF que estavam responsáveis por analisar as suspeitas de ameaças de um PM da Bahia a integrantes do escritório de advocacia de Aras. Segundo a denúncia original feita pelo pai de Aras (que fundou o escritório), o policial militar faria parte de um "poderoso grupo" e estava cobrando do escritório valores que ele considerava que deveria receber após levar clientes para a banca de advocacia.
Entenda o caso: Aras conseguiu mobilizar MPF e PF em dois estados para apurar caso ligado a seu escritório de advocacia
Além de informações e mensagens eletrônicas enviadas pelo PM, que acabou investigado e condenado pela Justiça da Bahia, Aras encaminhou em suas representações pedidos para que fossem checados uma série de e-mails e mensagens de celular que ele suspeitava serem ameaças subliminares do suposto "grupo" do PM baiano. Somente em uma das representações encaminhadas a colegas, Aras pede para serem analisadas 45 mensagens de SMS enviadas para seu celular funcional.
A Procuradoria da República na Bahia se debruçou sobre o material, bem com a Polícia Federal na Bahia e em Brasília. Na Bahia o caso foi encerrado após os investigadores não constatarem irregularidades nas mensagens eletrônicas. Em Brasília, a Polícia Federal já pediu o arquivamento do caso, mas o Ministério Público Federal insistiu que fossem apurados uma série de outros episódios, o que arrastou as investigações até 2023 – as conclusões ainda aguardam análise do MPF em Brasília.
A reportagem tentou contato direto com Aras para conversar sobre os fatos que aparecem no inquérito, mas ele não respondeu. Procurada, a Procuradoria-Geral da República informou, por meio de nota, que "investigações que versem sobre ameaça à vida de membros, servidores e familiares não podem ser objeto de comentários, uma vez que são protegidas por sigilo legal".
Já a a assessoria da Procuradoria da República no Distrito Federal, responsável por analisar a investigação que tramita na Justiça Federal em Brasília informou que o processo está sob sigilo e que, por isso, não pode acessar nenhuma informação à respeito.
O Brasil de Fato separou alguns dos e-mails, mensagens de celular e manifestações de Aras que revelam como o inquérito acabou sendo ampliado, confira abaixo (os dados pessoais de Aras foram preservados pela reportagem):
'Mensagens embusteiras'
Em uma das representações, Augusto Aras afirma que os textos dos e-mails comerciais que recebia possuíam conteúdo "altamente intimidativo, de promessa de grave mal, pessoal e familiar".
Na sequência desta e de outras representações, o ex-PGR encaminhou os prints dos e-mails que recebia. Em alguns deles, inclusive, constam anotações feitas a mão, possivelmente pelo próprio Aras:
'Seu mundo mais criativo'
'Aparentemente para camuflar'
'Encontro com a gata dos sonhos'
'Tartaruga luminária'
'O menor preço da internet'
'Fique por dentro de tudo'
'Campanha pronta'
Tapetes Tabacow
Mensagens SMS
Em outra representação, toda em caixa alta, Aras traz prints de uma série de mensagens de celular que havia recebido em seu aparelho funcional:
Edição: Nicolau Soares