O presidente russo, Vladimir Putin, realizou nesta quinta-feira (14) a tradicional entrevista coletiva a jornalistas russos e do mundo inteiro. O líder respondeu a um total de 67 perguntas durante mais de 4 horas de evento.
Foi a primeira grande coletiva anual que Putin concedeu desde o início da guerra da Ucrânia. Neste ano, o evento teve um formato híbrido, que combinou as perguntas dos jornalistas com questões enviadas pela população. O presidente abordou uma ampla variedade de temas, com ênfase à guerra da Ucrânia, relação com o Ocidente e a situação econômica do país.
As questões sobre quando chegará a paz e quais são os objetivos da guerra dominaram a pauta da coletiva.
Putin reiterou os objetivos da chamada "operação militar especial", afirmando que a guerra na Ucrânia terminará quando a Rússia atingir os seus objetivos. Segundo ele, esses objetivos são a "desnazificação", a "desmilitarização" e o estatuto de neutralidade da Ucrânia.
Ao falar sobre o fornecimento de ajuda militar estrangeira à Ucrânia, Putin disse acreditar que a assistência ocidental a Kiev terminará em breve. De acordo com o líder russo, a economia da Ucrânia atualmente por si só não é capaz de produzir nada.
Situação na linha de frente
Respondendo a uma pergunta sobre a situação do fronte na região de Krynki, na margem esquerda do Dnieper, onde as Forças Armadas Ucranianas vêm buscando estabelecer controle, Putin deu detalhes sobre a estratégia russa.
"Após o fracasso da contraofensiva, Krynki é a última tentativa das Forças Armadas Ucranianas de avançar para a margem esquerda do Dnieper e em direção à Crimeia. A artilharia está atingindo esta área estreita, a nossa recuou para as plantações florestais para proteger o pessoal. As Forças Armadas Ucranianas entraram na área de 1.200 por 300 metros. Eu nem sei por que eles estão fazendo isso, pressionando seu povo para ser exterminado. As perdas dos nossos militares foram pontuais, dois, três ou quatro foram feridos. O inimigo tem dezenas de mortos", observou o presidente russo.
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De acordo com ele, Kiev está conduzindo soldados das Forças Armadas Ucranianas à morte certa apenas por razões políticas. Ele enfatizou que enquanto o presidente Volodymyr Zelensky "viaja e implora" pelo mundo, as tropas precisam demonstrar pelo menos algum sucesso, independentemente das perdas.
"É benéfico para o nosso exército que o inimigo continue enviando soldados para Krynki, perdendo pessoal. Mas com o tempo, eles serão completamente expulsos de lá", completou.
Normalização das relações com a Europa?
Um jornalista da agência estatal russa Itar-Tass perguntou se o país pode esperar uma normalização das relações com a União Europeia. De acordo com ele, isso não depende somente de Moscou.
"Não estragamos o relacionamento e eles tentaram nos colocar em segundo plano ou em terceiro lugar, negligenciando nossos interesses", respondeu Putin, reiterando a acusação de que Ocidente é responsável pela crise ucraniana.
Segundo o presidente russo, todo o histórico do conflito na Ucrânia, iniciado ainda em 2014, foi provocado precisamente pelas forças políticas ocidentais – uma tese que ele repete com frequência.
"Muitas figuras europeias comportam-se exteriormente como o general de Gaulle, que estava pronto para defender a França com armas nas mãos. Mas na prática eles se comportam como o marechal Pétain, que se tornou um colaborador [do nazismo] durante a Segunda Guerra Mundial", disse Putin.
Segundo ele, a Europa depende do seu "irmão mais velho", ou seja, os EUA. Ao mesmo tempo, o chefe de Estado afirmou que a Rússia está pronta para contatos tanto com a Europa como com os Estados Unidos, mas é a "política imperial" destes que não lhes permite entrar em diálogo com outros países.
'Tudo vai bem' com a economia
Ao ser questionado sobre a situação econômica do país, Putin destacou que a economia russa resiste às sanções e à pressão dos países ocidentais. De acordo com ele, tudo está indo bem na economia russa.
Segundo ele, a Rússia regista agora um nível de desemprego recorde. Putin observou a dívida pública está diminuindo e até ao final do ano a economia deverá crescer 3,5%.
"A economia russa tem força suficiente para avançar", disse Putin.
Perguntas 'inconvenientes' surgem no telão
Paralelamente às perguntas dos jornalistas, o formato "linha direta" com o presidente protagonizou um dos momentos mais curiosos da coletiva. Putin respondia questões dos cidadãos que eram enviadas remotamente e os telões do estúdio exibiam as perguntas enviadas via SMS. Por engano ou não, a seguinte pergunta apareceu nos monitores: "Por que a sua realidade diverge da nossa realidade?"
Entre outras mensagens que foram exibidas nos monitores estavam as questões "Até quando toleraremos a corrupção da Gazprom?", e também "Demos gás à China, demos gás à Europa, e quando haverá gás em Khakassia (região russa)?". Em outro momento, surgiu a pergunta "Quando a Rússia real não será mais diferente da que aparece na televisão?". Putin não respondeu a nenhuma destas questões.
O jornalista russo Andrei Zakharov sugeriu no seu canal do Telegram que tais "incidentes" são uma medida deliberada do Kremlin para aparentar uma abertura e "descarregar" a pressão política interna. Mensagens semelhantes apareceram na "Linha Direta" em 2017, quando a sua próxima campanha presidencial estava sendo planejada.
De acordo com a apuração portal de notícias Baza, todos os SMS foram filtrados por funcionários da administração presidencial. No total, foram selecionadas pouco mais de mil questões entre 650 mil recebidas.
Putin anunciou na última sexta-feira (8) que vai se candidatar ao seu quinto mandato presidencial nas eleições que vão ocorrer em março de 2024.
Edição: Thalita Pires